Artigo de Riera et al. publicado no JCO Global Oncology discute atrasos e interrupções no tratamento do câncer provocados pela carga da COVID-19, além de propor caminhos para harmonizar as métricas sobre o impacto da pandemia. As interrupções afetaram amplamente as instalações (até 77,5%), a cadeia de suprimentos (até 79%) e a disponibilidade de pessoal (até 60%), reportam os autores.
Nesta revisão sistemática, os pesquisadores analisaram 62 estudos, nenhum de alta qualidade metodológica, que identificaram 38 categorias diferentes relacionadas a atrasos e interrupções com impacto no tratamento (N=22), diagnóstico (N=7) ou processos dos serviços de saúde (N=9).
As variáveis relacionadas ao provedor ou ao sistema foram os fatores estruturais mais frequentemente relatados (n = 204), principalmente relacionados à redução na disponibilidade do serviço (redução geral em qualquer atividade, como visitas médicas, cirurgias, procedimentos, sessões de radioterapia e quimioterapia etc) (n = 143/204). “Este é um achado importante para apoiar novas estratégias com o objetivo de mitigar os atrasos e interrupções no tratamento do câncer”, destaca a publicação.
A interrupção do tratamento em qualquer estágio foi relatada por até 77,5% dos pacientes que responderam às pesquisas. Três estudos longitudinais avaliaram a interrupção do tratamento e relataram uma taxa de até 26,3%. Exceto por um estudo que observou taxa de cancelamento de 14% em biópsias de medula óssea durante a pandemia, nenhum dos trabalhos abordou a interrupção de processos diagnósticos ou programas organizados de rastreamento de base populacional.
“De acordo com os estudos incluídos, a disponibilidade e manutenção de serviços oncológicos parecem ter sido substancialmente afetadas pela pandemia. A interrupção na cadeia de suprimentos, que inclui desde medicamentos até manutenção técnica de equipamentos de imagem, foi relatada por até 79% dos centros entrevistados”, descrevem os autores. Um dos estudos incluídos mostra que a escassez de medicamentos motivou a modificação dos regimes de quimioterapia em 36% dos casos, enquanto um segundo trabalho descreveu que 43% dos centros relataram dificuldade de acesso ou acesso reduzido à medicação anticâncer.
O artigo do JCO Global Oncology também descreve que a quarentena e o deslocamento da força de trabalho para o atendimento da COVID-19 foram responsáveis pela redução de pessoal na atenção ao câncer. Diante dessa escassez, a taxa de hospitalização por câncer também foi reduzida em até 30% em relação ao período pré-pandêmico.
Os estudos incluídos foram realizados em vários países, com sistemas e políticas de saúde públicos e privados. Doze condições diferentes de câncer foram consideradas, incluindo doença em estágio inicial e / ou metastática, com dados coletados em diferentes estágios da pandemia.
O oncologista Felipe Roitberg, autor correspondente, lembra que o trabalho reflete o esforço da Organização Mundial de Saúde (OMS) para amparar a tomada de decisões . “Isso mostra como a OMS, por meio dos estados membros, se vale da geração do melhor nível de evidência possível para fomentar políticas públicas de impacto e, nesse caso, modelagens matemáticas como as que estamos finalizando”, ressalta Roitberg, Cancer Control Management da OMS.
Referência: Delays and Disruptions in Cancer Health Care Due to COVID-19 Pandemic: Systematic Review - DOI: 10.1200/GO.20.00639 JCO Global Oncology no. 7 (2021) 311-323. Published online February 22, 2021.
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