No estudo de fase 3 NIAGARA, que inscreveu pacientes com câncer de bexiga com invasão muscular (MIBC), durvalumabe perioperatório mais quimioterapia neoadjuvante (NAC) demonstrou benefício clínico e estatisticamente significativo na sobrevida global (SG) e livre de eventos (SLE) em comparação com NAC exclusiva, com perfil de segurança administrável e sem prejuízo à capacidade de se submeter à cistectomia radical. Análise exploratória apresentada no ASCO GU 2025 mostra que pacientes que receberam durvalumabe perioperatório tiveram redução de 31% no risco de morte por câncer de bexiga e de 33% no risco de desenvolver metástases. “O estudo suporta durvalumabe e quimioterapia neoadjuvante como potencial nova opção para os pacientes com MIBC elegíveis a cistectomia radical", observa Marcus Sadi (foto), chefe do setor de uro-oncologia da Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP).
Neste estudo (NCT03732677), foram inscritos pacientes elegíveis para cisplatina com MIBC (cT2-T4aN0/1M0) planejados para cistectomia radical (RC). Os pacientes foram randomizados 1:1 para receber durvalumabe (D) neoadjuvante (1500 mg IV Q3W) e NAC (cisplatina + gemcitabina IV Q3W) por 4 ciclos seguidos até RC, então monoterapia adjuvante D (1500 mg IV Q4W) por 8 ciclos (braço D), ou NAC seguido por RC sozinha (braço comparador). Os desfechos primários foram SLE e resposta patológica completa (pCR). A SG foi um desfecho secundário importante, além de sobrevida livre de metástase e sobrevida específica da doença. Uma análise post hoc exploratória de SLE e SG em pacientes com pCR vs sem pCR (não pCR) também foi realizada. Análises de eficácia foram conduzidas na população com intenção de tratar (corte de dados [DCO] abril de 2024).
Um total de 1063 pacientes foram randomizados (533 braço D; 530 braço comparador). Os pacientes no braço D tiveram redução de 33% no risco de desenvolver metástases distantes ou morte (razão de risco [HR] 0,67; IC de 95% 0,54–0,83; P nominal < 0,001) e redução de 31% no risco de morte por câncer de bexiga (HR 0,69; IC de 95% 0,52–0,91; P nominal = 0,008) em comparação aos pacientes no braço comparador. Mais pacientes no braço D em comparação ao braço comparador tiveram pCR na RC (37% em comparação a 28%); os pacientes que atingiram pCR tiveram melhor SLE e SG em comparação aos não-pCR. Os pacientes no braço D obtiveram maior benefício de SLE e SG em comparação ao braço comparador em ambos os grupos, pCR (SLE HR 0,58; OS HR 0,72) e não-pCR (SLE HR 0,77; SG HR 0,84) (veja tabela).
Eventos adversos imunomediados (EAsim) foram relatados em 111/530 (21%) participantes no braço D (grau 3/4 3%) e em 16/526 (3%) no braço comparador (grau 3/4 0,2%). Na data do corte de dados, todos os EAsim foram resolvidos para 45/111 (41%) pacientes no (braço D) e 7/16 (44%) pacientes (braço comparador). Os EAsim mais comuns foram eventos hipotireoidianos (10% braço D; 1% braço comparador) e eventos hipertireoidianos (3% braço D; 0,8% braço comparador).
Em conclusão, durvalumabe perioperatório com NAC reduziu o risco de desenvolver metástases e morte por câncer de bexiga; análises post hoc exploratórias mostraram que durvalumabe melhorou a sobrevida livre de eventos e a sobrevida global em ambos os grupos pCR e não pCR. Os eventos adversos imunomediados foram consistentes com o perfil conhecido de D e, principalmente, de baixo grau. Esses dados reforçam ainda mais durvalumabe perioperatório como potencial novo tratamento padrão para pacientes com MIBC.
Additional efficacy and safety outcomes and an exploratory analysis of the impact of pathological complete response (pCR) on long-term outcomes from NIAGARA
pCR | Non-pCR | |||||
D N=199 | Comparator N=146 | HR (95% CI) | D N=334 | Comparator N=384 | HR | |
24-month EFS rate (95% CI), % | 92 | 86 | 0.58 | 53 | 50 | 0.77 |
24-month OS rate (95% CI), % | 96 | 91 | 0.72 | 74 | 69 | 0.84 |
Estudo em contexto
Por Marcus Sadi, urologista, Professor e chefe do setor de uro-oncologia da Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP)
Os carcinomas uroteliais músculo-invasivos da bexiga (MIBC) exibem heterogeneidade significativa, com diversas características histopatológicas associadas a diferentes prognósticos e respostas terapêuticas. Os tratamentos sistêmicos peri-operatórios desempenham um papel importante no tratamento desses pacientes .
