Estudo brasileiro descreve os padrões de tratamento e compara a sobrevida global e o risco de uso de múltiplas terapias em pacientes com câncer de pulmão de células não pequenas estágio IIIA. Os resultados foram publicados no JCO Global Oncology, em artigo que tem o cirurgião torácico Fernando Abrão (na foto, à direita) como primeiro autor. Riad Younes, diretor do Centro de Oncologia do Hospital Alemão Oswaldo Cruz, é o autor sênior do trabalho.
No estudo, foram analisados registros médicos eletrônicos de pacientes com câncer de pulmão de células não pequenas (CPCNP) em estágio III regularmente atendidos em 72 hospitais brasileiros. Análises univariadas e multivariadas foram conduzidas para avaliar as características primárias dos pacientes que levariam a melhores sobrevida global e sobrevida câncer-específica. “Este estudo é muito importante pois reflete a prática médica adotada em 72 hospitais do estado de São Paulo habilitados para tratamento de câncer de pulmão. Este é um ponto de partida que consideramos excelente para enteNder nossa realidade e propor avanços para os nossos pacientes”, destaca Abrão.
Foram incluídos 3.363 pacientes com CPCNP estágio III acompanhados por mais de 19 anos. A mediana de idade foi de 66 anos (58,00-72,00), 65% eram homens e 41,2% apesentavam carcinoma espinocelular, seguido de adenocarcinoma (34,6%) e carcinoma indiferenciado (13,1%) em estágio clínico T3 (50,3%), T2 (29,3% ) e T4 (12,3%).
A mediana de sobrevida foi de 18,4 meses (95% CI, 16,9 a 19,5) em pacientes submetidos à radioterapia mais quimioterapia, 11,2 meses (95% CI, 10,5 a 12,1) naqueles submetidos à quimioterapia, 31,5 meses (95% CI, 25,9 a 37,7) em pacientes tratados com cirurgia mais quimioterapia e 33,8 meses (95% CI, 28,3 a 47,8) para pacientes que receberam quimioterapia, radioterapia e cirurgia. A mediana de sobrevida câncer-específica foi de 19,3 meses (95% CI, 17,9 a 20,9) em pacientes submetidos à radioterapia mais quimioterapia, 12,1 meses (95% CI, 11,1 a 12,9) naqueles submetidos à quimioterapia, 36,9 meses (95% CI, 29,6 a 43,2) em pacientes tratados com cirurgia e quimioterapia, e 41,3 meses (95% CI, 32,1 a 61,3) para pacientes que receberam tratamento com quimioterapia, radioterapia e cirurgia.
Os pacientes que tiveram a cirurgia incluída no tratamento multimodal com quimioterapia múltipla mais radioterapia seguida de cirurgia tiveram sobrevida global significativamente melhor e taxas de mortalidade mais baixas em comparação com aqueles submetidos a outros esquemas de tratamento (hazard ratio ajustada, 0,55; 95% CI, 0,45 a 0,66; P <0,001). Ao final do estudo, 11,2% e 10,7% dos pacientes viviam com e sem câncer, respectivamente.
Em conclusão, o estudo de coorte de mundo real de 19 anos mostrou que apenas 30,3% do total de pacientes com câncer de pulmão de células não pequenas estágio III foram submetidos ao tratamento padrão de quimioterapia e radioterapia. Os resultados sugerem uma diferença substancial entre os pacientes dos ensaios clínicos recrutados e as características dos pacientes de mundo real na rotina diária de tratamento.
“Cerca de 44 % dos pacientes foram submetidos ao tratamento não preconizado pelos atuais guidelines. Este dado é muito importante, pois nos obriga a entender quais as razões para este fato. Seria falta de acesso, falta de interação do time multidisciplinar ou, de fato, os critérios de inclusão utilizados nos trials randomizados são difíceis de serem reproduzidos. Outro ponto é que o grupo muito selecionado de pacientes que tem a cirurgia incluída no tratamento multimodal, apresentaram resultados semelhantes aos encontrados na literatura”, conclui Abrão.
Referência: Real-Life Long-Term Cohort of Patients With Stage IIIA Non–Small-Cell Lung Cancer: Overall Survival Related to Patients' Characteristics and Multiple Treatment Models - Fernando Conrado Abrão; Frederico Rafael Moreira; Igor Renato Louro Bruno de Abreu; Marcelo Giovanni Marciano; and Riad Naim Younes - DOI: 10.1200/GO.21.00219 JCO Global Oncology no. 7 (2021) 1572-1585. Published online November 19, 2021.