Camila Venchiarutti Moniz (foto), oncologista do Instituto D'Or de Pesquisa e Ensino (IDOR), é primeira autora de estudo selecionado para apresentação em poster no ASCO 2024, com análise sobre o papel do DNA tumoral circulante (ctDNA) no monitoramento do carcinoma epidermoide cervical e de canal anal em pacientes em tratamento com quimiorradioterapia. O trabalho tem como autor senior o oncologista Paulo Hoff (na foto, à direita), com resultados que apoiam o valor preditivo desse biomarcador nessa população de pacientes.
O carcinoma epidermoide cervical e de canal anal representa importante problema de saúde nos países subdesenvolvidos. A quimiorradioterapia (QRT) definitiva é a abordagem padrão de tratamento curativo na doença localmente avançada. Neste cenário, a avaliação do ctDNA é uma ferramenta promissora para monitorar a resposta tumoral em tempo real, pois a imagem clínica convencional não consegue identificar precocemente os não respondedores, em razão da inflamação local comum durante a QRT.
Neste estudo de coorte multicêntrico, prospectivo, foram considerados pacientes tratados entre 2020 e 2023 em centros oncológicos terciários no Brasil, para avaliar o papel do monitoramento dinâmico por ctDNA no câncer epidermoide cervical (CC) e anal (CA), em pacientes com doença T1-4, N0-1, M0 (AJCC 8ª edição) e candidatos à conclusão de QRT curativa. Os pesquisadores descrevem que o ctDNA foi avaliado pelo teste Signatera em D1, D29, imediatamente pós-tratamento, 8 semanas pós-QRT, 24 semanas pós-QRT, a cada 6 meses nos primeiros 1-2 anos e anualmente aos 3-5 anos de acompanhamento. O objetivo primário foi estimar a correlação do ctDNA com resposta tumoral avaliada por imagem de rotina e avaliação clínica na 8ª semana. Os desfechos secundários incluíram a correlação entre os resultados de ctDNA com a sobrevida livre de progressão (SLP) e sobrevida global (SG) em diferentes momentos. O potencial preditivo do biomarcador foi avaliado por meio da análise da curva de característica operacional do receptor (ROC).
Os resultados mostram que 33 pacientes foram inscritos e 27 foram avaliáveis por ctDNA, com seguimento mediano de 10 meses, majoritariamente (85,1%) mulheres; 3 pacientes (11%) eram HIV positivos. A maioria dos pacientes apresentou linfonodos positivos e doença em estágio III (n=18, 66,6%). No grupo de câncer anal (n=15), a maioria recebeu QRT com capecitabina e cisplatina (n=12, 55,5%); no grupo de câncer cervical (n=12), todas as pacientes receberam cisplatina.
Todos os pacientes testados expressaram ctDNA+ antes do tratamento. Na semana 8, as imagens apresentaram sensibilidade de 42,8% e especificidade de 100% para progressão da doença (área sob a curva [AUC] 0,714), enquanto o ctDNA apresentou sensibilidade de 85,7% e especificidade de 89,4% (AUC 0,875). O ctDNA+ imediatamente após o término da QRT (32%) foi consistente com ctDNA+ na semana 8 (30,7%) e na semana 24 (30%). A análise revela que os pacientes com ctDNA+ imediatamente após QRT apresentaram maior risco de progressão da doença, com SLP de 8,2 meses no grupo ctDNA+ e não alcançada no grupo ctDNA- (HR:17,5; IC95%:1,9-157,3; p=0,01). Os dados estavam imaturos para análise de sobrevida global.
Diante desses resultados, os autores concluem que ctDNA imediatamente após a QRT tem alto valor preditivo em pacientes com tumores epidermoides anais e cervicais em não respondedores à QRT, que apresentam alto risco de progressão da doença. “Este biomarcador deve ser considerado para adaptar estratégias de escalonamento do tratamento nesta população”, propõem.
Referência:
Role of dynamic ctDNA monitoring in cervical and anal epidermoid carcinomas under curative chemoradiation.
J Clin Oncol 42, 2024 (suppl 16; abstr 3141)