Estudo publicado na Cancer Discovery, periódico da American Association for Cancer Research, demonstrou que a eliminação de determinadas bactérias diminuiu a progressão da doença, reverteu a imunossupressão e regulou a expressão do checkpoint imune PD-1, o que pode contribuir para a eficácia da imunoterapia. “A descoberta de microbiota alterada em câncer do pâncreas, e mais ainda, a melhora da resposta tumoral ao tratamento de imunoterapia com a eliminação por antibioticoterapia desta microbiota descortina uma nova perspectiva no tratamento do câncer”, afirma Dan Waitzberg (foto), professor associado do Departamento de Gastroenterologia da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP), diretor do GANEP Nutrição Humana e diretor cientifico da Bioma4me.
A relação entre o microbioma intestinal com o câncer foi pesquisado em diversos tumores, como câncer de fígado e colorretal, e os estudos demonstraram seu papel na progressão da doença. No entanto, até o momento, poucos trabalhos investigaram o papel do microbioma intestinal no câncer de pâncreas.
Agora, o estudo liderado por pesquisadores da New York University School of Medicine demonstrou que a presença de bactérias é significativamente maior em amostras de tumores de pacientes com adenocarcinoma ductal pancreático em comparação com tecidos de indivíduos sem a doença. Além da análise dos tecidos, os pesquisadores também compararam amostras fecais de 32 pacientes com adenocarcinoma ductal pancreático com amostras fecais de 31 indivíduos sem a doença e confirmaram que a composição bacteriana dos pacientes com câncer era distinta. Entre as cepas de bactérias mais abundantes nos tumores de pâncreas estão proteobacteria, bacteroidetes e firmicutes.
"Os resultados têm implicações para a compreensão da imunossupressão no câncer de pâncreas e sua reversão na clínica, ao demonstrar que as bactérias podem servir tanto como biomarcadores de risco aumentado para o câncer de pâncreas, quanto para possíveis alvos terapêuticos. Diminuir a progressão do tumor e aumentar a sobrevida desses pacientes através da manipulação do microbioma seria um avanço significativo no controle de uma doença muito agressiva", disseram os autores.
Em testes com modelos murinos, a equipe demonstrou que as bactérias migram do intestino para o pâncreas durante o desenvolvimento do câncer de pâncreas. Os pesquisadores mostraram ainda que a eliminação dessas bactérias com antibióticos retardou a progressão da doença e reduziu a carga tumoral em cerca de 50%.
Os pesquisadores também descobriram que a combinação de tratamento antimicrobiano com a imunoterapia anti-PD1 resultou na ativação aumentada de células T CD4 + e CD8 + em modelos murinos, sugerindo que a combinação é uma potencial opção de tratamento para a doença.
“Aparentemente, a já conhecida associação entre doença maligna e disbiose intestinal pode, de alguma forma, beneficiar a célula maligna em termos de maior progressão tumoral e/ou resistência ao tratamento oncológico”, observa Waitzberg. O especialista acrescenta que a presença em maior número de proteobacteria, bacteroidetes e firmicutes na microbiota fecal poderá, em breve, vir a ser biomarcarcador de câncer e justificar o sequenciamento genético da microbiota fecal.
A equipe está se preparando para iniciar um ensaio clínico para testar a combinação de antibióticos (ciprofloxacina e metronidazol) com um inibidor de checkpoint anti-PD-1 nesses pacientes. Em testes clínicos anteriores, a imunoterapia isolada não demonstrou atividade promissora no tratamento da doença.
Os autores também esperam aumentar o tamanho da amostra de pacientes, bem como identificar bactérias benéficas que poderiam ser utilizadas para retardar a progressão do câncer de pâncreas ou diminuir o risco do surgimento da doença.
Estudos já em andamento estão buscando confirmar quais as espécies de bactérias com maior capacidade de bloquear a reação imunológica às células cancerígenas. Essa definição deve contribuir para novos testes diagnósticos, combinações de antibióticos e imunoterapias, e talvez para probióticos que tenham papel na prevenção do câncer em pacientes de alto risco.
O estudo foi apoiado pelo National Institutes of Health, Department of Defense Peer Reviewed Medical Research Program, the Lustgarten Foundation, Panpaphian Association of America, National Pancreas Foundation, Crohn's and Colitis Foundation of America e Irene e Bernard Schwartz Fellowship in GI Oncology.
Referências: The Pancreatic Cancer Microbiome Promotes Oncogenesis by Induction of Innate and Adaptive Immune Suppression - Deepak Saxena, George Miller et al - Published Online First March 22, 2018 - doi: 10.1158/2159-8290.CD-17-1134