Com o tema “Perspectivas para o mercado de pesquisa clínica”, terminou no dia 21 de março o XVI Encontro Nacional de Profissionais em Pesquisa Clínica. O evento apontou barreiras e entraves para a condução de estudos clínicos no Brasil e contou com apresentação de Mirian Ghiraldini Franco (foto), Coordenadora do Comitê de Ética em Pesquisa da Unifesp. O encontro aconteceu em São Paulo com organização da Sociedade Brasileira dos Profissionais em Pesquisa Clínica (SBPPC).
“As questões que foram colocadas anos atrás ainda persistem e isso é muito preocupante. Em 2012, veio a revisão regulatória e foi instituída a Plataforma Brasil, mas isso não trouxe avanços para a avaliação ética”, avalia Mirian Ghiraldini Franco, Coordenadora do Comitê de Ética em Pesquisa da Unifesp. “Somos conhecidos por ser o sistema mais burocratizado do mundo e o mais lento nos prazos de avaliação”, criticou ela durante o encontro em São Paulo.
A verdade é que 19 anos depois da Resolução 196 do Conselho Nacional de Saúde, o que era para ser um avanço, tornou-se o calcanhar de Aquiles da pesquisa clínica brasileira. Ao instituir a moldura de bioética com instâncias regionais, através dos CEPs, e de um órgão nacional de controle, a CONEP, a pesquisa clínica brasileira esperava avançar. No entanto, pesquisadores de instituições públicas e privadas se queixam da postura centralizadora da CONEP, assim como há críticas agudas sobre a burocratização e o aparelhamento político da pesquisa nacional pela instância que deveria aglutinar os estudos clínicos com seres humanos e prestar contas ao controle social.
“É um sistema que foi criado para ser democrático e transparente, mas somos lembrados pelos entraves burocráticos e não pela qualidade do sistema”, diz Miriam (Assista ao vídeo com o trecho principal da apresentação de Mirian Ghiraldini Franco no evento - cerca de 25 min).
Do ponto de vista quantitativo, é inegável reconhecer que o sistema avançou. Em fevereiro de 2015, a CONEP contabilizava um total de 695 Comitês de Ética em Pesquisa (CEPs) cadastrados e em atividade no país; outros 22 estão agora em fase de registro. Mas a relação entre o sistema CEP/CONEP até hoje arrasta problemas. “Falta diálogo”, resume Greyce Lousana, da Sociedade Brasileira de Profissionais em Pesquisa Clínica. “Passados 19 anos, fica difícil sustentar o discurso de um sistema em construção, assim como fica difícil acreditar na boa vontade da CONEP”.
Difícil entender a burocratização que assolou o sistema de avaliação ética. A Resolução 196 veio com a proposta de criar e normatizar um sistema de controle de pesquisas envolvendo seres humanos. Em 2012, a revisão da norma, através da Resolução 466, trouxe a ideia da Plataforma Brasil e ao invés de avançar em soluções, multiplicou problemas. “Estamos na versão 2.21 da Plataforma Brasil e as dificuldades estão aí. A plataforma é instável, documentos de pesquisadores desaparecem no sistema e o serviço de chat envia sempre a mesma mensagem padrão. Se o objetivo era dar transparência e agilidade à pesquisa clínica, caminhamos muito pouco”, criticou Miriam, da Unifesp.
Avanços
Na esfera regulatória, a comunidade de pesquisa clínica destacou ainda o papel da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), reconhecida por incorporar avanços recentes, com novos critérios fixados para ensaios clínicos, registro de medicamentos e de dispositivos médicos (RDC 09 e RDC 10, publicadas em março de 2015).
Para medicamentos sintéticos, as novas normas da Anvisa passam a definir o prazo máximo de 90 dias para a avaliação dos Dossiês de Desenvolvimento Clínico de Medicamento (DDCM) para a realização de estudos de fase III no Brasil, com participação internacional. Se a Anvisa não se manifestar no prazo previsto, o estudo tem sinal verde para ser iniciado, desde que aprovado pelas instâncias éticas da pesquisa. Já os estudos de fase I e II, com medicamentos biológicos ou realizados apenas no Brasil, terão 180 dias para a avaliação pela Anvisa e obrigatoriamente precisam aguardar o parecer da Agência.
Com uma avaliação mais ágil dos pedidos de pesquisa, a expectativa é aumentar a participação brasileira em estudos clínicos, o que representa transferência de conhecimento e de recursos para o país. Na área de oncologia, estudo da ASCO mostra que o Brasil participa atualmente com apenas 1% do consolidado global. “Acredito na pesquisa brasileira. Um maior número de estudos clínicos realizados aqui significa maiores possibilidades de trazer ao cidadão brasileiro a oportunidade de participar de testes de medicamentos e ter acesso a produtos ainda em fase de desenvolvimento”, diz Greyce Lousana.
As novas normas adotadas pela Anvisa buscam harmonizar a legislação nacional com a as diretrizes internacionais do setor e permitir maior inserção do Brasil nas pesquisas multicêntricas internacionais.
Assita ao lado vídeo com um balanço dos dois dias de evento e da situação da pesquisa clínica no Brasil, com Greyce Lousana: