Artigo publicado no Lancet Oncology destaca a importância da enfermagem oncológica para reduzir a morbidade por doenças não transmissíveis em um terço até 2030 e proporcionar a cobertura universal de saúde, metas que fazem parte da Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável das Nações Unidas. O trabalho conta com a participação da brasileira Tamara Otsuru Teixeira (foto), enfermeira oncologista responsável pela Melhoria Contínua e Navegação de Pacientes do Centro Especializado em Oncologia do Hospital Alemão Oswaldo Cruz.
Os desafios apontados para uma força de trabalho robusta de enfermagem em oncologia incluem a escassez de profissionais enfermagem, barreiras ao recrutamento (como a percepção de uma especialidade exigente com cuidados de alta complexidade e ambientes de trabalho “perigosos” devido ao risco ocupacional imposto pelos agentes antineoplásicos) e burnout. “Estratégias de recrutamento inovadoras, programas de integração e educação continuada, medidas de segurança ocupacional e intervenções de prevenção de burnout são soluções documentadas”, destacam os autores.
À medida que os casos de câncer aumentam em todo o mundo, o futuro da força de trabalho de enfermagem oncológica se reflete no apelo da campanha Nursing Now do International Council of Nurses e da Organização Mundial da Saúde (OMS) para que os enfermeiros ascendam a níveis elevados de liderança, advocacy e formulação de políticas de planejamento nacional do combate ao câncer, assumindo a responsabilidade por seu papel fundamental no alcance das metas globais para o controle do câncer.
“O enfermeiro oncologista é o profissional que despende maior tempo com paciente e sua família, e coordena o cuidado interdisciplinar dos pacientes com câncer. Trata-se de um cuidado de alta complexidade técnico-científica, impactado por tratamentos inovadores e com constantes atualizações, que necessitam um profissional especializado e treinamentos admissional e de educação continuada para proporcionar um ambiente de trabalho seguro e o melhor cuidado para os pacientes”, observa Tamara.
Entre as recomendações para ação imediata, os autores propõem que enfermeiros pesquisadores estejam integrados à prática clínica em ambientes hospitalares para fazer a diferença no cuidado; reforçam a necessidade tanto de um programa formal de treinamento de integração (onboarding)em enfermagem específica em oncologia, quanto programas de educação continuada nas escolas de enfermagem ou hospitais; destacam a necessidade de um modelo de cuidado verdadeiramente centrado nas pessoas; propõe que líderes de enfermagem oncológica aumentem a conscientização sobre as responsabilidades de enfermagem em todo o tratamento do câncer, com ações especificadas nos planos nacionais de controle do câncer; e o reconhecimento oficial da especialização em enfermagem oncológica pelas autoridades licenciadoras em todos os países para sustentar essa força de trabalho e garantir um atendimento oncológico seguro e eficaz.
“A enfermagem oncológica é uma especialidade complexa e altamente técnica e o status profissional não é universalmente reconhecido em todos os países, situação agravada nos países de baixa renda. Este fraco reconhecimento deve ser tratado em nível ministerial para garantir que o cuidado profissional por enfermeiros especializados esteja disponível para todos os pacientes com câncer”, defendem.
“Com o crescimento da carga do câncer em todo o mundo, o controle bem-sucedido exige uma forte liderança e advocacy do paciente em esferas políticas por enfermeiros especialistas em oncologia para realmente alcançar cobertura universal de saúde sustentada e acesso total a vigilância, tratamento e acompanhamento efetivo da doença”, destaca a publicação.
Tamara ressalta que o cuidado de enfermagem deve ser sempre baseado em evidências cientificas e, para tanto, especificamente para o Brasil, faz-se necessária a aliança entre academia e prática clínica, bem como investimentos para viabilizar o trabalho dos enfermeiros pesquisadores em oncologia, conhecidos nos Estados Unidos como nurse scientists. “É fundamental que sociedades e associações nacionais de enfermagem oncológica exerçam o advocacy para a enfermagem e seus pacientes. O ponto de partida prioritário é fomentar junto aos Conselhos de Enfermagem dados atualizados do contingente e das necessidades da força de enfermagem oncológica brasileira, bem como estruturar as recertificações do enfermeiro oncologista no país a fim de garantir a atualização técnico-científica dos profissionais, corroborando para a segurança e excelência da assistência de enfermagem aos pacientes com câncer no Brasil”, conclui.
Referência: Julia M Challinor, Mohammad R Alqudimat, Tamara O A Teixeira, Wendy H Oldenmenger, Oncology nursing workforce: challenges, solutions, and future strategies, The Lancet Oncology, 2020, ISSN 1470-2045, https://doi.org/10.1016/S1470-2045(20)30605-7.