Estudo publicado no periódico Human Genetics and Genomics Advances (HGG Advances) relatou que a variante R337H do gene TP53 existe como fundadora e compartilha um mesmo haplótipo entre famílias brasileiras, portuguesas e espanholas. Os pesquisadores também demonstraram a existência de três alelos TP53 p.R337H distintos adicionais. A bióloga brasileira Emilia Modolo Pinto (foto), pesquisadora no St. Jude Children's Research Hospital, é a primeira autora do trabalho.
TP53 é um supressor tumoral que regula o ciclo celular, a senescência, o reparo do DNA, o metabolismo e a apoptose em resposta a danos no DNA e outros estresses celulares. “Embora a maioria das mutações do TP53 sejam adquiridas somaticamente, os indivíduos que herdam uma variante inativadora do TP53 são altamente suscetíveis ao desenvolvimento de câncer em idade precoce, com diversos tipos de tumores e múltiplas malignidades”, observam os autores.
Estudos anteriores estabeleceram a p.R337H como um alelo hipomórfico e atenuado que confere um risco de câncer altamente variável, desde indivíduos que permanecem não afetados por cancer ao longo da vida até aqueles que atendem aos critérios clínicos clássicos para a síndrome de Li-Fraumeni (LFS). Atualmente é reconhecido que a variante TP53 p.R337H é uma mutação fundadora frequentemente encontrada em todo o sul e sudeste do Brasil, sendo detectada em um em cada 300 indivíduos.
Os portadores da variante fundadora TP53 p.R337H compartilham uma sequência de DNA idêntica para o locus TP53, com a maioria mantendo a homologia em sequência que se estende à região telomérica do cromossomo 17, abrangendo uma mutação nonsense (p.E134∗) em XAF1, estabelecido como um supressor tumoral pró-apoptótico que funciona sob regulação do TP53. “Consistente com esses achados, os indivíduos que herdam o haplótipo mutante composto (TP53 p.R337H; XAF1 p.E134∗) correm um risco aumentado para câncer em geral, sarcomas e múltiplos tumores em comparação com portadores apenas da mutação TP53 p.R337H”, esclarecem.
Nesse estudo, os pesquisadores identificaram cinco haplótipos distintos de TP53 p.R337H, com dois deles (Hap1 e Hap2) representando o alelo fundador caucasiano difundido na população brasileira. A variante fundadora TP53 p.R337H co-segrega com XAF1 p.E134∗ na maioria dos casos brasileiros (Hap1) ou como uma mutação isolada (Hap2). Hap1 também foi observado na maioria dos casos de Espanha e Portugal. Os outros três haplótipos TP53 p.R337H (Hap3-5) que foram identificados fora do Brasil, particularmente na Europa e Estados Unidos, são distintos do alelo fundador com base em polimorfismos internos e marcadores polimórficos ao longo do cromossomo 17p.
Embora o número de portadores de Hap3 e Hap4 não tenha sido suficiente para estabelecer uma clara associação haplótipo-fenótipo de câncer, foi observado um padrão em que os portadores de Hap4 se assemelhavam mais ao LFS clássico, com pacientes diagnosticados com câncer de mama, sarcomas e múltiplos tumores primários. Em contraste, os portadores de Hap3 apresentam geralmente tumores não observados tipicamente no LFS e de início tardio com penetrância incompleta, sugerindo um menor risco de câncer.
A ancestralidade para os portadores do alelo fundador TP53 p.R337H foi determinada pelo sequenciamento de DNA mitocondrial e perfil de marcadores no cromossomo Y. Essa analise revelou haplogrupos exclusivamente europeus quando analisada a origem paterna, e um excesso de nativos americanos (ameríndios) quando observada a origem materna da variante R337H. Esses dados são consistentes com comunidades sendo estabelecidas através de colonizadores europeus do sexo masculino que tiveram filhos com mulheres ameríndias. Essa distribuição da ancestralidade recapitula o momento histórico da introdução da variante R337H no Brasil.
“A identificação dos alelos fundadores e independentes TP53 p.R337H sublinha a importância de considerar o haplótipo como uma unidade funcional e os efeitos aditivos de polimorfismos constitutivos e variantes associadas em genes modificadores que podem influenciar o fenótipo do câncer”, destaca a publicação.
“Conselheiros genéticos e os prestadores de cuidados de saúde devem estar cientes destes haplótipos p.R337H distintos e das implicações potenciais das suas diferenças associadas na expressão, estrutura e função do p53 e, consequentemente, no risco de câncer”, concluem os autores.
Referência: Pinto EM, Fridman C, Figueiredo BC, Salvador H, Teixeira MR, Pinto C, Pinheiro M, Kratz CP, Lavarino C, Legal EAMF, Le A, Kelly G, Koeppe E, Stoffel EM, Breen K, Hahner S, Heinze B, Techavichit P, Krause A, Ogata T, Fujisawa Y, Walsh MF, Rana HQ, Maxwell KN, Garber JE, Rodriguez-Galindo C, Ribeiro RC, Zambetti GP. Multiple TP53 p.R337H haplotypes and implications for tumor susceptibility. HGG Adv. 2023 Oct 3:100244. doi: 10.1016/j.xhgg.2023.100244. Epub ahead of print. PMID: 37794678.