Onconews - Teste identifica mutações do gene BRCA2 associadas ao câncer de mama e ovário

MURAD 2018 NET OKUm novo teste desenvolvido por pesquisadores da Mayo Clinic identificou quais mutações no gene BRCA2 tornam as mulheres suscetíveis ao desenvolvimento de câncer de mama ou ovário. A pesquisa foi publicada dia 25 de janeiro no American Journal of Human Genetics. “Os resultados abrem uma nova perspectiva na melhor classificação e identificação das VUS e, consequentemente, uma orientação genética e familiar mais precisa para seus portadores”, observa o oncologista André Murad (foto), professor adjunto e Coordenador da Disciplina de Oncologia da UFMG e Diretor Clínico da Personal - Oncologia de Precisão e Personalizada e do Laboratório Personal de Genética Molecular.

Muitas variantes de significado incerto (VUS) foram identificadas no BRCA2 através de testes clínicos genéticos. O VUS representa um desafio clínico significativo porque a contribuição dessas variantes para o risco de câncer não foi determinada.

"Certas mutações herdadas no gene BRCA2 foram associadas ao câncer de mama e ovário", diz Fergus Couch, autor principal do estudo. "Este teste oferece uma excelente maneira de prever se as mutações hereditárias individuais causam câncer".

No estudo, os pesquisadores descreveram um teste laboratorial que pode estabelecer quais mutações hereditárias no gene BRCA2 estão relacionadas com o câncer. Entre as 139 variantes avaliadas, 54 tinham ≥ 99% de probabilidade de patogenicidade e 73 tinham ≥95% de probabilidade de neutralidade.

"Até agora, só havíamos estabelecido que 13 mutações hereditárias no BRCA2 são patogênicas e conhecidas por causar câncer", diz Couch. "Neste estudo, identificamos 54 mutações que aumentam o risco de câncer. Da mesma forma, tínhamos 21 mutações neutras conhecidas por não aumentar o risco de câncer. Agora, esse número foi expandido para 73 mutações", afirmou.

O estudo foi financiado por subsídios do National Cancer Institute specialized program of research excellence (SPORE), National Institutes of Health, e Breast Cancer Research Foundation.

Referência:  Assessment of the Clinical Relevance of BRCA2 Missense Variants by Functional and Computational Approaches - Lucia Guidugli, Hermela Shimelis, David L. Masica, Vernon S. Pankratz, Gary B. Lipton, Namit Singh, Chunling Hu, Alvaro N.A. Monteiro, Noralane M. Lindor, David E. Goldgar, Rachel Karchin, Edwin S. Iversen, Fergus J. Couch - DOI: http://dx.doi.org/10.1016/j.ajhg.2017.12.013

Novas perspectivas

Por Andre Marcio Murad

Quando um indivíduo se submete a um teste genético germinativo, incluindo o sequenciamento de genes e a avaliação dos microarranjos cromossômicos, não é incomum que o exame revele pelo menos uma variante gênica. No entanto, nem todas as variantes se comportam fenotipicamente de forma uniforme.

Embora algumas possam causar doenças, a maioria não tem consequências biológicas. Distinguir entre esses tipos de variantes (interpretar / classificar a variante ou estabelecer seu significado clínico) é um dos aspectos mais desafiadores dos exames genéticos. O significado clínico de uma variante não pode ser baseado em apenas uma única evidência, mas em um conjunto de evidências que precisa ser cuidadosamente ponderado e analisado.

A interpretação de variantes é de certa forma subjetiva mesmo quando se utiliza uma metodologia definida, como as diretrizes do ACMG (American College of Medical Genetics and Genomics). Isso pode resultar em diferentes interpretações e por diferentes laboratórios. Muitas doenças genéticas exibem heterogeneidade no locus, e a mesma doença pode ter diferentes causas genéticas – algumas conhecidas e outras ainda a serem descobertas.

Nessas circunstâncias, é difícil descartar uma doença genética a partir de um exame negativo de um único gene. Uma variante de significado desconhecido (VUS) não é um resultado negativo, e sim um resultado indeterminado, e deve ser tratada como tal: potencialmente patogênica ou benigna. A interpretação de variantes é baseada em informação que está disponível nos bancos de dados especializados no momento do exame. Com o tempo e à medida que mais informações se tornam disponíveis na literatura, a classificação de uma VUS pode mudar, com sua consequente reclassificação como benigna ou como patogênica.

O manejo clínico de pacientes com VUS nos genes BRCA1 e BRCA2 é um grande desafio. Discordâncias entre os bancos de dados considerados referências mundiais na área, principalmente quando essa discordância é moderada ou grave (variantes cuja interpretação varia entre VUS e patogênica ou ainda entre Benigna e Patogênica), dificultam muito a definição de condutas de manejo e acompanhamento desses pacientes. Portanto, tornam-se de suma importância novas tecnologias e metodologias para identificarmos as VUS que efetivamente possam ser classificadas como patogênicas.

Nesse estudo conduzido por pesquisadores da Mayo Clinic, uma nova ferramenta para a análise de VUS do gene BRCA2 foi testada utilizando-se o terminal C do seu domínio de ligação (DBD) através de um ensaio funcional validado da atividade de reparo de DNA de recombinação homóloga. Entre as 139 variantes avaliadas, 54 tinham ≥ 99% de probabilidade de patogenicidade e 73 tinham ≥95% de probabilidade de neutralidade.

Os resultados do ensaio funcional foram comparados com as previsões de patogenicidade do programa Align-GVGD (Align-GVGD é um programa computacional de domínio público que combina as características biofísicas de aminoácidos e alinhamentos de seqüências múltiplas de proteína com a finalidade de se prever quando as substituições do tipo "missense" em genes são de interesse fenotípico), o que demonstrou uma robusta correlação. Posteriormente, os resultados de predição funcionais e Align-GVGD foram combinados em um modelo hierárquico bayesiano (VarCall) para estimar a probabilidade geral de patogenicidade para cada VUS.

A análise final permitiu a identificação de 54 mutações responsáveis pelo aumento do risco de câncer, e não apenas 13, como anteriormente identificadas. Da mesma forma, 73 mutações não causadoras de câncer foram identificadas, e não apenas 21, como sugerido em estudos anteriores. Portanto, consideramos estes resultados relevantes pois nos abrem uma nova perspectiva na melhor classificação e identificação das VUS e, consequentemente, uma orientação genética e familiar mais precisa para seus portadores.