Onconews - Especialistas criticam rastreio mamográfico a partir dos 40 anos

mamografia 23Recentemente, a Força-Tarefa de Serviços Preventivos dos EUA (USPSTF) alterou sua recomendação para a idade inicial para o rastreio mamográfico, de 50 para 40 anos. Em artigo de opinião na New England Journal of Medicine (NEJM), Steven Woloshin e colegas criticam a mudança. “Esperamos que os decisores políticos venham a reconsiderar a decisão de reduzir a idade inicial para o rastreio mamográfico”.

Woloshin et al. refletem uma preocupação real: como as recomendações da USPSTF são tão influentes, o rastreamento mamográfico para mulheres na faixa dos 40 anos provavelmente se tornará uma medida de desempenho em cuidados de saúde.

“A medida afeta mais de 20 milhões de mulheres nos EUA e levanta questões importantes”, apontam os autores.” Primeiro, há novas evidências de que a mortalidade por câncer de mama está aumentando? Ao contrário, houve uma diminuição constante na mortalidade por câncer de mama nos Estados Unidos. A redução foi mais pronunciada entre as mulheres com menos de 50 anos, faixa em que a mortalidade por câncer de mama caiu pela metade nos últimos 30 anos, segundo o National Vital Statistics System”, descrevem.

O artigo da NEJM ilustra que a mortalidade por câncer de mama em mulheres abaixo de 50 anos também foi observada em outros países de alta renda, incluindo aqueles onde a triagem de mulheres na faixa dos 40 anos é muito rara (Dinamarca e Reino Unido) e aqueles onde o rastreio é raro em todas as faixas etárias (Suíça), o que segundo os autores sugere que o declínio resultou em grande parte da melhoria do tratamento e não do rastreio.

Em segundo lugar, há novas evidências de que o benefício da mamografia está aumentando? Woloshin e colegas destacam que não houve nenhum novo ensaio randomizado de triagem

mamográfica para mulheres na faixa dos 40 anos para embasar a decisão da USPSTF. “Oito ensaios randomizados para esta faixa etária, incluindo o mais recente (o teste de idade no Reino Unido), não revelaram nenhum efeito significativo. Essa constatação reflete tanto a

raridade de morte relacionada ao câncer de mama entre mulheres na faixa dos 40 anos, quanto o fato de que a triagem nessa população reduz a mortalidade menos do que era esperado - talvez porque mais doença agressiva ocorra neste grupo etário. Cânceres de crescimento rápido são mais propensos a serem perdidos por triagem, muitas vezes aparecendo no intervalo entre exames”, prosseguem os autores.

Em vez de novos dados de ensaios, a nova recomendação da USPSTF é baseada em modelos estatísticos que estimam o que poderia acontecer se a idade inicial fosse reduzida. Os modelos assumem que a triagem mamográfica reduz a mortalidade por câncer de mama em cerca de 25% e concluem que a triagem de 1000 mulheres de 40 a 74 anos de idade, em vez de 50 a 74 anos, resulta em uma a duas mortes por câncer de mama a menos ao longo da vida.

A publicação da NEJM considera problemática a crescente dependência da USPSTF de modelos estatísticos complexos. Foi a partir de suposições de modelagem que uma conhecida iniciativa norte-americana projetou que quase todas as mulheres na pós-menopausa teriam sua expectativa de vida aumentada pela terapia de reposição hormonal, o que sabidamente não se confirmou. “Os modelos podem ter o apelo de uma aparente precisão quantitativa, mas eles são tão confiáveis quanto seus dados de entrada e suposições”, analisam Woloshin et al., para quem “os decisores políticos só devem utilizar modelos se forem capazes de entender seus parâmetros e suposições subjacentes”.

Os autores também destacam a complexa tarefa de assegurar o equilíbrio entre benefícios e danos em decisões de saúde pública, lembrando que as reduções de risco relativo podem ser enganosas, uma vez que não contêm informações sobre o risco absoluto.

“Uma mudança nas recomendações para a mamografia seria apoiada se houvessem evidências de que os resultados do câncer de mama estão piores ou, ainda, diante de novas evidências de que o rastreio em mulheres mais jovens tem benefícios claros. Na verdade, nenhuma das condições se aplica”.

Referência: N Engl J Med 2023; 389:1061-1064. DOI: 10.1056/NEJMp2307229