Entre 4.966 pacientes com câncer diagnosticados com COVID-19, 58% foram hospitalizados e 14% morreram em 30 dias. Os resultados são de estudo de coorte observacional retrospectivo do COVID-19 and Cancer Consortium (CCC19) publicado no Annals of Oncology, em artigo que tem o oncologista brasileiro Gilberto Lopes (foto) como autor sênior. "Um ano após o começo da pandemia, agora temos dados suficientes para informar nossas decisões em relação a pacientes com câncer e infecção pelo novo coronavírus", destaca Lopes.
“Confirmamos a alta gravidade e mortalidade de COVID-19 entre pacientes com câncer, em particular para aqueles com idade mais avançada, sexo masculino, raça/etnia não hispânica não branca, pior performance status ECOG, malignidades hematológicas e medições laboratoriais selecionadas. Certos regimes de quimioterapia também foram associados a alta mortalidade por todas as causas”, destacam os autores.
Os pesquisadores analisaram uma coorte de pacientes com câncer e COVID-19 relatados ao COVID-19 and Cancer Consortium (CCC19) para identificar fatores clínicos prognósticos, incluindo medições laboratoriais e terapias anticâncer. Foram incluídos pacientes com câncer ativo ou histórico de câncer e diagnóstico de SARS-CoV-2 registrado entre 17 de março e 18 de novembro de 2020.
O endpoint primário foi a gravidade do COVID-19 medida em uma escala ordinal (não complicado, hospitalizado, internado em unidade de terapia intensiva, ventilado mecanicamente, morte em 30 dias). Os modelos de regressão multivariável incluíram dados demográficos, status do câncer, terapia anticâncer e tempo, terapias dirigidas ao COVID-19 e medições laboratoriais entre pacientes hospitalizados.
Resultados
Foram incluídos 4.966 pacientes, com mediana de 66 anos de idade, 51% mulheres, 50% brancos não hispânicos; 2.872 (58%) foram hospitalizados e 695 (14%) morreram; 61% tinham câncer ativo, diagnosticado ou tratado no ano anterior ao diagnóstico de COVID-19. Idade avançada, sexo masculino, obesidade, comorbidades cardiovasculares e pulmonares, doença renal, diabetes mellitus, raça negra não hispânica, etnia hispânica, pior performance status ECOG, quimioterapia citotóxica recente e malignidade hematológica foram associados com maior gravidade de COVID-19.
“A maior gravidade da COVID-19 em pacientes de etnia não-hispânica e não-branca e maior mortalidade em 30 dias para pacientes negros não-hispânicos pode sugerir disparidades no acesso, fornecimento e pesquisa de cuidados de saúde, especialmente no contexto de nossos achados anteriores e de uma revisão sistemática recente que demonstrou que pacientes negros não hispânicos tinham menos probabilidade de receber novos tratamentos anti-COVID-19”, observam os autores.
Entre os pacientes hospitalizados, baixa ou alta contagem absoluta de linfócitos, alta contagem absoluta de neutrófilos, baixa contagem de plaquetas, creatinina anormal, troponina, LDH e PCR foram associados com maior gravidade de COVID-19.
Os autores ressaltam que apesar do estudo incluir uma gama mais ampla de medições laboratoriais coletadas rotineiramente, identificando novos parâmetros associados a maior gravidade de COVID-19, não foram coletados valores laboratoriais agora reconhecidos como associados à gravidade de COVID-19, como por exemplo, ferritina e procalcitonina. “Esforços futuros incluirão a extração automatizada destes e de valores longitudinais diretamente de registros eletrônicos de saúde (EHRs)”, afirmam.
Os pacientes diagnosticados no início da pandemia de COVID-19 (janeiro-abril de 2020) tiveram resultados piores em comparação com aqueles diagnosticados posteriormente. Terapias anticâncer específicas (por exemplo, R-CHOP, platina combinada com etoposídeo e inibidores de DNA metiltransferase) foram associadas com alta mortalidade em 30 dias por todas as causas.
Em conclusão, fatores clínicos (por exemplo, idade avançada, malignidade hematológica e quimioterapia recente) e medições laboratoriais foram associados a piores resultados entre pacientes com câncer e COVID-19.
Os autores ressaltam que embora esses dados possam informar sobre fatores prognósticos e estratificação de risco, e também ampliar significativamente a compreensão neste tópico, os achados são geradores de hipóteses e podem não modificar diretamente a prática clínica diária. “Esses achados podem informar a nova pesquisa translacional, desenhos de ensaios clínicos e tomada de decisão clínica para pacientes com câncer com COVID-19. Os pesquisadores do CCC19 planejam uma investigação mais aprofundada sobre as disparidades de saúde, resultados para subtipos específicos de câncer e impacto de determinadas terapias anticâncer”, concluem.
Referência: Association of Clinical Factors and Recent Anti-Cancer Therapy with COVID-19 Severity among Patients with Cancer: A Report from the COVID-19 and Cancer Consortium - P. Grivas; A.R. Khaki; T.M. Wise-Draper; D.P. Shah; J.L. Warner; G. dL. Lopes Jr. - Published:March 18, 2021 DOI:https://doi.org/10.1016/j.annonc.2021.02.024