Onconews - USPSTF atualiza recomendações para rastreamento do câncer colorretal

Alfredo Scaff 21 bxUS Preventive Services Task Force (USPSTF) atualizou suas recomendações para o rastreamento do câncer colorretal, indicando que indivíduos com risco médio para a doença comecem os exames de rastreamento aos 45 anos de idade, ao invés de 50 anos. Publicadas no JAMA1, as novas diretrizes são uma resposta ao aumento de casos de câncer colorretal em pessoas com menos de 50 anos, e se alinham às recomendações da American Cancer Society e da American Society of Colon and Rectal Surgeons. Alfredo Scaff (foto), epidemiologista da Fundação do Câncer, comenta as diretrizes.

O câncer colorretal (CCR) é uma das neoplasias malignas mais evitáveis devido à sua longa história natural de progressão e à disponibilidade de exames de rastreamento que podem detectar precocemente a doença. A incidência geral de CCR em indivíduos com 50 anos de idade ou mais diminuiu continuamente desde meados da década de 1980, em grande parte devido ao aumento da triagem e à mudança nos padrões de fatores de risco modificáveis.

“Um aumento preocupante na incidência de câncer colorretal entre indivíduos mais jovens (ou seja, com menos de 50 anos; definido como câncer colorretal de início precoce) foi documentado desde meados da década de 1990, com 11% dos cânceres de cólon e 15% dos cânceres retais em 2020 ocorrendo entre pacientes com menos de 50 anos, em comparação com 5% e 9%, respectivamente, em 2010 ”, disse Kimmie Ng, diretor do Young-Onset Colorretal Cancer Center no Dana-Farber Cancer Institute e primeiro autor do editorial2 que acompanha a publicação.

Para atualizar a recomendação de 2016, a USPSTF encomendou uma revisão sistemática para avaliar os benefícios e danos do rastreamento do câncer colorretal em adultos com 40 anos ou mais. A revisão também examinou se esses resultados variaram por idade, sexo ou raça/etnia. Além disso, a Força-Tarefa encomendou um relatório do Grupo de Trabalho do Câncer Colorretal da Rede de Modelagem e Intervenção do Câncer para fornecer informações de modelagem comparativa sobre como a estimativa de ganho de anos de vida, casos de câncer colorretal evitados e mortes por câncer colorretal evitadas variam em diferentes idades de início e término para várias estratégias de triagem.

A avaliação considerou adultos assintomáticos com 45 anos ou mais e risco médio de câncer colorretal (nenhum diagnóstico prévio de câncer colorretal, pólipos adenomatosos ou doença inflamatória intestinal; nenhum diagnóstico pessoal ou histórico familiar de doenças genéticas de predisposição ao câncer colorretal, como síndrome de Lynch ou polipose adenomatosa familiar).

Após a avaliação das evidências, a USPSTF recomenda o rastreamento do câncer colorretal em todos os adultos com idade entre 50 e 75 anos (Recomendação A), e em adultos de 45 a 49 anos (Recomendação B). A Força-Tarefa também sugere que os médicos ofereçam seletivamente o rastreamento do câncer colorretal em adultos de 76 a 85 anos (Recomendação C). “As evidências indicam que o benefício líquido da triagem de todas as pessoas nessa faixa etária é pequeno. Para determinar se este serviço é apropriado em casos individuais, os pacientes e médicos devem considerar a saúde geral do paciente, histórico de exames anteriores e preferências”, destaca o documento. “O rastreamento deve ser interrompido após os 85 anos”, acrescentam os especialistas.

Uma mensagem importante nas recomendações da USPSTF é a importância de fornecer aos pacientes várias abordagens para o rastreamento para melhorar a adesão a alguma forma de rastreamento. “Embora a colonoscopia seja um serviço de triagem e preventivo, pois permite a detecção e remoção de pólipos, as recomendações da USPSTF destacam corretamente que vários estudos demonstram uma redução nas mortes por câncer colorretal com outras abordagens, incluindo o teste de sangue oculto nas fezes, bem como com sigmoidoscopia flexível isolada ou em combinação com teste de imunohistoquímica fecal”, observa o editorial.

