O National Comprehensive Cancer Network (NCCN) atualizou as diretrizes de tratamento do câncer de cólon1, indicando que pacientes com doença estádio III de baixo risco podem ser tratados com um esquema mais curto de quimioterapia adjuvante. A atualização é baseada nos resultados do International Duration Evaluation of Adjuvant Chemotherapy (IDEA) collaboration2, que comparou 3 meses versus 6 meses de quimioterapia baseada em oxaliplatina (FOLFOX: leucovorina, fluorouracil, oxaliplatina; ou CAPOX: capecitabina/oxaliplatina, também conhecido como XELOX). Os membros do Grupo Brasileiro de Tumores Gastrointestinais (GTG) comentam as novas diretrizes.
A diretriz atual substitui o guideline estabelecido em 2004, que recomendava a adoção de 6 meses de terapia com FOLFOX4 como padrão de tratamento, com base nos resultados do estudo MOSAIC.
Apresentado na sessão plenária da ASCO 2017, o IDEA analisou seis ensaios clínicos com mais de 12.800 pacientes e demonstrou que após a cirurgia para o câncer de cólon linfonodo positivo (estádio III), alguns pacientes podem precisar apenas da metade do curso padrão de longa duração da quimioterapia (FOLFOX ou CAPOX).
Embora o endpoint primário de sobrevida livre de doença em 3 anos (SLD) não tenha comprovado estatisticamente a não-inferioridade, um curso de quimioterapia mais curto foi associado com menos de 1% de diferença na chance de ser livre de recorrência de câncer de cólon aos três anos em comparação com o curso padrão de seis meses (74,6% vs. 75,5%; HR DFS estimado de 1.07; 95% CI, 1.00-1.15).
No subgrupo de pacientes com câncer de cólon estádio III de menor risco (definido como envolvimento de 1-3 linfonodos e não completamente através da parede intestinal, ou seja, até pT3), a taxa de sobrevida livre de doença em três anos foi quase idêntica para aqueles que receberam três (83,1%) e seis meses de quimioterapia (83,3%).
A taxa de dano neural (neuropatia) clinicamente significativa (grau 2 ou maior) variou conforme o tipo de regime de quimioterapia recebido, mas foi consistentemente maior para pessoas que receberam seis meses versus três meses de quimioterapia (45% vs.15% com FOLFOX e 48% vs. 17% com CAPOX). A neurotoxicidade de grau 3 ou superior foi maior no braço seis meses (16 v 3% FOLFOX, 9 v 3% CAPOX, p <0,0001).
Recomendações
As diretrizes do NCCN agora incorporam o regime de 3 meses de quimioterapia adjuvante. As recomendações também refletem o fato de que diferentes grupos de risco tiveram um desempenho diferente com os diferentes regimes no estudo.
Para pacientes com doença estádio III de baixo risco, definida como estádios patológicos T1-3N1, a recomendação é CAPOX por 3 meses ou FOLFOX por 3 a 6 meses.
Para pacientes com doença estádio III de alto risco, definida como estádios patológicos T4N1-2 e qualquerTN2, os tratamentos preferidos são CAPOX por 3 a 6 meses ou FOLFOX por 6 meses.
As diretrizes observam ainda que as taxas de neurotoxicidade de grau 3 ou superiores são menores para pacientes que recebem 3 meses vs 6 meses de tratamento (3% vs 16% para FOLFOX; 3% vs 9% para CAPOX).
“A incorporação pelo NCCN e outros importantes guidelines da duração de 3 meses de quimioterapia para a maioria dos pacientes com câncer de cólon estádio III baseado nos resultados do estudo IDEA veio ao encontro das necessidades na prática clínica de se reduzir toxicidade associada à quimioterapia sem, contudo, perder a eficácia. A redução dos custos com o tratamento também é bastante positiva”, afirmam os oncologistas membros do Grupo Brasileiro de Tumores Gastrointestinais (GTG).
Segundo os especialistas, atualmente a recomendação de 6 meses de quimioterapia baseada em oxaliplatina só se justifica em pacientes com doença de mais alto risco (T4 e/ou N2) e que estão tolerando muito bem a quimioterapia. “Mesmo nestes pacientes, a presença de toxicidade limitante nos permite avaliar a suspensão da quimioterapia adjuvante antes de atingir os 6 meses. Nos casos em que a recomendação for 3 meses de duração, a tendência é utilizar CAPOX como regime preferencial”, ressaltam.
