Onconews - Tratamento com inibidores de checkpoint imune em pacientes com câncer avançado inelegíveis para ensaios clínicos

gustavo schvartsman 19Os resultados positivos do tratamento com inibidores de checkpoint imune observados em estudos clínicos de Fase III podem não se traduzir em benefício para pacientes com baixo performance status ou disfunção orgânica inelegíveis para os ensaios. O alerta vem de pesquisadores da Escola de Medicina Perelman, da Universidade da Pensilvânia, em artigo publicado no JAMA Oncology. O oncologista Gustavo Schvartsman (foto), do Hospital Israelita Albert Einstein, comenta os resultados.

Os inibidores de checkpoint imune (ICIs) são parte importante do padrão de tratamento para pacientes com muitos tumores sólidos avançados. Pacientes com baixo performance status ou disfunção orgânica são tradicionalmente inelegíveis para participar dos principais ensaios clínicos randomizados de ICIs.

Devido à ausência de dados de ensaios randomizados que definem o impacto do tratamento com inibidores de checkpoint em pacientes com câncer avançado considerados inelegíveis para ensaios, os pesquisadores conduziram um estudo de coorte retrospectivo para observar as taxas de tratamento e resultados para esses pacientes em comparação com aqueles pacientes para os quais os dados do ensaio são disponíveis.

O trabalho foi conduzido em 280 centros de tratamento oncológico predominantemente comunitários nos Estados Unidos e incluiu 34.131 pacientes (9318 [27,3%] inelegíveis a estudos com ICIs) que iniciaram a terapia sistêmica de primeira linha entre janeiro de 2014 e dezembro de 2019. Os participantes apresentavam câncer de pulmão de células não pequenas, câncer urotelial, câncer renal ou carcinoma hepatocelular metastáticos recém diagnosticados ou recorrentes. Os pacientes inelegíveis aos ensaios com ICIs apresentavam performance status ECOG ≥2 ou presença de disfunção renal ou hepática). A análise de dados foi realizada entre 1º de dezembro de 2019 e 1º de junho de 2021.

A associação entre a inelegibilidade aos estudos e a monoterapia ICI foi avaliada por meio de regressões logísticas ponderadas por probabilidade inversa (IPW). Os resultados comparativos de sobrevida após terapia com ICI e não ICI entre os pacientes inelegíveis para ensaios foram avaliados por meio de análises de sobrevida do tratamento IPW. Foram relatadas medianas de sobrevida restritas de 12 e 36 meses (RMSTs) e taxas de risco (HRs) de menos de 6 meses e 6 meses ou mais.

Resultados

Na coorte geral (n = 34.131), a mediana (IQR) de idade foi de 70 anos (62-77); 23.586 (69%) eram brancos e 14478 (42%) eram mulheres. Durante o período do estudo, a proporção de pacientes recebendo inibidores de checkpoint em monoterapia aumentou de 0% para 30,2% entre os pacientes inelegíveis para ensaios e 0,1% para 19,4% entre os pacientes elegíveis para o ensaio. A inelegibilidade ao ensaio foi associada ao aumento do uso de ICI em monoterapia (odds ratio ajustada por IPW em comparação com terapia não ICI, 1,8; 95% IC, 1,7-1,9).

Entre os pacientes inelegíveis para os estudos, não houve diferenças de sobrevida global entre ICI em monoterapia, terapia de inibidores de checkpoint combinada e terapia não ICI em 12 meses (RMST, 7,8 vs 7,7 vs 8,1 meses) ou 36 meses (RMST, 15,0 vs 13,9 vs 14,4 meses). Em comparação com a terapia não ICI, ICI em monoterapia mostrou evidência de dano precoce (HR ajustado por IPW em 6 meses, 1,2; 95% CI, 1,1-1,2), mas benefício tardio (HR ajustado entre pacientes que sobreviveram 6 meses, 0,8; 95% CI, 0,7-0,8).

“Neste estudo de coorte, em comparação com pacientes elegíveis para estudos com ICI, os pacientes com câncer avançado inelegíveis para o ensaio receberam preferencialmente inibidores de checkpoint como terapia de primeira linha”, observam os autores. Uma diferença de sobrevida não foi detectada entre as terapias ICI e não ICI entre os pacientes inelegíveis para o ensaio. Os resultados positivos para ICI em estudos de fase 3 podem não se traduzir para esta população vulnerável”, acrescentam.

Segundo Schvartsman, o trabalho de Parikh traz dados importantes que mostram que cerca de um quarto dos pacientes inelegíveis a estudos clínicos, sendo a maior parte por performance status ruim, recebe imunoterapia como primeira linha de tratamento, sem aparente ganho de sobrevida versus um tratamento não imunoterápico. “Os autores concluem que a extrapolação de dados referentes aos pacientes que preenchem critérios é temerária, de forma que a indicação da imunoterapia deva ser feita após cuidadosa análise de riscos, custos e benefícios. Por outro lado, diversos estudos prospectivos mostram eficácia e tolerabilidade semelhante na população com ECOG PS de 2, e outros trabalhos apontam a importância da razão para perda de performance (relacionado a sintomas do câncer versus comorbidades basais)”, observa. 

O estudo foi financiado pelo Prêmio Conquer Cancer Foundation Young Investigator, pelo National Cancer Institute (K08 CA263541, P30 CA016520) e pela Catholic Medical Center Research Foundation.

Referência: Parikh RB, Min EJ, Wileyto EP, et al. Uptake and Survival Outcomes Following Immune Checkpoint Inhibitor Therapy Among Trial-Ineligible Patients With Advanced Solid Cancers. JAMA Oncol. Published online November 04, 2021. doi:10.1001/jamaoncol.2021.4971