Onconews - Radioterapia versus linfadenectomia inguinofemoral no câncer vulvar

celia viegas 21A radioterapia inguinofemoral é uma alternativa segura à linfadenectomia inguinofemoral em pacientes com câncer vulvar que apresentem micrometástases de linfonodo sentinela, como demonstram resultados de estudo internacional relatados por Oonk et al no Journal of Clinical Oncology (JCO). A radio-oncologista Célia Viegas (foto), médica do Instituto Nacional do Câncer (INCA) e do São Carlos Saúde Oncológica, comenta os resultados.

Neste estudo prospectivo multicêntrico de fase II (GROINSS-V-II) foram incluídas pacientes com câncer vulvar em estágio inicial (diâmetro tumoral <4 cm) sem sinais de envolvimento nodal em exames de imagem, que receberam tratamento cirúrgico primário (excisão local com biópsia de linfonodo sentinela -LNS). Pacientes que apresentaram envolvimento de LNS (metástases de qualquer tamanho) receberam radioterapia (RT) inguinofemoral, com dose de 50 Gy. O endpoint primário foi a taxa de recidiva inguinofemoral isolada, em 24 meses.

Resultados

De dezembro de 2005 a outubro de 2016, os autores descrevem que 1.535 pacientes foram incluídas. Um total de 322 (21%) pacientes apresentaram metástases de LNS. Em junho de 2010, a taxa de recidiva isolada na virilha ficou acima do limite predefinido. Entre 10 pacientes com recidiva isolada na virilha, nove tinham metástases LNS> 2 mm e / ou disseminação extracapsular. O protocolo foi alterado para que aquelas com macrometástases em LNS (> 2 mm) fossem submetidas a tratamento cirúrgico padrão (Linfadenectomia inguinofemoral-LIF), enquanto as pacientes com micrometástases em LNS (≤ 2 mm) continuassem a receber radioterapia inguinofemoral.

Entre 160 pacientes com micrometástases de LNS, 126 receberam RT inguinofemoral, com taxa de recidiva isolada inguinal ipsilateral em 2 anos de 1,6%. Entre 162 pacientes com macrometástases em LNS, a taxa em 2 anos de recidiva isolada inguinal foi significativamente superior (22%) naquelas que realizaram RT quando comparadas àquelas submetidas a LIF (6,9% -p = 0,011). A morbidade relacionada ao tratamento após a RT foi menos frequente em comparação com LIF.

Para os autores, esses resultados mostram que a radioterapia inguinofemoral é uma alternativa segura à linfadenectomia inguinofemoral em pacientes com micrometástases de LNS, com morbidade mínima. Para pacientes com macrometástases LNS, a radioterapia com dose total de 50 Gy resultou em maiores taxas isoladas de recidiva na virilha em comparação com LIF. “A radioterapia inguinofemoral pode poupar pacientes com câncer vulvar com micrometástases LNS da morbidade da linfadenectomia. Isso deve ser implementado nas diretrizes de tratamento para o câncer vulvar”, defendem.

Radioterapia pode poupar pacientes selecionadas com câncer vulvar da morbidade inerente à linfadenectomia

Por Célia Viegas, radio-oncologista do Instituto Nacional do Câncer (INCA) e do São Carlos Saúde Oncológica

A introdução da cirurgia de linfonodo sentinela (LNS) inguinal é um dos principais avanços recentes no tratamento do câncer vulvar. O primeiro estudo a avaliar o papel da cirurgia de LNS em câncer vulvar, (The Groningen International Study on Sentinel nodes in Vulvar cancer - GROINSS-V-I)1 mostrou previamente que a linfadenectomia inguinofemoral poderia ser omitida com segurança nas pacientes cujos LNS se demonstrassem negativos para malignidade, resultando em diminuição significativa da morbidade decorrente de uma cirurgia inguinal (tais como redução de edema de membro inferior, bem como restrições de mobilidade local e riscos de trombose  venosa). Entretanto, para aquelas pacientes com LNS metastático, ainda deveria ser necessária a linfadenectomia e as morbidades associadas a este tratamento.

O estudo seguinte do grupo de trabalho do GROINSS de abordagens sequenciais de tratamentos após um LNS inguinal positivo para neoplasia, e acima discutido, GROINSS-V-II,2 investigou a segurança da radioterapia (RT) inguinofemoral em substituição à linfadenectomia (LIF) em pacientes com câncer vulvar,que apresentassem LNS metastático.  

Os critérios de inclusão do estudo foram: histologia de carcinoma espinocelular macroinvasivo unifocal da vulva até 4 cm; imagens pré-operatórias das regiões inguinofemorais (tomografia computadorizada [TC], ressonância magnética ou ultrassonografia) sem linfonodos suspeitos ao exame e, onde os gânglios inguinais parecessem suspeitos em tamanho [. 15 mm] ou com morfologia questionável, doença metastática foi descartada por citologia aspirativa por agulha fina.

A informação gerada neste estudo quanto ao papel da radioterapia, veio sugerir mudanças de paradigmas na abordagem de pacientes com este cenário: a adição de RT é igualmente segura e efetiva para taxas de recidiva inguinofemoral, em comparação com os dados GROINSS-V-I 1 para pacientes com micrometástases locais em LNS com dimensões ≤ 2 mm, evidenciando índices de recidiva local similares a pacientes com LNS negativo para malignidade. Além de índices seguros de recidiva e controle local, a morbidade da RT inguinofemoral foi menor em comparação com a linfadenectomia desta região.

No entanto, para pacientes com macrometástases (> 2 mm) em LNS, a taxa de recidiva foi significativamente maior com a radioterapia, comparada à LIF. Em situação de macrometástases, para os autores, a terapia padrão continua sendo a linfadenectomia, e mais pesquisas são necessárias. O escalonamento da dose de radioterapia em combinação com quimioterapia está sendo investigado para tais pacientes no próximo estudo deste grupo, o GROINSS-V-III.

Portanto, este importante estudo acima detalhado, GROINSS-V-II,2 demonstrou que a radioterapia inguinofemoral pode poupar as pacientes com câncer vulvar com micrometástases ≤ 2 mm em LNS da morbidade inerente relacionada à linfadenectomia inguinofemoral. Os autores sugerem que esta abordagem seja alertada e implementada em diretrizes nacionais e internacionais de tratamentos de câncer vulvar, neste cenário. O estudo foi considerado tão relevante que foi liberado para divulgação online antes de sua publicação física no periódico de origem.

Referências: 

1 - Van der Zee AG, Oonk MH, De Hullu JA, et al: Sentinel node dissection is safe in the treatment of early-stage vulvar cancer. J Clin Oncol 26:884-889, 2008

2 - Radiotherapy Versus Inguinofemoral Lymphadenectomy as Treatment for Vulvar Cancer Patients With Micrometastases in the Sentinel Node: Results of GROINSS-V II - Maaike H. M. Oonk, PhD et al - DOI: 10.1200/JCO.21.00006 Journal of Clinical Oncology - Published online August 25, 2021.