Os avanços no tratamento melhoraram a sobrevida de indivíduos com linfoma de Hodgkin (LH), mas as terapias podem aumentar significativamente o risco de problemas cardíacos. É o que aponta estudo publicado 25 de julho na Cancer, revelando que as pessoas com LH em estágio inicial estão agora em maior risco de morrer de doenças cardiovasculares do que de câncer. A cardio-oncologista Marina Bond (foto) comenta os resultados.
Neste estudo multicêntrico foram incluídos 15.889 pacientes de diferentes grupos etários (crianças e adultos) diagnosticados com LH clássico nos Estados Unidos, entre 1983 e 2015. O principal objetivo foi analisar a tendência temporal de mortalidade por doença cardiovascular (DCV) nessa população de pacientes. Os pesquisadores analisaram a razão de mortalidade proporcional, a incidência cumulativa de mortalidade por causa específica, a razão de mortalidade padrão e o excesso de risco absoluto.
Os resultados mostram que entre os pacientes com LH estágio I e estágio II, a razão de mortalidade proporcional para doença cardiovascular superou a de LH, após aproximadamente 60 ou 120 meses de seguimento, respectivamente. Para quase todos os pacientes com doença em estágio I ou estágio II, a incidência cumulativa de mortalidade por doença cardiovascular excedeu a mortalidade por LH e outras neoplasias ao longo do tempo.
A análise temporal mostra que nas últimas décadas, o risco de mortalidade por LH diminuiu acentuadamente, mas o risco de mortalidade por doença cardiovascular entre pacientes com LH diminuiu muito lentamente ou mesmo permaneceu inalterado em algumas populações. Pacientes com doença em estágio I ou estágio II apresentaram maior risco de mortalidade por doença cardiovascular (DCV) do que a população geral em quase todos os intervalos de acompanhamento. O excesso absoluto de risco de DCV entre os pacientes no estágio I atingiu 48,5.
A conclusão dos autores indica que o risco de mortalidade por DCV superou o de LH e outras neoplasias e tornou-se a principal causa de morte ao longo do tempo, entre pacientes com doença em estágio I ou estágio II. “Medidas mais eficazes devem ser tomadas para reduzir o risco de mortalidade por DCV em sobreviventes de LH clássico”, propõem.
Em síntese, após aproximadamente 60 e 120 meses de seguimento, a incidência cumulativa de mortalidade por doenças cardiovasculares excedeu a de LH e outros cânceres ao longo do tempo. Nas últimas décadas, o risco de mortalidade por LH clássico diminuiu acentuadamente, mas o risco de mortalidade por doenças cardiovasculares entre pacientes com LH clássico diminuiu lentamente ou mesmo permaneceu inalterado em alguns grupos, destaca a publicação da American Cancer Society.
"Cada vez mais a medicina demonstra uma aproximação entre câncer e doenças cardiovasculares, não só devido aos vários fatores de risco que são semelhantes às duas entidades, como idade avançada, tabagismo, obesidade e sedentarismo, mas também porque o tratamento oncológico (quimioterapia, radioterapia, imunoterapia) podem diretamente afetar o coração. Quando falamos de Linfoma de Hodgkin, estamos falando de um tumor que se diagnosticado de forma precoce, em seus estágios iniciais, tem altas chances de cura e seu tratamento em geral envolve quimioterapia com o clássico protocolo ABVD, que inclui doxorrubicina, e também a radioterapia, muito comumente aplicada em região torácica e mediastinal", observa Marina Bond, especialista em cardio-oncologia do Grupo Oncoclínicas. A doxorrubicina é uma antraciclina clássica com alta chance de cardiotoxicidade, principalmente quando usada em altas doses, em crianças, idosos ou pessoas já com doença no coração. Ela pode causar insuficiência cardíaca a longo prazo e este dano pode ser irreversível. Já a radioterapia nas proximidades ao coração também pode causar sequelas a longo prazo, como: aumento de incidência de doença coronariana, infarto, doenças valvares e no pericárdio", ressalta.
Referência: Lu, Z., Teng, Y., Ning, X., Wang, H., Feng, W. and Ou, C. (2022), Long-term risk of cardiovascular disease mortality among classic Hodgkin lymphoma survivors. Cancer. https://doi.org/10.1002/cncr.34375