Estudo transversal buscou avaliar as díspares taxas de mortalidade por câncer de mama em mulheres indígenas e não indígenas do Amazonas. A pesquisa tem como principal investigadora a mastologista Lilian Cristina de Souza Guimarães (foto) e os resultados sugerem que o tempo prolongado de amamentação é uma das variáveis capazes de justificar o fato de a indígena do Amazonas morrer menos de câncer de mama quando comparada à não indígena.
Nesta análise, a pesquisadora considerou pacientes atendidas no Ambulatório de Mastologia do Hospital Universitário Getúlio Vargas, da Universidade Federal do Amazonas, no período de setembro de 2020 a março de 2023.Foram inscritas mulheres maiores de 20 anos, indígenas e não indígenas, para avaliar comparativamente os fatores epidemiológicos, reprodutivos e de estilo de vida entre mulheres indígenas não aldeadas e mulheres não indígenas.
Um total de 126 mulheres compuseram o conjunto de análise, sendo 39 indígenas não aldeadas que vivem em Manaus há mais de 5 anos e se encontram integradas à sociedade, 47 mulheres indígenas não aldeadas que vivem em populações ribeirinhas e interiores do Amazonas ou em Manaus há menos de 5 anos, além de 40 mulheres não indígenas. “Foram consideradas indígenas as pacientes que assim se autodeclararam”, explica Lilian.
Questionário em formato de entrevista foi aplicado com o objetivo de avaliar os diversos aspectos epidemiológicos e reprodutivos - idade, escolaridade, IMC, menarca, paridade, idade da primeira gestação, amamentação, uso de medicações hormonais - e de estilo de vida - tabagismo, consumo de bebidas alcoólicas, hábitos alimentares, atividade física, uso de ervas, raízes e sementes com finalidade terapêutica e práticas devocionais religiosas.
Os resultados revelam que não houve diferença em relação à média de idade, IMC, escolaridade, menarca e paridade entre as pacientes entrevistadas. Em relação ao estilo de vida, também não houve diferença na avaliação de hábito de consumo de leite, açúcar, frutas, verduras e legumes, prática de atividade física, consumo de álcool e tabagismo. No entanto, algumas variáveis apresentaram diferença estatística. “As indígenas residentes em Manaus apresentaram menor idade de primeira gestação quando comparadas às não indígenas, mas não houve diferença quando comparadas não indígenas com indígenas do interior”, ilustra a pesquisadora.
Outra diferença apontada no estudo revela que as mulheres não indígenas apresentaram maior tempo de uso de medicações hormonais quando comparadas com indígenas residentes em Manaus, mas também sem diferença quando comparadas com indígenas do interior. “São achados que não explicam porque ambos os grupos de mulheres indígenas são menos acometidas por câncer de mama”, analisa Lilian.
Quanto ao hábito de consumo de carnes, as indígenas residentes em populações ribeirinhas e interiores mostraram porcentagens maiores de consumo esporádico de carne bovina (53,2% versus 20%), de consumo esporádico de animais silvestres (51,1% versus 12,5%) e de consumo diário de carnes brancas (29,8% versus 5%) comparativamente às não indígenas. Por outro lado, mulheres não indígenas apresentaram maior porcentagem de nunca ter consumido carne de animais silvestres quando comparadas às indígenas, independentemente do local de residência. Em mulheres indígenas de populações ribeirinhas, houve menor porcentagem de prática religiosa/espiritual (72,3%) comparativamente aos dois outros grupos (acima de 92%). O consumo de ervas, raízes ou sementes com finalidade terapêutica foi mais observado em indígenas residentes em Manaus quando comparadas às não indígenas.
A variável “tempo de amamentação” não atingiu significância estatística, mas demonstrou índice bastante próximo (p= 0,058) e foi a única variável com tendência em comprovar que indígenas, independentemente de local de residência, amamentam por mais tempo e podem ter nesse fator uma possível resposta para os baixos índices de mortalidade por câncer de mama.
“A mortalidade por câncer de mama na mulher indígena é de etiologia complexa e difícil de ser entendida se nos fixarmos apenas nos fatores epidemiológicos e de estilo de vida. São necessárias comparações conjugadas envolvendo, adicionalmente, padrão de imagem das mamas e estudos genéticos”, conclui a pesquisadora.
A pesquisa é a tese de mestrado da mastologista Lilian Cristina de Souza Guimarães, sob a orientação de Afonso Nazário, Professor Livre-Docente e Coordenador do Curso de Pós-Graduação do Departamento de Ginecologia da EPM/UNIFESP.
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Tempo de amamentação pode evitar mortalidade por câncer de mama em indígenas do Amazonas
Pesquisa da mastologista Lilian Cristina de Souza Guimarães, do Hospital Getúlio Vargas, da Universidade Federal do Amazonas, mostra que a amamentação prolongada é uma das variáveis capazes de justificar as díspares taxas de mortalidade por câncer de mama em mulheres indígenas e não indígenas do Amazonas. Em vídeo com participação de Afonso Celso Nazário, Professor Livre-Docente e Coordenador do Curso de Pós-Graduação do Departamento de Ginecologia da EPM/UNIFESP, ela apresenta os principais achados do estudo.