Ana Carolina de Carvalho (foto), pesquisadora do Centro de Pesquisa em Oncologia Molecular do Hospital de Câncer de Barretos, é primeira autora de artigo na Scientific Reports que descreve o perfil genômico de uma população de pacientes com carcinoma de células escamosas de orofaringe atendidos na instituição.
Os carcinomas de células escamosas de orofaringe (OpSCC, da sigla em inglês) representam entidades clínicas, biológicas e epidemiológicas distintas, dependendo do agente etiológico: o tabaco ou o papilomavírus humano (HPV). O objetivo deste estudo foi identificar fatores genéticos em amostras de OpSCC em uma população heterogênea de pacientes.
Nesta análise foram consideradas amostras (FFPE) de 51 pacientes com OpSCC, 35% (18/51) eram HPV positivos, 86,3% (44/51) eram tabagistas ou ex-tabagistas, 96,0% relataram etilismo. A maioria dos pacientes analisados nesta coorte era do sexo masculino (98,0%), com idade variando de 35 a 76 anos (média / mediana = 55,3 / 55,0 anos).
Ao diagnóstico, 84,3% dos pacientes tinham doença avançada, de acordo com a 8ª edição da AJCC TNM, majoritariamente com tumores T3 / T4 (37/51, 72,5%) e linfonodos clinicamente positivos (N +; 45/51, 88,2%).
Todos os pacientes foram tratados com quimioterapia à base de platina concomitante à radioterapia, entre 2009 e 2017. O seguimento médio foi de 26 meses (variação de 1,00 a 86,00 meses) e 44,3% dos pacientes estavam vivos em 5 anos. Um total de 14 pacientes (27,5%) tiveram recorrência da doença. O tabagismo esteve significativamente associado à redução de sobrevida livre de recidiva (50,2% versus 100% para nunca fumantes; log-rank p = 0,045), enquanto a associação do status HPV foi marginalmente associada à sobrevida livre de recidiva (75,5% para HPV positivo versus 48,8% para HPV negativo; log-rank p = 0,082).
O sequenciamento do perfil genômico foi realizado a partir de um painel de 15 genes e identificou uma média de 2,67 variantes por amostra. Da população avaliada, 63% dos pacientes (32/51; 62,7%) apresentaram mutação em pelo menos um dos genes testados, sendo a mutação do TP53 a mais frequente.
A análise por sequenciamento de nova geração (NGS) também identificou que a presença de mutação nos genes NOTCH1 e PTEN foi significativamente associada à menor sobrevida livre de recidiva; além disso, após análise multivariada, somente a presença de mutação no gene NOTCH1 permaneceu associada a um risco de recorrência de 4,5 vezes (IC 95% da FC = 1,11–14,57; regressão de Cox p = 0,034).
A frequência de amostras mutadas por gene foi a seguinte: 45,1% (23/51) para TP53, 21,6% (11/51) para NOTCH1, 17,6% (9/51) para FAT1, 13,7% (7/51) para NSD1 e PIK3CA, 11,8% (6/51) para CDKN2A, 9,9% (5/51) para RB1, 7,8% (4/51) para KMT2D e PTEN, 5,9% (3/51) para HRAS, 3,9% (2/51) para IRF6 e FBXW7 e 2,0% (1/51) para EZH2. Nenhum paciente apresentou mutação em CASP8 e em TP63.
“Apesar da alta prevalência de tabagismo e menor frequência de casos HPV-positivos na população avaliada em relação a outras regiões do mundo, os resultados mostram que o paciente brasileiro com carcinoma de células escamosas de orofaringe exibe um perfil clínico e genético semelhante ao de outras populações com OpSCC”, concluem os autores.
Os resultados também indicam que a caracterização molecular é uma ferramenta promissora para a definição de subgrupos clínicos, auxiliando de maneira mais precisa no manejo terapêutico e definição do prognóstico.
O câncer de cabeça e pescoço é classificado como o oitavo tumor mais comum em todo o mundo, com um total de 834.860 novos casos e 431.131 mortes estimados em 2018.
A íntegra do estudo está disponível em acesso aberto.
Referência: de Carvalho, A.C., Perdomo, S., dos Santos, W. et al. Impact of genetic variants in clinical outcome of a cohort of patients with oropharyngeal squamous cell carcinoma. Sci Rep 10, 9970 (2020). https://doi.org/10.1038/s41598-020-66741-z