Escalonamento de dose no câncer colorretal metastático
A NCCN também atualizou as diretrizes de tratamento para pacientes com câncer colorretal metastático previamente tratados. A recomendação é uma estratégia semanal de escalonamento de dose com regorafenibe, que se inicia com uma dose inicial de 80 mg/dia nos dias 1 a 7, aumentando para 120 mg/ia nos dias 8 a 14 e concluindo com 160 mg/dia nos dias 15 a 21. Para os ciclos subsequentes, a NCCN recomenda 160 mg de regorafenibe nos dias 1 a 21 a cada 28 dias.
A recomendação é baseada nos resultados do estudo de fase II ReDOS3, que comparou o regime de escalonamento de dose com a dose padrão de 160 mg de regorafenibe diariamente. Os resultados foram apresentados no 2018 Gastrointestinal Cancers Symposium.
No ReDOS, 54 pacientes foram designados para escalonamento de dose e 62 foram designados para dose padrão. Todos os pacientes tiveram um ECOG performance status de 0 (37,1%) ou 1 (62,9%). Quatro pacientes (7,4%) no braço de escalonamento tiveram recidiva local, 37 (68,5%) tinham doença ressecada e 13 (24,1%) tiveram doença não ressecada em comparação com 1 (1,6%), 44 (71,0%) e 17 (27,4 %) no braço padrão, respectivamente.
A mediana de idade foi de 61 anos (variação, 53 a 68) e a maioria dos pacientes era do sexo masculino (61,2%). A porcentagem de pacientes com tumores KRAS mutados ou selvagem foi quase idêntica (46,6% vs 44,0%).
O endpoint primário foi a proporção de pacientes que completaram 2 ciclos de tratamento e iniciaram um terceiro. Os pacientes no braço de escalonamento de dose foram mais propensos a atingir esse endpoint (43% vs 24%, P = 0,281).
A mediana da sobrevida global (OS) foi de 9,0 meses no braço de escalonamento de dose versus 5,9 meses no braço padrão (P = 0,0943).
A taxa de sobrevida global em 6 meses foi de 66,5% (95% IC, 53,8-82,2) no grupo de escalonamento versus 49,8% (95% IC, 37,2-66,8) no braço padrão. A sobrevida global em doze meses também favoreceu o braço de escalonamento de dose, em 34,4% vs 26,7%.
A mediana de sobrevida livre de progressão (SLP) também favoreceu o escalonamento de dose (2,5 vs 2,0 meses). A sobrevida livre de progressão em 6 meses foi de 12,2% (95% IC, 5,4-27,5) no braço de escalonamento versus 11,8% (95% IC, 5,2-26,6) no braço padrão. No entanto, a taxa de SLP em 12 meses favoreceu o braço padrão, em 5,9% contra 2,4%.
A toxicidade foi favorável no braço de escalonamento de dose, e os parâmetros de qualidade de vida também foram melhorados.
“Realmente, o que se notava na prática é que iniciar regorafenibe na dose de 160 mg/dia do D1 ao D21 a cada 28 dias fazia com que muitos pacientes não tolerassem e abandonassem o tratamento”, dizem os especialistas.
Os oncologistas observam que o escalonamento avaliado pelo estudo, de iniciar com a dose de 80 mg na primeira semana, subir para 120 mg na segunda semana e só então chegar aos 160 mg, não só reduziu o abandono do tratamento, como também não implicou em redução da eficácia. “Muito pelo contrário. Houve uma tendência de melhora da sobrevida global ao se iniciar com a dose de 80 mg. Apesar de constituir um estudo pequeno, podemos afirmar que será adotado na prática clínica”, concluem.
Referências:
2 - Abstract LBA1: Prospective pooled analysis of six phase III trials investigating duration of adjuvant (adjuv) oxaliplatin-based therapy (3 vs 6 months) for patients (pts) with stage III colon cancer (CC): The IDEA (International Duration Evaluation of Adjuvant chemotherapy) collaboration. – Qian Shi, Axel Grothey et al. - Citation: J Clin Oncol 35, 2017 (suppl; abstr LBA1)
3 - Bekaii-Saab TS, Ou FS, Anderson DM, et al. Regorafenib dose optimization study (ReDOS): Randomized phase II trial to evaluate dosing strategies for regorafenib in refractory metastatic colorectal cancer (mCRC)—an ACCRU Network study. J Clin Oncol. 2018;36(suppl 4S; abstr 611).