Onconews - Linfadenectomia no câncer de próstata localizado, qual a evidência?

murilo luz bxEstudo do Prostate Cancer Working Group e de pesquisadores do Memorial Sloan Kettering Cancer Center publicado 14 de abril na European Urology coloca em perspectiva um tema ainda controverso: o papel e a extensão da linfadenectomia pélvica (PLND) no tratamento cirúrgico do câncer de próstata clinicamente localizado.

As diretrizes da European Association of Urology e do National Comprehensive Cancer Network  recomendam PLND estendida em relação à PLND limitada. No entanto, as diretrizes da American Urological Association (AUA) propõem equilibrar os riscos e benefícios de cada abordagem.

Como reflexo da tímida base de evidências, apoiada essencialmente em estudos retrospectivos, também a prática de urologistas diverge entre os que defendem abordagem limitada para PLND em pacientes com risco desfavorável, considerando o risco maior de complicações com PLND estendido. Outros, no entanto, argumentam que a PLND mais extensa é capaz de identificar duas vezes mais metástases nodais do que a PLND limitada e pode ajudar a curar pacientes com micrometástases nodais, descreve o artigo, que tem como primeiro autor o urologista Karim  A. Touijer, do  Memorial Sloan Kettering Cancer Center.

Neste estudo prospectivo randomizado, Touijer et al. avaliaram se a PLND estendida melhora a sobrevida livre de recorrência bioquímica (BCR) comparada a PLND limitada em homens com câncer de próstata clinicamente localizado submetidos à prostatectomia radical.

De outubro de 2011 a março de 2017, o estudo inscreveu 1.574 homens submetidos à prostatectomia radical. Destes, 1477 receberam PLND bilateral: 720 foram randomizados para PLND limitada e 757 para a PLND estendida. Um total de 37 pacientes foi excluído da análise.

Com acompanhamento médio de 3,1 anos, os autores reportam 388 eventos de recorrência bioquímica, enquanto  288 pacientes não progrediram da doença. Não houve diferença entre os braços de análise (HR 1,04, IC 95% 0,93 –1,15; p = 0,5).

A análise de Touijer et al. mostra que não houve diferença significativa no número de nódulos recuperados nos grupos PLND limitada e estendida. Em média, 12 linfonodos foram removidos no grupo abordado com PLND limitada versus 14 no grupo que recebeu abordagem estendida. A taxa de metástase linfonodal foi de 12% no braço PLND limitada e de 14% no grupo PLND estendida (diferença -1,9%, intervalo de confiança de 95% [IC] -5,4% a 1,5%; p = 0,3). Cerca de 3,1% dos pacientes no grupo de PLND limitada tinham três ou mais nódulos positivos, em comparação com 4,7% no grupo de PLND estendida.

“Descobrimos que nos homens com câncer de próstata clinicamente localizado que receberam PLND estendida as taxas de recorrência não foram mais baixas do que naqueles que receberam PLND limitada”, apontam os autores. “Embora não tenha sido detectada diferença significativa na taxa de BCR entre os grupos PLND limitada e PLND estendida, a pequena diferença no número médio de nódulos recuperados (12 versus 14) e a taxa de nódulos positivos detectados (12% vs 14%) sugere que a PLND limitada realizada neste ensaio pode ter sido mais extensa do que o previsto”, alertam. O número de linfonodos removidos no grupo abordado com PLND limitada é claramente maior do que os resultados relatados na literatura (12 vs 6-9), assim como a taxa de metástases linfonodais (12% vs 1-6,1%).

Apesar das diferenças, os autores sustentam a importância do achado. “Há razões para acreditar que a diferença menor do que a prevista nos modelos não teve  impacto importante em nossas descobertas”, afirmam.

Touijer e colegas lembram de ensaio recente que avaliou PLND limitada a nódulos ilíacos externos versus PLND estendida (ilíacos externos, hipogástricos, fossa obturatória, ilíacos externos laterais, ilíacos comuns e nódulos pré-sacrais) em 300 pacientes com câncer de próstata  e não mostrou diferença significativa nas taxas de recorrência bioquímica entre os dois grupos.

“Sabemos que a linfadenectomia associada à prostatectomia radical é um ótimo recurso para diagnóstico e estadiamento. Apesar disto, existe uma grande dúvida quanto ao seu benefício terapêutico”, diz o uro-oncologista Murilo de Almeida Luz acerca do estudo de Touijer e colegas.

“Com um seguimento médio de 3,1 anos, os autores não encontraram diferença relevante entre as duas abordagens no que se refere à recorrência bioquímica ou complicações cirúrgicas. No entanto, 62% dos casos tinham biópsias ISUP 1-2, grupo no qual espera-se que qualquer intervenção tenha mínimo impacto. Além disto, não houve praticamente diferença no número de linfonodos retirado em cada uma das abordagens (12 na limitada x 14 na estendida) o que certamente aproximou o eventual benefício entre os grupos”, analisa.

Para Murilo Luz, a questão ainda não está respondida. “Dois são os prováveis caminhos futuros: selecionar apenas pacientes de maior risco comparando linfadenectomia estendida com nenhuma linfadenectomia e ainda a provável incorporação de nova geração de imagem como o PET-PSMA (CT ou RM) neste cenário", prevê.

A íntegra do artigo está disponível, em acesso aberto:

Referência: Touijer et al. Limited versus Extended Pelvic Lymph Node Dissection for Prostate Cancer: A Randomized Clinical Trial. DOI:https://doi.org/10.1016/j.euo.2021.03.006