Pauta obrigatória nos principais eventos de oncologia pelo mundo, a imunoterapia foi tema de um simpósio realizado pela Sociedade Brasileira de Oncologia Clínica (SBOC) nos dias 15 e 16 de abril, na Praia do Forte, Bahia. O Simpósio Brasileiro de Imuno-Oncologia reuniu diversos especialistas para discutir os avanços da imunoterapia no tratamento do câncer e seus diferentes mecanismos de atuação e de eventos adversos.
“A imunoterapia veio para mudar a forma pela qual as doenças são tratadas, e a SBOC viu a necessidade de estimular eventos educacionais e criar uma comunidade brasileira envolvida em imuno-oncologia para disseminar conceitos e estimular a pesquisa nacional. Esse compartilhamento de experiências, e até mesmo a discussão das dificuldades para a incorporação da imunoterapia na prática diária são relevantes para o Brasil”, afirma o oncologista Rodrigo Munhoz, que fez parte da Comissão Organizadora e do Comitê Científico do evento.
Tratamentos como pembrolizumabe e nivolumabe, este último recentemente aprovado no Brasil, mostraram resultados sem precedentes em melanoma e câncer de pulmão, e estudos vêm mostrando ganhos também em outros cenários como câncer renal, câncer de bexiga, cabeça e pescoço e mais recentemente o carcinoma de Merkel.
Um dos focos do simpósio foi a discussão de pontos específicos da imuno-oncologia que diferem da quimioterapia convencional. “Buscamos debater como se avalia a eficácia e a resposta em pacientes que estão recebendo imunoterápicos e como reconhecer e manejar os efeitos colaterais para garantir a segurança do paciente e dar continuidade ao tratamento daqueles que estão se beneficiando. A implementação plena da imunoterapia na prática clínica depende de um conhecimento dos efeitos colaterais e da aquisição de habilidade para manejo das toxicidades”, diz Munhoz.
A seleção de pacientes também foi alvo de discussão, não apenas para permitir um ganho maior para esses pacientes, mas também por uma questão de racionalização de custos. “Ainda não temos uma forma objetiva de identificar os pacientes que mais se beneficiarão da imunoterapia. Existe um esforço internacional muito grande para identificar marcadores que permitam a melhor seleção de pacientes para esse tipo de abordagem, mas a verdade é que isso não está pronto para aplicação na pratica clínica. No momento a indicação do uso da imunoterapia segue essencialmente a seleção de pacientes dos estudos que foram realizados”, explica Munhoz.
Manejo da toxicidade
Reconhecer que as toxicidades com imunoterápicos são completamente diferentes daquelas observadas com a quimioterapia convencional e com as terapias-alvo, saber de que forma elas podem se instalar e estabelecer o manejo adequado dessas toxicidades é fundamental para o sucesso do tratamento. “São toxicidades mediadas pelo sistema imune, ou seja, muitas vezes envolvem inflamação dos tecidos-alvo. Mas a grande maioria dessas toxicidades imuno-mediadas pode ser revertida obedecendo os algoritmos de manejo de toxicidade, ou seja, o reconhecimento precoce, uma atenção do médico para a possibilidade daquela toxicidade, a instituição do tratamento adequado, que via de regra envolve corticoides, com ou sem imunossupressores, e a continuidade desse tratamento pelo período no qual o paciente já tiver com aquela toxicidade. Esses são os pontos principais”.
A discussão dos dados de eficácia da imunoterapia contou com a participação do oncologista Neil Segal, diretor do Núcleo de Imunoterapia do Memorial Sloan Kettering Cancer Center, que dividiu sua experiência sobre os estudos iniciais de imunoterapia e trouxe alguns cenários novos nos quais o tratamento vem se mostrando extremamente eficaz.
Realidade Brasileira
O alto custo das novas terapias também esteve em pauta, com discussões sobre a sustentabilidade dos sistemas de saúde e formas de maximizar a relação custo-efetividade dessa classe de medicamentos. “Tivemos um importante debate sobre as dificuldades na incorporação também do ponto de vista de regulação e de custos. De fato, esses não são medicamentos baratos, e a coordenação para permitir o acesso à maior parte dos pacientes é fundamental. Isso envolve fontes pagadoras, governo, indústria farmacêutica e sociedades médicas que trabalham com imunoterapia”.
Para Munhoz, o ponto mais importante do Simpósio foi realmente trazer esses resultados para a realidade brasileira, com discussão dos dados dos pacientes brasileiros incluídos em estudos de imunoterapia e em programas de acesso expandido. “No Brasil temos especialistas em diferentes centros envolvidos em estudos com imuno-oncologia, já com um conhecimento e uma habilidade muito grandes tanto para indicar a imunoterapia como para manejar a toxicidade relacionada ao tratamento. Colocar os profissionais que estão lidando diretamente com pacientes tratados com imunoterapia em contato com a comunidade médica brasileira foi muito importante. Esse network foi fundamental”, diz.
A expectativa é que o evento sirva de base para a organização de um grupo que permita uma colaboração contínua nos próximos anos. “A imuno-oncologia vai fazer parte do dia a dia de qualquer oncologista clínico a partir de agora. A SBOC está atenta a essa questão e gostaria de continuar a estimular a discussão da imunoterapia no cenário nacional, em diferentes frentes”, concluiu Munhoz.
O Simpósio contou com o apoio da American Society of Clinical Oncology (ASCO), da Sociedade Brasileira de Imunologia (SBI) e de várias entidades de estudos, como o Grupo Brasileiro de Estudos do Câncer de Mama (GBECAM), Grupo Brasileiro de Oncologia Torácica (GBOT), Grupo Brasileiro de Tumores Gastrointestinais (GTG), Grupo Brasileiro de Tumores Ginecológicos (EVA), Grupo Brasileiro de Melanoma (GBM) e da Latin American Cooperative Oncology Group (Lacog).