Estudo brasileiro lança luz sobre a incidência de câncer e mortalidade pela doença associada à poluição do ar em São Paulo. Os resultados foram publicados na Environmental Research e mostram que o aumento na taxa de incidência de câncer do trato respiratório e mortalidade pela doença está positivamente associado com o aumento da densidade de tráfego e concentrações de dióxido de nitrogênio. Indivíduos de regiões mais carentes são os mais afetados pela poluição.
O estudo teve o objetivo de quantificar a associação entre a exposição a poluentes, incidência de câncer respiratório e mortalidade pela doença em São Paulo, além de investigar o impacto do status socioeconômico (SES) sobre esses resultados.
Dados sobre a incidência de câncer entre 2002 e 2011 foram obtidos do Registro de Câncer de Base Populacional. Os dados de mortalidade foram extraídos da Secretaria Municipal de Saúde, considerando o período de 2002 a 2013. O efeito da densidade de tráfego e da exposição ao dióxido de nitrogênio (NO2) na taxa de incidência e mortalidade de cânceres respiratórios foi quantificado por meio das razões de taxa de incidência (IRRs) e correspondentes intervalos de confiança (IC= 95%), calculados usando modelos de Regressão Negativa Binomial ajustados por idade e estratificados por SES e gênero.
Resultados
Foram identificados 15.411 casos de câncer no trato respiratório (10.270 homens, 5.141 mulheres), e 19.500 mortes (12.826 homens, 6674 mulheres). Desse universo, 78% foram tumores brônquicos e pulmonares, 21% tumores de laringe e menos de 1% neoplasias de traqueia. Dados de mortalidade indicam que 15% foram relacionadas a neoplasias de laringe, 85% a malignidades brônquicas e pulmonares e menos de 1% a malignidades de traqueia.
A incidência de câncer respiratório mostrou um gradiente de exposição-resposta estatisticamente significativo tanto para a densidades de tráfego (IRR: 1,03; IC 95%: 1,02; 1,05 por 10 unidades de acréscimo: m.veículos.hora/m2) quanto para a exposição ao dióxido de nitrogênio (IRR: 1,14; IC 95%: 1,11; 1,18 por aumento de 5 µg/m3).
Indivíduos nos 2 maiores percentis de densidade de tráfego apresentaram aumento de aproximadamente 2 vezes na incidência de câncer (IRR = 1,63; 95% CI: 1,46; 1,81). Para a exposição a NO2, os indivíduos no maior percentil tiveram IRR de 1,34 (IC95%: 1,22; 1,47) em comparação com o percentil mais baixo. As taxas de incidência foram semelhantes entre homens e mulheres em relação à exposição ao tráfego, enquanto taxas mais baixas foram observadas para a exposição a NO2 em mulheres.
Nas regiões com pior status socioeconômico a razão da taxa de incidência para mortalidade em áreas de alta exposição à densidade de tráfego foi de 2,19 (IC95%: 1,70; 2,82). Em contraste, nas áreas com melhor status socioeconômico a IRR para esta mesma exposição foi de 1,07 (IC 95%: 0,95; 1,20). Quando se compara a exposição à alta concentração de NO2, as regiões de pior status socioeconômico apresentaram IRR para mortalidade de 1,44 (IC95%: 1,10; 1,88), enquanto regiões de status elevado apresentaram IRR de 1,11 (IC95%: 1,01; 1,23).
Em conclusão, a análise de mortalidade por câncer e exposição a poluentes ambientais mostra que indivíduos de regiões mais carentes sofrem mais com o impacto da poluição, com uma razão de taxa de incidência (IRR) mais de duas vezes superior. “Observamos um aumento na taxa de incidência de câncer respiratório e mortalidade em associação com o aumento da densidade de tráfego e concentrações de NO2, que foi maior entre as regiões com menor SES”, registra o artigo, que tem como primeiro autor o pesquisador Adeylson Guimarães Ribeiro, do Núcleo de Pesquisas em Avaliação de Riscos Ambientais (NARA) da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo. O estudo teve apoio de pesquisadores do Instituto de Ciências de Avaliação de Risco da Universidade de Utrecht, na Holanda.
A poluição ambiental tem sido bem estabelecida como fator de risco no desenvolvimento de câncer de pulmão, classificada pela Agência Internacional de Pesquisa sobre Câncer (IARC) como carcinógeno do Grupo 1 (IARC, 2013). Além disso, os gases de escapamento ou emissões do motor a diesel também são classificados como carcinógenos do Grupo 1 (IARC, 2012).
Referências:
Ribeiro, A. G., Downward, G. S., Freitas, C. U. de Chiaravalloti Neto, F., Cardoso, M. R. A., Latorre, M. do R. D. de O., ...Nardocci, A. C. (2019). Incidence and mortality for respiratory cancer and traffic-related air pollution in São Paulo, Brazil. Environmental Research, 170, 243–251.doi:10.1016/j.envres.2018.12.034
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