Em pacientes com carcinoma hepatocelular localmente avançado ou intermediário não ressecável, a sobrevida global não diferiu significativamente entre a radioterapia interna seletiva com ítrio-90 (90Y) e o tratamento sistêmico com sorafenibe. É o que mostram os resultados do estudo SARAH, sugerindo que a qualidade de vida e a tolerância podem ajudar na escolha entre os dois tratamentos. A oncologista Renata D'Alpino (foto), do Grupo Brasileiro de Tumores Gastrointestinais (GTG), comenta os resultados.
SARAH é um estudo randomizado, multicêntrico, de fase 3, realizado em 25 centros especializados em doenças hepáticas na França. Foram inscritos pacientes com idade ≥ 18 anos, com expectativa de vida superior a 3 meses e performance status ECOG de 0 ou 1, função hepática de Child-Pugh classe A ou B, com carcinoma hepatocelular localmente avançado ou recorrente, não elegíveis para ressecção cirúrgica. Foram considerados elegíveis pacientes previamente tratados por cirurgia ou terapia termoablativa ou, ainda, por duas intervenções mal-sucedidas de quimioembolização transarterial.
Os pacientes foram randomizados (1: 1) para receber sorafenibe contínuo via oral (400 mg duas vezes por dia) ou radioterapia interna seletiva (SIRT) com microesferas de resina de ítrio-90 por 2-5 semanas após a randomização. Os pacientes foram estratificados por performance status ECOG, quimioembolização transarterial prévia e presença de invasão vascular macroscópica. O endpoint primário foi a sobrevida global. As análises foram feitas na população por intenção de tratar e a segurança foi avaliada em todos os pacientes que receberam pelo menos uma dose de sorafenibe ou foram submetidos a pelo menos um tratamento com SIRT.
Resultados
Entre 5 de dezembro de 2011 e 12 de março de 2015, 467 pacientes foram distribuídos aleatoriamente, mas oito retiraram o consentimento. 237 pacientes foram atribuídos ao SIRT e 222 ao sorafenibe. No grupo SIRT, 53 (22%) de 237 pacientes não receberam SIRT; 26 (49%) destes 53 pacientes foram tratados com sorafenibe. O acompanhamento médio foi de 27,9 meses no grupo SIRT e de 28,1 meses no grupo sorafenibe.
A mediana de sobrevida global foi de 8,0 meses no grupo SIRT versus 9,9 meses no grupo sorafenibe (hazard ratio 1 ,15 [95 % CI 0 · 94-1 · 41]; p = 0,18).
Na avaliação de segurança, pelo menos um evento adverso grave foi relatado em 174 (77%) de 226 pacientes no grupo SIRT e em 176 (82%) de 216 no grupo sorafenibe. Os eventos adversos de grau 3 mais frequentes foram fadiga (20 [9%] vs 41 [19%]), disfunção hepática (25 [11%] vs 27 [13%]), aumento das transaminases hepáticas (20 [9%] contra 16 [7%]), anormalidades hematológicas (23 [10%] vs 30 [14%]), diarreia (três [1%] vs 30 [14%]), dor abdominal (seis [3% ] vs 14 [6%]), aumento da creatinina (quatro [2%] vs 12 [6%]) e reação cutânea mão-pé (um [<1%] vs 12 [6%]). 19 mortes no grupo SIRT e 12 no grupo sorafenibe foram relacionadas ao tratamento.
A conclusão do estudo SARAH mostra que em pacientes com carcinoma hepatocelular localmente avançado ou intermediário, a sobrevida global não diferiu significativamente entre os dois grupos (SIRT vs Sorafenibe). O SARAH está registrado no ClinicalTrials.gov, sob o número NCT01482442.
“O estudo SARAH mostrou que SIRT é mais uma opção de tratamento para pacientes com HCC localmente avançado ou intermediário, com um perfil de toxicidade aceitável, levando a menos eventos adversos do que o sorafenibe neste cenário. Este é um tratamento muito útil especialmente para pacientes que falharam à quimioembolização intra-arterial hepática prévia. No entanto, trata-se de uma terapia muito cara e pouco disponível no Brasil, fazendo com que a aplicação na prática clínica seja limitada”, afirma a oncologista Renata D'Alpino (foto), coordenadora de Tumores Gastrointestinais e Neuroendócrinos do Hospital Alemão Oswaldo Cruz e membro do Grupo Brasileiro de Tumores Gastrointestinais (GTG).
Referência: Efficacy and safety of selective internal radiotherapy with yttrium-90 resin microspheres compared with sorafenib in locally advanced and inoperable hepatocellular carcinoma (SARAH): an open-label randomised controlled phase 3 trial - Vilgrain, ValérieAssenat, Eric et al. - The Lancet Oncology