A triagem pulmonar por tomografia computadorizada (CTLS, da sigla em inglês) foi associada a uma redução significativa na mortalidade por câncer de pulmão em indivíduos com histórico de tabagismo. É o que conclui meta-análise publicada no Journal of Clinical Oncology (JCO), em artigo de Francisco Passiglia e colegas. "Esta meta-análise reforça os achados dos dois principais estudos randomizados publicados abordando o rastreamento de câncer de pulmão, o Nelson e o NLST", observa Ricardo Terra (foto), professor associado da Faculdade de Medicina da USP e chefe da Divisão de Oncologia Torácica Cirúrgica do ICESP.
Nove estudos cumpriram os critérios e foram elegíveis, compreendendo dados de 88.497 pacientes com história de tabagismo, incluindo ex-fumantes.
A análise agrupada mostrou que CTLS foi associada a uma redução significativa da mortalidade relacionada ao câncer de pulmão (Risk Ratio 0,87; IC de 95%, 0,78 a 0,98; P = 0,02) na comparação com nenhum rastreamento ou raio-X de tórax. Quando comparada exclusivamente com o grupo sem rastreio, a CTLS foi associada a uma redução significativa da mortalidade relacionada ao câncer de pulmão (RR, 0,80; IC 95%, 0,69-0,92; P = 0,002; 6 estudos; 31,106 participantes).
O rastreamento anual por tomografia computadorizada trouxe aumento significativo no diagnóstico de tumores em estágio inicial (RR, 2,42; IC de 95%, 1,71-3,44; P <0,00001). O aumento foi maior para a triagem por TC em comparação com nenhuma triagem (RR, 2,73; IC 95%, 1,91-3,90; P <0,00001). A triagem por TC foi associada à redução significativa no diagnóstico de tumores em estágio avançado (RR, 0,75; IC 95%, 0,68-0,83; P <0,00001). A diminuição foi maior quando a triagem por TC foi comparada com nenhuma triagem (RR, 0,67; IC 95%, 0,56-0,80; P <0,0001), mas não houve diferença significativa na comparação entre a triagem por TC e a radiografia de tórax (RR, 1,21; IC de 95%, 0,38-3,89; P = 0,75).
A CTLS também foi associada à redução não significativa da mortalidade por todas as causas (RR geral, 0,99; IC 95%, 0,94 a 1,05) e a um aumento significativo na taxa de sobrediagnóstico (NS, 38%; IC 95%, 14 a 63). A análise da mortalidade relacionada ao câncer de pulmão por sexo não revelou diferenças significativas entre homens e mulheres (P = 0,21; I ao quadrado = 33,6%).
“CTLS foi associada a uma redução significativa de 20% na mortalidade relacionada ao câncer de pulmão, sem diferenças entre homens e mulheres. Foi observado aumento significativo no diagnóstico de tumores em estágio inicial e na taxa de ressecabilidade, juntamente com a diminuição no diagnóstico de tumores em estágio avançado. No entanto, também foi relatado aumento significativo na taxa de sobrediagnósticos”, destaca a meta-análise.
Para os autores, esses resultados sugerem que os benefícios potenciais associados a CTLS superam os danos em indivíduos com histórico de tabagismo e, em última análise, apoiam a implementação sistemática do rastreamento do câncer de pulmão em todo o mundo.
Terra afirma que a redução do risco de morte or cancer de pulmão e o diagnóstico em estadios mais precoces ficam claros nos resultados. "No Brasil, menos de 10% dos pacientes com câncer de pulmão são diagnosticados em estadio I, portanto devemos considerar estratégias para implantar o rastreamento de cancer de pulmão com TC de tórax em tabagistas no país e assim buscar maior curabilidade desta doença. Contudo, a meta-análise também ressalta um problema complexo que é o sobrediagnóstico, que foi frequente no grupo rastreado. Este fato, conjuntamente com os resultados falsos-positivos de tomografias de rastreamento, compõem os grandes desafios desafios para implantação desta estratégia. Logo, é imperativo que programas de rastreamento tenham processos e fluxos muito bem definidos, abordagem multidisciplinar e controle de qualidade para minimizar o impacto negativo destes desfechos, aumentando o beneficio do rastreamento", conclui.
Referência: Passiglia F, Cinquini M, Bertolaccini L, et al. Benefits and harms of lung cancer screening by chest computed tomography: a systematic review and meta-analysis. J Clin Oncol. Published online June 2, 2021. doi:10.1200/JCO.20.02574