Pesquisadores do International Mismatch Repair Consortium buscaram estimar a variação na penetrância para câncer colorretal de genes de reparo de DNA (mismatch repair) entre portadores da síndrome de Lynch por sexo e continente de residência. O estudo foi publicado na Lancet, em artigo que conta com a participação de 4 centros brasileiros. Os oncologistas Edenir Inêz Palmero e Rodrigo Guindalini (foto) são coautores do trabalho.
“As diretrizes de prática clínica existentes para portadores de variantes patogênicas nos genes de reparo de DNA (síndrome de Lynch) são baseadas no risco cumulativo médio específico para a idade (penetrância) de câncer colorretal, que é estimado em 20–60%, dependendo do gene de reparo de DNA mutado”, esclarecem os autores.
No entanto, sabe-se que o risco de câncer colorretal para um indivíduo pode variar a depender de suas características pessoais, fatores associados a estilo de vida, presença/ausência da variante patogênica em gene de reparo de DNA e outros fatores genéticos. “Até então, apenas um estudo havia identificado evidências da existência de uma variação nas estimativas de penetrância do câncer colorretal entre portadores de variantes patogênicas no mesmo gene na síndrome de Lynch”, acrescentam.
Neste estudo de coorte retrospectivo, os pesquisadores utilizaram dados do International Mismatch Repair Consortium, que compreende 273 membros de 122 centros de pesquisa ou clínicas em 32 países de seis continentes que estão envolvidos na pesquisa da síndrome de Lynch. Foram incluídas famílias com pelo menos três membros e pelo menos um portador confirmado de uma variante patogênica ou provavelmente patogênica em um gene de reparo de DNA (MLH1, MSH2, MSH6 ou PMS2). Famílias de probandos com variantes patogênicas de novo conhecidas foram excluídas.
Os dados foram coletados sobre o método de averiguação da família, sexo, condição de portador, diagnóstico de câncer e idades no momento da coleta e no último contato ou óbito. Os pesquisadores utilizaram uma análise de segregação condicionada à verificação para estimar a penetrância média do câncer colorretal e fatores poligênicos não medidos modelados para estimar a variação na penetrância. A existência de fatores de risco familiares desconhecidos que modificam o risco de câncer colorretal para portadores da síndrome de Lynch foi testada pelo uso de um valor p de Wald para a hipótese nula de que o SD poligênico é zero.
Resultados
Foram elegíveis para a análise 5585 famílias com síndrome de Lynch de 22 países. Destes, havia número insuficiente para estimar a penetrância para a Ásia e América do Sul, e para aqueles com variantes do EPCAM. Portanto, foram utilizados dados (coletados entre 11 de julho de 2014 e 31 de dezembro de 2018) de 5255 famílias (1829 MLH1, 2179 MSH2, 798 MSH6 e 449 PMS2), compreendendo 79.809 parentes recrutados em 15 países na América do Norte, Europa e Australásia.
Houve forte evidência da existência de fatores de risco familiares desconhecidos que modificam o risco de câncer colorretal para portadores da síndrome de Lynch (p <0,0001 para cada um dos três continentes). Esses fatores de risco familiares resultaram em uma ampla variação dentro de cada gene no risco de câncer colorretal para homens e mulheres de cada continente que carregavam variantes patogênicas no mesmo gene ou a variante MSH2 c.942 + 3A> T.
A variação foi especialmente proeminente para portadores de variantes nos genes MLH1 e MSH2, dependendo do gene, sexo e continente, com 7-56% dos portadores tendo uma penetrância de câncer colorretal de menos de 20%, 9-44% tendo uma penetrância de mais de 80%, e apenas 10–19% com uma penetrância de 40–60%.
“Os resultados do nosso estudo evidenciam o importante papel dos modificadores de risco. Aprofundar o conhecimento sobre esses modificadores pode auxiliar as avaliações de risco personalizadas para prevenção e detecção precoce de câncer colorretal para pessoas com síndrome de Lynch”, destacam os autores, observando que uma implicação dessa ampla variação no risco é que o risco cumulativo médio apresentado aqui para cada país, e relatado por estudos de penetrância anteriores, só se aplica a uma minoria de portadores de variantes patogênicas em genes de reparo de DNA.
“Os riscos médios não são representativos para a maioria dos portadores e, portanto, as diretrizes atuais podem não ser aplicáveis para uma grande proporção de portadores da síndrome de Lynch. Trabalhos adicionais na identificação e caracterização de modificadores genéticos e ambientais de penetrância são cruciais para permitir avaliações de risco personalizadas de câncer colorretal, o que teria um grande efeito no desenvolvimento da prevenção de precisão e detecção precoce para o manejo clínico de portadores da síndrome de Lynch”, concluem.
O estudo foi financiado pela National Health and Medical Research Council, Austrália.
Referência: Variation in the risk of colorectal cancer in families with Lynch syndrome: a retrospective cohort study - The International Mismatch Repair Consortium* - Published: June 07, 2021 - DOI: https://doi.org/10.1016/S1470-2045(21)00189-3