Mais de 10% dos testes imunoquímicos fecais (FIT) utilizados para o rastreamento de rotina do câncer colorretal num sistema de saúde com rede de segurança continham amostras insatisfatórias que não puderam ser processadas. “A eficácia do FIT depende da conclusão satisfatória de múltiplas etapas, e uma falha em qualquer uma delas pode reduzir a eficácia do rastreio”, explicou Po-Hong Liu (foto), pesquisador do UT Southwestern Medical Center e coprimeiro autor do estudo. O trabalho foi publicado na Cancer Epidemiology, Biomarkers & Prevention, periódico da American Association for Cancer Research (AACR).
O FIT é um teste de autocoleta que procura sangue oculto nas fezes e é recomendado pela US Preventive Services Task Force para triagem anual de câncer colorretal em indivíduos com idade entre 45 e 75 anos. Para muitos – incluindo indivíduos sem seguro e de baixa renda, assim como aqueles grupos clinicamente sub-representados – o FIT pode ser mais barato e mais acessível do que uma colonoscopia ou outros testes de fezes que procuram DNA potencialmente tumorigênico.
“O FIT é o teste de escolha, especialmente em populações onde o acesso ao rastreio da colonoscopia é limitado”, disse Rasmi Nair, professor assistente da Escola de Saúde Pública Peter O'Donnell Jr., do UT Southwestern Medical Center. “Mesmo quando a colonoscopia está disponível, muitos preferem fazer o teste de fezes simples e não invasivo”, acrescentou.
Embora estudos anteriores tenham examinado como aumentar a participação no FIT, poucos investigaram com que frequência a triagem é concluída sem sucesso devido a problemas com a coleta, rotulagem ou armazenamento de amostras. Além disso, não está claro até que ponto os pacientes que apresentam amostras insatisfatórias recebem testes de acompanhamento.
Neste estudo, Nair, Liu e colegas examinaram o histórico de 56.980 indivíduos com idades entre 50 e 74 anos que foram submetidos à triagem FIT entre 2010 e 2019 no sistema Parkland Health com sede em Dallas, um sistema de saúde com rede de segurança que fornece principalmente cuidados para indivíduos sem seguro, de baixa renda e de minorias raciais/étnicas. Os testes foram realizados em clínicas ou por meio de sistema de envio por correspondência, sendo que este último enviava automaticamente a repetição do teste aos indivíduos com resultado inicial insatisfatório.
Resultados
No geral, 10,2% dos testes foram considerados insatisfatórios; os laboratórios de testes registraram os motivos como amostra inadequada (51%), rotulagem incompleta (27%), amostra muito antiga (13%) ou recipiente quebrado ou com vazamento (8%). Apenas 40,7% dos indivíduos com testes insatisfatórios receberam FIT de acompanhamento ou triagem de colonoscopia dentro de 15 meses após a falha no teste.
"O fato de que, na maioria dos casos, um FIT insatisfatório não foi seguido por um teste subsequente oportuno destaca a necessidade dos sistemas terem uma abordagem melhor e mais abrangente para etiquetar e acompanhar o FIT insatisfatório", disse Liu.
Os testes por correspondência tiveram 2,66 vezes mais probabilidade de produzir resultados insatisfatórios do que os testes realizados em uma clínica, o que os autores especularam que pode refletir a assistência técnica disponível em uma clínica. No entanto, provavelmente devido à distribuição automática de um teste repetido, os pacientes com testes insatisfatórios por correspondência tinham probabilidade 1,92 vezes maior de serem submetidos a um novo rastreio no prazo de 15 meses.
O estudo também encontrou disparidades raciais e étnicas na conclusão satisfatória do FIT: os pacientes negros tinham 1,46 vezes mais probabilidade de submeter um teste insatisfatório, e os pacientes falantes de espanhol tinham 1,12 vezes mais probabilidade de submeter um teste insatisfatório.
“Este estudo destaca a importância de minimizar as barreiras linguísticas, de letramento e logísticas para a conclusão bem-sucedida dos testes, bem como a necessidade de um sistema abrangente para identificar testes insatisfatórios e sinalizá-los para acompanhamento”, destacaram os autores.
Com base nestes dados e nos de estudos anteriores, os autores sugerem potenciais soluções para melhorar a amostragem completa e precisa, incluindo instruções sem texto ou destinadas a populações com baixo nível de letramento para eliminar as barreiras linguísticas e de letramento; etiquetas pré-afixadas ou códigos de barras dos pacientes para minimizar erros de rotulagem; e sistemas automatizados para identificação e contato com pacientes com testes insatisfatórios.
O financiamento para este estudo foi fornecido pelo National Institutes of Health e pelo Cancer Prevention and Research Institute do Texas.
Referência: Po-Hong Liu, Rasmi G. Nair, Celette Sugg Skinner, Caitlin C. Murphy, Eric J. Kim, Cynthia Ortiz, Lei Wang, Ellen Hu, Jacquelyn M. Lykken, Theodore R. Levin, Beverly B. Green, Erin E. Hahn, Noel Santini, Ethan A. Halm; Unsatisfactory Fecal Immunochemical Tests for Colorectal Cancer Screening: Prevalence, Reasons, and Subsequent Testing. Cancer Epidemiol Biomarkers Prev 2023; https://doi.org/10.1158/1055-9965.EPI-23-0507