No Brasil

Segundo as estimativas do Instituto Nacional do Câncer (INCA), o câncer colorretal é o segundo mais incidente, tanTo em homens, quanto em mulheres. Para cada ano do triênio de 2020-2022, são esperados 20.540 novos casos de CCR em homens e 20.470 novos casos em mulheres.

“No Brasil, não existe rastreamento populacional para câncer colorretal. Seria fundamental a sua realização. Alguns hospitais, serviços muito bem estruturados, realizam de uma forma bastante eficiente os exames de colonoscopia, mas não é rastreamento populacional estruturado, como uma ação de saúde pública. Os rastreios populacionais que existem no Brasil hoje são para câncer de colo do útero, através do exame papanicolao, e câncer de mama, com a mamografia”, esclarece Scaff, acrescentando que existe uma diferença muito significativa entre o rastreamento populacional e o oportunístico, este último realizado no consultório, por exemplo, de maneira individual. “O screening oportunístico também é muito importante, mas se quisermos de fato alterar a mortalidade do câncer colorretal e aumentar a sobrevida dos pacientes, é preciso realizar o rastreamento populacional”, afirma.

O epidemiologista observa que o padrão ouro para o rastreamento é a colonoscopia, até porque durante o exame, caso sejam encontrados pólipos ou adenomas, eles já são retirados para exame anatomopatológico, num processo terapêutico, impedindo a evolução para câncer colorretal. “No entanto, não temos capacidade instalada para a realização de rastreamento populacional através da realização de colonoscopia em qualquer faixa etária. Diferente de outras áreas, como por exemplo a mamografia. Você pode até discutir a qualidade do exame, mas existem mamógrafos e profissionais em número suficiente na maioria das regiões do país para rastrear o câncer de mama. O mesmo vale para o câncer de colo do útero. Para o câncer colorretal, a falta de capacidade instalada é um grande limitador. É o grande desafio”, destaca. 

A implementação de um projeto-piloto, coordenado pelo Ministério da Saúde em parceria com Estados e Municípios, realizado em algumas cidades entre 500 mil e 1 milhão de habitantes que possuam uma estrutura de saúde bem organizada, é uma opção defendida pelo epidemiologista para avaliar a estratégia mais adequada para o país. “Acredito que o exame de sangue oculto nas fezes associado a colonoscopia seja a melhor estratégia para iniciar o rastreamento populacional de câncer colorretal. No primeiro ano, sangue oculto associado a colonoscopia. Se a colonoscopia for negativa, ela é repetida a cada 10 anos, e o teste de sangue oculto continuaria sendo realizado anualmente. Podemos ter diferentes modelos em outras localidades, como apenas o exame de sangue oculto nas fezes ou a colonoscopia isolada. E realizar isso durante uma década para entender qual a melhor opção para a nossa realidade, e durante esse período ir, progressivamente, implementando o rastreamento no país. É um modelo, mas que necessita da capacidade instalada de colonoscopias para sua realização. Não dá para ficar sem esse binômio, porque se realizar apenas o teste de sangue oculto, isso irá gerar um volume enorme de pacientes indicados para colonoscopia e não vamos ter como responder a isso neste momento, o que seria muito grave”, avalia.

Referências:

1 - Screening for Colorectal Cancer US Preventive Services Task Force Recommendation Statement - US Preventive Services Task Force - JAMA. 2021;325(19):1965-1977. doi:10.1001/jama.2021.6238

https://jamanetwork.com/journals/jama/fullarticle/2779985?resultClick=1

2 - Updated USPSTF Guidelines for Colorectal Cancer Screening - The Earlier the Better

David B. Stewart, MD1 et al - JAMA Surg. Published online May 18, 2021. doi:10.1001/jamasurg.2021.1939

https://jamanetwork.com/journals/jamasurgery/fullarticle/2780038?resultClick=1