Onconews - Equidade e acesso à assistência oncológica

equidadeA centralização dos serviços especializados em câncer está ocorrendo em muitos países, muitas vezes sem avaliar o impacto potencial antes da implementação. Desenvolvemos um modelo de planejamento de serviços de saúde que pode estimar os impactos esperados de diferentes cenários de centralização, considerando aspectos como tempo de viagem, equidade no acesso aos serviços, resultados dos pacientes e carga de trabalho hospitalar, descrevem os autores, em artigo no Lancet Oncology que ilustra a iniciativa usando a cirurgia de câncer retal como exemplo.

Para este estudo de modelagem de base populacional, Aggarwal et al. utilizaram dados de pacientes inscritos no National Cancer Registration and Analysis Service (NCRAS) e vinculados ao banco de dados do NHS Hospital Episode Statistics (HES) para 11 888 pacientes diagnosticados com câncer retal entre 1º de abril de 2016 e 31 de dezembro de 2018, posteriormente submetidos a uma grande ressecção do tumor retal em 163 hospitais do Serviço Nacional de Saúde (NHS) da Inglaterra.

Cinco cenários de centralização foram considerados: fechamento de centros de menor volume (cenário A); fechamento de centros de câncer não abrangentes (cenário B); fechamento de centros com perda líquida de pacientes para outros centros (cenário C); fechamento de centros que atendem a todos os três critérios nos cenários A, B e C (cenário D); e fechamento de centros com altas taxas de readmissão (cenário E).

A análise empregou regressão logística condicional para prever as probabilidades de pacientes afetados se mudarem para cada um dos centros restantes e as mudanças esperadas no tempo de viagem, regressão logística multinível para prever taxas de readmissão de emergência em 30 dias e regressão linear para analisar associações entre o tempo extra de viagem esperado para pacientes cujo centro está fechado e cinco características do paciente, incluindo idade, sexo, privação socioeconômica, comorbidade e ruralidade das áreas residenciais dos pacientes (rural, urbana [fora de Londres] ou Londres). O estudo também quantificou a carga de trabalho adicional, definida como o número de pacientes extras realocados para os centros restantes.

Resultados

Os autores descrevem que dos 11 888 pacientes, 4.130 (34,7%) eram mulheres, 5.249 (44,2%) tinham 70 anos ou mais e 5.005 (42,1%) tinham pelo menos uma comorbidade. O cenário A resultou no fechamento de 43 (26%) dos 163 centros de cirurgia de câncer retal, afetando 1.599 (13,5%) pacientes; o cenário B resultou no fechamento de 112 (69%) centros, afetando 7.029 (59,1%) pacientes; o cenário C resultou no fechamento de 56 (34%) centros, afetando 3.142 (26,4%) pacientes; o cenário D resultou no fechamento de 24 (15%) centros, afetando 874 (7,4%) pacientes; e o cenário E resultou no fechamento de 16 (10%) centros, afetando 1.000 (8,4%) pacientes.

Para cada cenário, houve pelo menos um aumento de duas vezes no tempo de viagem previsto para pacientes realocados, com aumento médio no tempo de viagem de 23 minutos. No entanto, o tempo extra de viagem não afetou desproporcionalmente os grupos de pacientes vulneráveis. Os resultados revelam que todos os cenários resultaram em reduções significativas nas taxas de readmissão em 30 dias (intervalo de 4 a 48%). Três hospitais no cenário A, 41 hospitais no cenário B, 13 hospitais no cenário C, nenhum hospital no cenário D e dois hospitais no cenário E tiveram que gerenciar pelo menos 20 pacientes extras anualmente.

“Esse modelo de planejamento de serviços de saúde pode ser usado para orientar decisões complexas sobre o fechamento de centros e informar estratégias de mitigação. A abordagem pode ser aplicada em diferentes países ou sistemas regionais de saúde para pacientes com câncer e outras condições de saúde complexas”, concluem os autores.

A centralização de cirurgias complexas em centros especializados em câncer, com alto volume de atendimento, está ocorrendo em muitos países de alta e média renda, impulsionada pela evidência de que os pacientes têm melhores resultados se forem tratados por equipes especializadas e experientes em centros que realizam grande número de procedimentos cirúrgicos. No entanto, os pesquisadores analisam que uma consequência da centralização dos serviços é que os pacientes podem precisar se deslocar mais para o tratamento, o que pode afetar negativamente o acesso a esses serviços.

Em síntese, os autores argumentam que é fundamental estimar o impacto esperado da centralização de serviços, antes da implementação. A presenta análise de propõe a ser um modelo empírico para definir a configuração ideal dos serviços de câncer.

Este estudo foi financiado pelo National Health Service (NHS) da Inglaterra. A íntegra do artigo está disponível em acesso aberto.

Referência: Health service planning to assess the expected impact of centralising specialist cancer services on travel times, equity, and outcomes: a national population-based modelling study - Ajay Aggarwal, PhD ; Lu Han, PhD ; Stephanie van der Geest, MSc; Daniel Lewis, PhD; Prof Yolande Lievens, PhD; Prof Josep Borras, PhD et al. - Open Access Published:August 02, 2022 DOI:https://doi.org/10.1016/S1470-2045(22)00398-9