Onconews - O cenário da neuro-oncologia e os avanços de 2019

neuro onco still gbm2019O cuidado multidisciplinar deu a tônica de encontro que reuniu opinion leaders da neuro-oncologia brasileira para debater temas que fazem a diferença na assistência ao paciente. “Queremos trazer estudos e publicações que em breve vão impactar a nossa prática”, destacou o oncologista Thiago Jorge, da BP - A Beneficência Portuguesa de SP,  que moderou as apresentações do GBM Highlights, da teoria à prática, realizado dia 27 de novembro no Radisson Hotel. O evento também teve participação do neurocirurgião Marcos Maldaum, do Sírio-Libanês e da BP, e de Rodrigo Hanriot, radioterapeuta do Hospital Alemão Oswaldo Cruz. Assista ao vídeo com todas as apresentações.

Maldaun revisou avanços e evidências no glioblastoma multiforme, a começar do diagnóstico. “A classificação é histológica, mas na oncologia moderna é fundamental saber se o tumor é ou não IDH1 mutado, se tem expressão de P53, qual o perfil de expressão de ATRX, qual o KI-67 e - mais ainda - saber se estamos diante de um tumor metilado ou não. São informações indispensáveis para definir o diagnóstico e orientar toda a estratégia de tratamento”, explicou Maldaum.

A partir dessas informações é possível compreender melhor a biologia do tumor, o que soma pontos preciosos na hora de entender prognóstico, selecionar os esquemas de tratamento e acompanhar a evolução do paciente. “Isso é fundamental para que a equipe multidisciplinar entenda a evolução desse paciente, se ele tem boa perspectiva de resposta ou risco maior de pseudoprogressão, se tem a opção de outros alquilantes ou de fazer um rechallenge com temodal”, ilustrou Maldaum. “São opções que dependem dessa avaliação personalizada de cada paciente, a partir do seu perfil molecular”, reforçou.

O glioblastoma (GBM) é o mais prevalente dos tumores cerebrais malignos primários em Sistema Nervoso Central (SNC) em adultos. Diante da heterogeneidade desses tumores, a Organização Mundial de Saúde publicou em 2016 uma nova classificação, que associa dados moleculares ao diagnóstico histológico. Com diferentes prognósticos, o tratamento multimodal permanece como padrão e o arsenal terapêutico foi ampliado, incorporando hoje novos agentes alquilantes, como temozolomida, diferentes inibidores de tirosina- quinase (TKIs), além de tecnologias como o NovoTTF.

“Agora, estamos diante de diferentes opções e a sobrevida mediana do glioblastoma multiforme alcançou 30 meses. Como cirurgião, o que fica de mais importante é reconhecer que o grau de ressecção máxima faz diferença, o que significa que cumprir o conceito de maximal safe resection é fundamental para aumentar as curvas de sobrevida”, ensinou Maldaum.

Radioterapia

Rodrigo Hanriot, radioterapeuta do Hospital Alemão Oswaldo Cruz, revisou estudos que marcaram o ano na neuro-oncologia e sublinhou a importância da multidisciplinaridade nos cuidados com o paciente. “Na neuro-oncologia, especialmente no glioblastoma multiforme, em 92% das vezes o paciente vai precisar de radioterapia, seja como tratamento imediato, seja na recidiva ou de forma paliativa”, ilustrou. No entanto, 2019 não trouxe grandes novidades na radioterapia para tumores do SNC. “O que vimos nos congressos da especialidade foram basicamente estudos que discutem padrões de recidiva no glioblastoma, avaliando se é ou não interessante aumentar o campo ou a dose, além de estudos que discutem radiômica, um método de inteligência artificial que tenta predizer o comportamento do glioblastoma multiforme”, exemplifica Hanriot.

Na prática, as primeiras evidências vêm de estudos como o SPECTRO-GLIO, ensaio multicêntrico de Fase III que avaliou dados de 83 pacientes com glioblastoma recém-diagnosticado. Através de ferramentas de radiômica, o SPECTRO-GLIO identificou 116 características relacionadas com o padrão de falha ao tratamento, 18 delas com potencial de significância.

Outro destaque de radioterapia em tumores do SNC é o ensaio japonês que avaliou radioterapia com IMRT hipofracionada com uso adjuvante ou concomitante do antiangiogênico bevacizumabe no tratamento do GBM, em análise que inscreveu 25 pacientes, sendo 15 MGMT metilados. “Os resultados mostram que a adição de bevacizumabe não trouxe benefício de sobrevida global”, sublinhou Hanriot.

O especialista também lembrou dos resultados de estudo que discutiu o tempo ideal entre cirurgia e quimiorradioterapia. Apresentado na ESTRO 2019, o principal encontro europeu de radioterapia, o estudo mostrou que o intervalo de tempo entre a cirurgia e o início da quimiorradioterapia faz toda a diferença no desfecho clínico de pacientes com glioblastoma. Este estudo retrospectivo considerou dados de 204 pacientes e avaliou sobrevida livre de progressão (SLP) e sobrevida global (SG) de acordo com o intervalo entre a cirurgia e o início da quimiorradioterapia: < 4 semanas, entre 4 e 6 semanas e > 6 semanas. Os resultados indicam que o intervalo ideal entre a cirurgia e a radioterapia é de 5 semanas, com benefício de sobrevida global (HR = 0,49; p= 0,002) e livre de progressão (HR = 0,51; p=0,003) .

A radioterapia em pacientes idosos também foi tema de dois estudos apontados entre os highlights da ESTRO 2019, confirmando que a trimodalidade ainda assegura sobrevida superior comparada a outras estratégias de tratamento

No repertório de inovações terapêuticas, a ESTRO mostrou, ainda, resultados de estudos com a proteína da ativação de fibroblasto (FET-PET) e com o Tumor Treating Field (TTF), novas promessas para pacientes com GBM.

Oncologia clínica

No tratamento sistêmico, a chegada das terapias agnósticas valida a pesquisa de biomarcadores como NTRK e instabilidade de microssatélites na neuro-oncologia para o uso de agentes como larotrectinibe, entrectinibe e pembrolizumabe.

Na prática, sobram estudos que reforçam a importância da seleção molecular. Entre os highlights de 2019, o oncologista Thiago Jorge destacou trabalho de Herrlinger et al publicado no Lancet Oncology, com dados do ensaio CeTeG/NOA–09. “Os resultados mostram que a quimioterapia com lomustina-temozolomida melhorou a sobrevida em comparação com a terapia padrão em pacientes com glioblastoma recém-diagnosticado com MGMT metilado, com mediana de sobrevida que chegou a 46 meses”, disse o especialista, lembrando que até bem pouco tempo a sobrevida do GBM era apenas de 14 ou 15 meses . “Agora vamos realmente usar MGMT para guiar os nossos tratamentos”, defendeu Jorge.

No astrocitoma anaplásico, o oncologista trouxe as lições do CATNON trial, com dados atualizados na ASCO 2019. “As curvas de sobrevida foram extremamente semelhantes, com 50% dos pacientes vivos em cinco anos. No entanto, as análises moleculares mostram que em pacientes IDH mutados há sim benefício da adição de temozolamida, com HR 0,63 (IC 95% 0,43-0,91 p= 0,012)”, analisou.

Para selar um debate antigo, qual o tempo ideal de adjuvância com temozolomida, estudo espanhol apresentado na ASCO 2019 mostrou que não há diferença entre seis meses de temozolomida ou > 6 meses, em análise que considerou pacientes de 159 centros.

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Radioterapia
Oncologia clinica e discussões de casos