O carcinoma epidermoide de esôfago (ESCC) é o principal tipo de câncer de esôfago na China. O papel de bactérias presentes no tecido tumoral na progressão neoplásica não foi totalmente elucidado. Agora, estudo de pesquisadores chineses mostrou que F. nucleatum está intimamente relacionado com o estágio pT e o estágio clínico do ESCC. “A abundância de F. nucleatum e a carga de mutação tumoral podem ser usadas em combinação como um método com potencial para prever metástases em ESCC”, concluem Li et al, em artigo na BMC Microbiology. Dan Waitzberg, professor associado do departamento de Gastroenterologia da FMUSP e Diretor científico da Bioma4me, comenta os resultados.
A mucosa esofágica está entre os locais colonizados pela microbiota humana, um complexo ecossistema microbiano que coloniza várias superfícies corporais e é reconhecido por desempenhar papéis em diversos processos fisiológicos e patológicos.
Para investigar o papel da microbiota do ESCC em diferentes estágios patológicos (pT), os pesquisadores realizaram o sequenciamento de alto rendimento do 16S rRNA em tecidos com câncer de esôfago e tecidos normais de 21 pacientes com ESCC.A análise considerou a correlação entre a abundância da flora esofágica e as características clínico-patológicas do ESCC.
Os resultados revelaram abundância de Fusobacterium (P = 0,0052) em tecidos tumorais. O alto nível de Fusobacterium nucleatum foi significativamente associado com o estágio pT (P = 0,039), assim como foi correlacionado com o estágio clínico (P = 0,0039). Os dados do sequenciamento completo do exoma mostraram que COL22A1, TRBV10–1, CSMD3, SCN7A e PSG11 estavam presentes apenas nas amostras ESCC positivas para F. nucleatum. Dados de enriquecimento do domínio de proteína sugeriram que o fator de crescimento epidérmico pode estar envolvido na regulação da apoptose celular em ESCC positivo para F. nucleatum. Tanto uma carga mutacional mais elevada quanto a presença abundante de F. nucleatum foram observadas em tumores com metástases comparados àqueles sem disseminação metastática.
A conclusão dos autores indica que a abundância de F. nucleatum está intimamente relacionada com o estágio pT e o estágio clínico do carcinoma epidermoide de esôfago. “ A abundância de F. nucleatum e a carga de mutação tumoral podem ser usadas em combinação como um método com potencial para prever metástases em ESCC”, analisam.
A íntegra do estudo está disponível, em acesso aberto.
Estudo reforça o envolvimento de Fusobacterium nucleatum na oncogênese
Por Dan Waitzberg, professor associado do departamento de Gastroenterologia da FMUSP e Diretor científico da Bioma4me
Fusobacterium é um filo de bactérias do tipo comensal oral anaeróbio, gram negativo, com subtipos que podem ocasionar infecções oportunísticas, como um patógeno periodontal. Fusobacterium nucleatum é capaz de formar biofilmes e interagir com o hospedeiro por meio de numerosas adesinas e tem sido, recentemente implicado na tumorigênese de câncer colorretal e pancreático. A maneira pela qual as bactérias parecem promover carcinogênese é por provocar inflamação crônica, influenciar a estabilidade genômica de células do hospedeiro e ativar mecanismos imunes.
O esôfago tem uma reduzida população bacteriana, se comparado com o restante do trato gastrointestinal, e estudos sobre o microbioma esofágico são escassos. Em câncer esofágico, a diversidade da microbiota é distinta da de tecidos esofágicos sem câncer.
Em pacientes com carcinoma de células escamosas (CCE), Li e colaboradores, na China, compararam a microbiota esofágica do tecido acometido por câncer com o tecido sem câncer e avaliaram o sequenciamento do exoma inteiro. Isso lhes permitiu estabelecer relações entre um microbioma especifico e características patológicas, assim como sugerir sua aplicação como biomarcador para a patogênese e progressão do CCE de esôfago,
Os autores verificaram que a abundância relativa de Fusobacterium (P = 0.039) e Prevotella (P = 0.0379) se correlacionou com estágios clínicos de CCE do esôfago, sendo maior em tumores em comparação com tecidos normais correspondentes.
Ao correlacionar os achados do exoma com a presença de Fusobacterium, os autores sugerem algumas vias moleculares de sua ação: atuação no ciclo celular, regulação positiva de apoptose e regulação positiva de transcripção.
Este elegante estudo, confirma o envolvimento de Fusobacterium nucleatum em oncogênese, aponta as modificações gênicas associadas e as vias moleculares associadas. Trata-se, portanto, de mais um avanço na compreensão da participação do microbioma em câncer.
Referência: Li, Z., Shi, C., Zheng, J. et al. Fusobacterium nucleatum predicts a high risk of metastasis for esophageal squamous cell carcinoma. BMC Microbiol 21, 301 (2021). https://doi.org/10.1186/s12866-021-02352-6