João Viola (foto) é autor senior do primeiro estudo de coorte brasileiro a analisar taxas de complicações e mortes de pacientes com câncer e COVID-19. A pesquisa realizada no Instituto Nacional do Cancer (INCA) evidencia a necessidade de políticas públicas urgentes e eficazes para esse grupo de pacientes especialmente vulneráveis. "O câncer é uma comorbidade importante e está relacionada com casos graves, tendo influência dos estágios da doença e de alguns grupos de tumores", destacam os autores.
O Brasil tem registrado uma curva exponencial de casos de infecção por SARS-CoV-2. O objetivo deste estudo retrospectivo foi descrever dados demográficos, clínicos, características e anormalidades laboratoriais de pacientes com câncer internados com COVID-19 na enfermaria do INCA, explorando fatores associados à morte.
Foram considerados dados de 181 pacientes admitidos de 30 de abril a 26 de maio de 2020, com idade média de 55,3 anos (DP 21,1), 50,8% ≥ 60 anos ou mais, predominantemente mulheres (60,8%). O diagnóstico de COVID-19 foi confirmado por teste de reação em cadeia da polimerase da transcriptase (RT-PCR) em amostras de swab orofaríngeo. As amostras foram coletadas logo após internação hospitalar dos pacientes com sintomas de COVID-19 e imediatamente após suspeita clínica daqueles internados por razões não relacionadas a COVID-19.
Os tumores sólidos mais prevalentes entre pacientes com câncer e COVID-19 foram mama (40 [22,1%]), gastrointestinal (24 [13,3%]) e tumores ginecológicos (22 [12,2%]). Entre as neoplasias hematológicas, predominaram linfoma (20 [11%]) e leucemia (10 [5,5%]). Da população avaliada, 34,8% dos pacientes haviam sido submetidos à quimioterapia citotóxica 60 dias antes do diagnóstico por COVID-19. Apenas nove pacientes (5%) estavam recebendo terapia-alvo ou imunoterapia com inibidores de checkpoint imune.
As complicações mais frequentes foram insuficiência respiratória (70 [38,7%]), choque séptico (40 [22,1%]) e lesão renal aguda (33 [18,2%]). “Dados iniciais de pacientes não oncológicos sugeriram que 14-19% dos casos evoluíram com complicações graves, como choque séptico, insuficiência respiratória, lesão renal e falência de múltiplos órgãos. No presente estudo, essas taxas foram muito maiores, variando de 18,2 a 38,7%, destacando a maior probabilidade de complicações graves em pacientes com câncer”, descrevem os autores.
Um total de 60 (33,1%) pacientes faleceu devido a complicações da COVID-19. “As taxas de complicações e mortes específicas por COVID-19 foram significativamente altas”, destaca o estudo do INCA.
Pela análise multivariada, os casos com admissão por sintomas de COVID-19 (p = 0,027) e com dois ou mais locais metastáticos (p <0,001) apresentaram maior risco de morte específica por COVID-19.
Os resultados completos aguardam publicação com revisão de pares.
Referência: Cancer inpatient with COVID-19: a report from the Brazilian National Cancer Institute - Andreia C. de Melo, PhD1 *, Luiz C.S. Thuler, PhD1 , Jesse L. da Silva1 , Lucas Z. de Albuquerque, MS1 , Ana C. Pecego, MD2 , Luciana de O.R. Rodrigues, MD2 , Magda S. da Conceição, MD2 ; Marianne M. Garrido, MD2 , Gelcio L. Quintella Mendes, PhD3 , Ana Cristina P. Mendes Pereira, MD4 , Marcelo A. Soares, PhD5 , and João P.B. Viola, PhD6 , on behalf of the INCA COVID-19 Task Force.