O teste genético universal detectou mais variantes clinicamente acionáveis em comparação com uma abordagem baseada em diretrizes, com uma associação significativa com o manejo clínico. Os resultados são de estudo publicado no JAMA Oncology, em artigo com a participação do oncologista Pedro Uson Junior (foto), pesquisador fellow na Mayo Clinic.
Os fatores hereditários desempenham um papel fundamental no risco de desenvolver vários tipos de câncer, e a identificação de uma predisposição da linhagem germinativa pode ter implicações importantes para as decisões de tratamento, intervenções de redução de risco e rastreamento do câncer.
No estudo de coorte multicêntrico e prospectivo, os pesquisadores examinaram a prevalência de variantes patogênicas da linhagem germinativa (PGVs) em pacientes com câncer usando uma abordagem de teste universal em comparação com o teste direcionado com base em diretrizes clínicas. Também foi avaliada a adoção de testes de variantes familiares em cascata (FVT).
Foram avaliadas as alterações genéticas da linhagem germinativa utilizando uma plataforma de sequenciamento de nova geração, entre pacientes com tumores sólidos atendidos nos centros de câncer da Mayo Clinic e em uma prática comunitária entre 1º de abril de 2018 e 31 de março de 2020. Os pacientes não foram selecionados com base no tipo de câncer, estágio da doença, história familiar de câncer, etnia ou idade.
Um total de 2.984 pacientes (mediana de 61,4 [12,2] anos; 1582 [53,0%] do sexo masculino) foram investigados. Variantes da linhagem germinativa patogênica foram encontradas em 397 pacientes (13,3%), incluindo 282 genes de suscetibilidade ao câncer de penetrância moderada e alta. Variantes de significado incerto foram encontradas em 1.415 pacientes (47,4%).
192 pacientes (6,4%) tiveram achados incrementais clinicamente acionáveis que não teriam sido detectados pelo fenótipo ou critérios de teste baseados na história familiar indicados pelos guidelines do NCCN (National Comprehensive Cancer Network) 2018, NSGC (National Society of Genetic Counselors) ou ACMG (American College of Medical Genetics). Entre aqueles com variantes patogênicas da linhagem germinativa de alta penetrância, 42 pacientes (28,2%) tiveram modificações em seu tratamento com base no achado. Apenas a idade mais jovem ao diagnóstico foi associada à presença de PGV, e 70 pacientes (17,6%) com PGVs tiveram familiares submetidos à testes de variantes familiares em cascata gratuitos.
Os resultados demonstraram que o teste de painel multigênico universal entre pacientes com tumores sólidos foi associado a um aumento na detecção de variantes hereditárias em relação ao rendimento previsto de testes direcionados com base nas diretrizes. “Quase 30% dos pacientes com variantes de alta penetrância tiveram modificações em seu tratamento, 15% foram incluídos em tratamentos com terapias alvo ou ensaios clínicos”, destacaram os autores, observando a baixa adesão aos testes de variantes familiares em cascata, apesar de ser oferecido sem custo.
Uson Junior esclarece que no total o teste germinativo universal demonstrou que 1 em cada 8 pacientes com tumores sólidos apresenta uma variante patogênica de linhagem germinativa. “Vale destacar que em torno de 50% dessas variantes não seriam detectadas utilizando os guidelines em referência no decorrer do estudo. Outro ponto que nos chamou atenção foi a presença de variantes em tumores que normalmente não são relacionados a linhagem germinativa como tumores de vias biliares, cabeça e pescoço e sistema nervoso central”, explica.
Segundo o especialista, uma das maiores limitações de testagem em cascata de familiares é associada ao custo; porém, a barreira financeira foi retirada, já que o teste de familiares foi oferecido aos participantes. “A baixa adesão ao teste demonstra as barreiras além do custo, que envolvem a baixa compreensão do risco e benefício, preocupações sociais como discriminação, angústia com o resultado e em relação à seguradora de saúde frente a necessidades de exames adicionais. Este estudo contribui para a discussão da ampliação de testes na linhagem germinativa com painéis amplos a todos pacientes com tumores sólidos, além de demonstrar as dificuldades de testagem em cascata de familiares e as barreiras sociais encontradas nesse processo”, conclui.
Referência: Samadder NJ, Riegert-Johnson D, Boardman L, et al. Comparison of Universal Genetic Testing vs Guideline-Directed Targeted Testing for Patients With Hereditary Cancer Syndrome. JAMA Oncol. Published online October 30, 2020. doi:10.1001/jamaoncol.2020.6252