Onconews - Privação socioeconômica e resultados de câncer em participantes de estudos clínicos

equidade saude 21 bxO acesso inicial ao tratamento de qualidade para o câncer, representado pela participação em um ensaio clínico, é insuficiente para eliminar as disparidades de resultados relacionados à privação socioeconômica. A conclusão é de estudo do SWOG Cancer Research Network publicado no Journal of Clinical Oncology (JCO). “Políticas para mitigar as diferenças socioeconômicas nos resultados do câncer devem enfatizar o acesso aos serviços de tratamento do câncer além da terapia inicial”, salientam os autores.

Pacientes com câncer que vivem em áreas socioeconomicamente desfavorecidas apresentam piores resultados da doença. Um dos principais motivos subjacentes é que indivíduos de áreas carentes socioeconomicamente têm acesso limitado aos recursos de saúde. No câncer, uma questão não resolvida é se as disparidades socioeconômicas nos resultados permanecem após o acesso a cuidados oncológicos de qualidade.

Nessa análise, Joseph Unger e colegas examinaram os resultados de sobrevida de pacientes inscritos em ensaios clínicos de Fase III e grandes estudos de Fase II conduzidos pela SWOG Cancer Research Network entre 1985 e 2012 nos principais tipos de câncer.

A privação socioeconômica foi avaliada utilizando códigos postais residenciais dos participantes dos ensaios vinculados ao Índice de Privação de Área (ADI), uma medida de classificação socioeconômica dos bairros dos Estados Unidos criada com um amplo conjunto de 17 variáveis, incluindo educação, emprego, qualidade da habitação e pobreza. A sobrevida global em cinco anos, sobrevida livre de progressão e sobrevida câncer-específica foram examinadas ajustando para idade, sexo e raça, e separadamente para status de seguro saúde, risco prognóstico e residência em área rural ou urbana.

Resultados

Os pesquisadores examinaram 41.109 pacientes de 55 estudos diagnosticados com os principais tipos de câncer, sendo a maioria pacientes de câncer de pulmão, mama, colorretal e próstata. Os pacientes também se encontravam em diferentes estágios da doença, incluindo 37% com doença em estágio avançado.

Em comparação com os participantes do ensaio nas áreas mais favorecidas economicamente (ADI, 0% -20%), os participantes do ensaio das áreas com maior privação socioeconômica (ADI, 80% -100%) apresentaram menor sobrevida global (hazard ratio [HR] = 1,28, 95 % CI, 1,20-1,37, P <0,001), sobrevida livre de progressão (HR = 1,20, IC 95%, 1,13-1,28, P <0,001) e sobrevida câncer-específica (HR = 1,27, IC 95%, 1,18 a 1,37, P <0,001). Os resultados foram semelhantes após o ajuste para status de seguro saúde, risco prognóstico e residência rural ou urbana. Houve um aumento contínuo no risco de todos os resultados conforme o aumento no quintil ADI.

“Mesmo com acesso a um ensaio clínico, pacientes com câncer que vivem em regiões mais pobres apresentam uma chance 28% maior de morrer da doença em comparação com pacientes mais ricos. As descobertas ilustram os efeitos teimosamente prejudiciais da pobreza sobre a saúde e a expectativa de vida”, afirmou Joseph Unger, pesquisador de serviços de saúde do SWOG, bioestatístico do Fred Hutchinson Cancer Research Center e primeiro autor do estudo.

Unger observa que muitos fatores impulsionam as disparidades, desde a falta de acesso a bons cuidados médicos a um risco aumentado de tabagismo, obesidade e outros fatores que podem levar a problemas de saúde. “Dois estudos anteriores usando dados do Censo dos EUA mostraram que pacientes com câncer em situação de privação socioeconômica tinham mais de 60% de probabilidade de morrer em comparação com pacientes mais ricos. Os resultados mostrando uma diferença de 28% sugerem que o tipo de tratamento de câncer baseado em diretrizes que os pacientes recebem em um ensaio clínico pode eliminar cerca de metade dos efeitos negativos da pobreza. O que é surpreendente e desanimador é saber que, embora todos os pacientes se beneficiem dos ensaios, os pacientes mais pobres têm muito mais probabilidade de morrer de câncer. A disparidade persiste”, avalia.

“Esses achados sugerem que o acesso inicial ao tratamento de qualidade para o câncer, representado aqui pelo tratamento em um ensaio clínico, é insuficiente para eliminar os resultados díspares relacionados à privação socioeconômica. As políticas para mitigar as diferenças socioeconômicas nos resultados do câncer devem enfatizar o acesso aos serviços de tratamento do câncer além da terapia inicial, com uma abordagem mais agressiva para prevenção e promoção da saúde dirigida à população de baixa renda” concluem os autores.

O estudo foi financiado pelo NIH por meio de concessões do NCI CA189974, CA180888 e CA180819; e apoiado em parte pela The Hope Foundation for Cancer Research.

Referência: Persistent Disparity: Socioeconomic Deprivation and Cancer Outcomes in Patients Treated in Clinical Trials – Joseph Unger et al - DOI: 10.1200/JCO.20.02602 Journal of Clinical Oncology - Published online March 17, 2021.