Cientistas australianos demonstraram uma nova e promissora abordagem para o tratamento do câncer de pâncreas. A estratégia ‘priming’, que visa tornar a arquitetura estromal circundante do tumor mais sensível à quimioterapia, duplicou o tempo de sobrevida e dificultou a disseminação do câncer para outros tecidos. Os achados foram publicados dia 6 de abril na Science Translational Medicine.
O câncer de pâncreas tem uma taxa de sobrevida em cinco anos de apenas 7%, número que praticamente não se alterou nos últimos 40 anos. A quimioterapia combinada é o padrão de cuidados para a doença irressecável, mas sua eficácia em aumentar a sobrevida é apenas moderada.
No estudo realizado em cobaias e em amostras de tumor de pacientes, os pesquisadores administraram um curso de três dias de fasudil - um inibidor da proteína ROCK, que tipicamente age em células envolvendo tumores para torná-los mais rígidos e impulsionar a progressão do câncer. O fasudil foi direcionado ao estroma em vez do próprio tumor. A droga atua no tecido circundante tornando os tumores mais ‘suaves’, além de deixar os vasos sanguíneos próximos dos tumores menos densos.
"Existe uma controvérsia de longa data na pesquisa em câncer que discute se a segmentação do estroma pode tornar tumores pancreáticos mais suscetíveis à terapia. Acho que resolvemos esse debate. Nós mostramos pela primeira vez que é crucial tratar primeiro o estroma e depois o tumor, afinando o tempo de tratamento para maximizar o resultado e minimizar os efeitos colaterais”, afirmou disse Paul Timpson, do Garvan Institute of Medical Research, que co-liderou o estudo.
Para aprimorar a abordagem sequencial, foram utilizadas técnicas de microscopia intravital de ponta para examinar diretamente tumores pancreáticos dentro de um animal vivo e observar, em tempo real e em três dimensões, como o priming com Fasudil alterou o tumor e seu estroma do entorno. Eles também observaram como os vasos sanguíneos ao redor do tumor foram afetados.
"Vimos o estroma enfraquecer ao longo do tempo, e também pudemos observar que as células cancerosas não se espalharam tão prontamente para sites secundários, como o fígado. Além disso, utilizamos pontos quânticos fluorescentes na corrente sanguínea, e foi notável observar esses pontos irradiarem para fora dos vasos sanguíneos adjacentes aos tumores após o tratamento com fasudil - o que é um indicador de que os vasos se tornaram vazados”, afirmou Marina Pajic, outra co-líder do estudo.
Os pesquisadores concluíram que o priming com fasudil torna os tumores mais suscetíveis à quimioterapia de duas maneiras: suavizando o estroma e ajudando a entrega da quimioterapia ao tumor por meio de vasos sanguíneos mais vazados.
Os pesquisadores observaram ainda que alguns tumores de pâncreas respondem melhor à terapia ‘priming’. Utilizando amostras tumorais de pacientes da Australian Pancreatic Cancer Genome Initiative, a equipe desenvolveu uma análise automatizada do tecido tumoral para prever a resposta de um tumor individual ao tratamento sequencial. "Vimos que a terapia funciona melhor para tumores com grandes quantidades de estroma e uma alta densidade de vasos sanguíneos circundantes”, disse Timpson.
Um aspecto importante apontado pelos pesquisadores é o potencial clínico da estratégia. "Fasudil já está em uso clínico como tratamento para acidentes vasculares cerebrais no Japão e está fora de patente, por isso há um forte potencial para redirecioná-lo para o tratamento de câncer de pâncreas", diz Pajic. "Além disso, na clínica, o fasudil é administrado durante um curto período de 3 dias, como fizemos no nosso estudo, e existem dados de segurança extensivos para validar esta abordagem”, acrescentou.
Os especialistas também estão entusiasmados com o potencial de utilizar a nova abordagem para outros tumores sólidos, que assim como o câncer de pâncreas sejam cercados por estroma e possam ser sensibilizados para o tratamento através do priming.
Referência: Transient tissue priming via ROCK inhibition uncouples pancreatic cancer progression, sensitivity to chemotherapy, and metastasis - Science Translational Medicine - 05 Apr 2017: Vol. 9, Issue 384, eaai8504
DOI: 10.1126/scitranslmed.aai8504