As diferenças no contorno da radioterapia mamária após a cirurgia conservadora da mama influenciam a probabilidade estimada de complicações nos tecidos normais. Estudo de Jaikuna et al. publicado no The Breast apresenta o impacto da variação do contorno na predição de fibrose, em uma contribuição fundamental para modelos de risco. O radio-oncologista Gustavo Nader Marta (foto) analisa os resultados.
Modelos de probabilidade de complicação do tecido normal (NTCP) podem ser úteis para estimar o risco de fibrose após cirurgia conservadora da mama seguida de radioterapia na mama.
Nesta análise, os pesquisadores incluíram 280 pacientes com câncer de mama tratados com radioterapia após cirurgia conservadora da mama. Foram criados nove contornos de Volume Alvo Clínico (CTV) para cada paciente: i) CTV_crop (referência), recortado a 5mm da pele e ii) CTV_skin, não recortado e incluindo a pele, iii) segmentando a isodose de 95% (Iso95%) e iv) 3 atlas diferentes de autocontorno gerando contornos não cortados e cortados (Atlas_skin/Atlas_crop). Para ilustrar o impacto da variação do contorno nas estimativas de NTCP, os pesquisadores aplicaram duas equações que prevêem o grau de fibrose ≥ 2aos 5 anos, com base nos modelos Lyman-Kutcher-Burman (LKB) e de Serialidade Relativa (RS), respectivamente. As diferenças foram avaliadas por meio de ANOVA de medidas repetidas. Para completar, a associação entre eventos de fibrose observados e estimativas de NTCP também foi avaliada por regressão logística.
Os resultados relatados por Jaikuna et al. mostram que houve diferenças mínimas entre os contornos quando a mesma abordagem de contorno foi seguida (recortada e não recortada). Os contornos CTV_skin e Atlas_skin tiveram estimativas mais baixas de NTCP (-3,92%, IQR 4,00, p<0,05) em comparação com CTV_crop. Nenhuma diferença significativa foi observada para os contornos Atlas_crop e Isso 95% em comparação com CTV_crop. Os autores descrevem que para toda a coorte, as estimativas de NTCP variaram entre 5,3% e 49,5% (LKB) ou 2,2% e 49,6% (RS), dependendo da escolha dos contornos. As estimativas de NTCP para pacientes individuais variaram até um fator de 4. As estimativas dos contornos da pele mostraram maior concordância com os eventos observados.
Em conclusão, variações de contorno podem levar a estimativas de NTCP significativamente diferentes para fibrose mamária, destacando a importância de padronizar os contornos mamários antes de desenvolver e/ou aplicar modelos de NTCP.
“Até onde sabemos, esta é a primeira vez que o impacto da variação do contorno na estimativa do NTCP da fibrose mamária foi demonstrado”, destacam os autores. “Embora o tamanho da nossa coorte (280 pacientes) seja considerado pequeno demais para desenvolver ou validar o modelo NTCP, nosso objetivo neste estudo foi aumentar a conscientização sobre o impacto da incerteza do contorno”, acrescentam.
Jaikuna e colegas ainda sublinham que o delineamento do alvo é um processo essencial para fins de planejamento de tratamento. “Demonstramos que a inclusão ou exclusão da pele levou a variações consideráveis nas estimativas do NTCP, especialmente no 3DCRT, quando o ponto quente está frequentemente situado na entrada do feixe e na região ventral da cúpula mamária. Além disso, variações entre contornos ocorrem frequentemente nos pontos de entrada dos feixes tangenciais mediais e laterais. A exclusão desta região de alta dose poderia impactar as estimativas do NTCP para fibrose mamária porque o volume e a localização do ponto quente estão ligados ao linfedema crônico, bem como à descamação úmida, que estão associados ao desenvolvimento de fibrose”.
Para Gustavo Nader Marta, médico titular do Departamento de Radioterapia do Hospital Sírio-Libanês, é fundamental a utilização de guidelines de definição de volume alvo a fim de se minimizar possíveis erros e inconsistências que podem existir no planejamento técnico da radioterapia. Neste cenário, ele lembra ainda que existem diversos guidelines disponíveis das Sociedades Europeia (ESTRO) e Norte Americana (ASTRO) que podem servir de base para a adequada prática clínica.
A íntegra do estudo está disponível em acesso aberto.
Referência: Published: September 10, 2023. DOI:https://doi.org/10.1016/j.breast.2023.103578