Há uma enorme necessidade no desenvolvimento de novos esquemas de tratamento combinado no perioperatório dos pacientes com MIBC que serão submetidos a cistectomia radical. Embora a quimioterapia neoadjuvante (NAC) à base de platina tenha eficácia comprovada, sendo a recomendação padrão, sua administração pode ser um desafio nos casos com múltiplas comorbidades e um ganho clínico realmente importante não ocorre em muitos pacientes. Por isso, as evidências da vida real mostram que um número significativo de pacientes aptos a receberem cisplatina, com frequência, são encaminhados diretamente para a cirurgia radical; e, por outro lado, existe também uma proporção relevante de pacientes que não tem função renal adequada para receber NAC e acabam sendo operados de imediato; em ambas as situacões, os resultados oncológicos ficam aquém do ideal.
Recentemente, os inibidores de checkpoint imunológico (ICIs) mostraram benefícios na sobrevida de pacientes com câncer de bexiga localmente avançado e metastático.
Assim, a introdução de ICIs, tanto como monoterapia quanto em regimes combinados com outros ICIs ou quimioterapia são novas opções de tratamento no peri-operatório dos pacientes com MIBC. Os estudos iniciais no ambiente neoadjuvante e adjuvante sugerem que os ICIs são opções seguras e com resultados oncológicos robustos; além disso, os perfis de toxicidade parecem ser favoráveis, criando uma melhor opção para alguns pacientes que, de outra forma, seriam incapazes de tolerar os atuais regimes sistêmicos.
Se esses resultados forem confirmados na vida real, haverá uma revolução no padrão atual de tratamento para esses pacientes.
Neste estudo NIAGARA, 1063 pacientes com MIBC candidatos a cistectomia radical foram randomizados 1:1 para receber de forma neoadjuvante durvalumabe com cisplatina + gemcitabina (NAC) por 4 ciclos mensais seguido de cistectomia e manutenção de duvalumabe adjuvante por 8 ciclos mensais comparado com NAC somente seguido de cistectomia (grupo comparador).
Cistectomia radical foi realizada em 88% e 83% dos grupos, respectivamente. Cerca de 75% dos pacientes operados do grupo com duvalumabe receberam os 8 ciclos de terapia adjuvante.
Os pacientes do grupo durvalumabe tiveram redução de 33% no risco de desenvolver metástases a distância ou morte em comparação aos pacientes que receberam somente NAC.
Mulheres e pacientes com tumores >pT2N0 foram mais beneficiados, assim como aqueles com pouca ou nenhuma expressão de PDL-1.
A sobrevida mediana foi de 46 meses no grupo comparador NAC e ainda não foi atingida no grupo de durvalumabe. Eventos adversos graus 3-4 foram similares em ambos os grupos (cerca de 40%), assim como mortalidade devida ao tratamento sistêmico (0.6%). Eventos imunomediados ocorreram em 21% nos pacientes que receberam durvalumabe comparados com 3% no grupo NAC e incluíram hipo ou hipertireoidsimo, dematite, colite e problemas renais.
Análises preliminares demonstraram que as complicações cirúrgicas foram similares nos dois grupos estudados. Resposta patológica completa ocorreu em cerca de 37% no grupo com durvalumabe comparado com 27% no grupo com NAC (estudo publicado: DOI: 10.1056/NEJMoa2401726).
O estudo suporta a tese que durvalumabe e quimioterapia neoadjuvante é potencialmente uma nova opção para os pacientes com MIBC elegíveis a cistectomia radical.
O tratamento do MIBC está progredindo em direção à individualização das opções terapêuticas, baseado nas características específicas do tumor e do paciente e se afastando da abordagem única, padronizada, que domina esse cenário há mais de três décadas.
Dados emergentes de biomarcadores, como o ctDNA, sugerem que a imunoterapia pode conferir maior benefício a pacientes selecionados com MIBC. Identificar quem são esses pacientes e qual o melhor esquema imunoterápico será de suma importância no futuro próximo.
Referência:
Additional efficacy and safety outcomes and an exploratory analysis of the impact of pathological complete response (pCR) on long-term outcomes from NIAGARA
First Author: Matthew Galsky
Meeting: 2025 ASCO Genitourinary Cancers Symposium
Session Type: Oral Abstract Session
Session Title: Oral Abstract Session B: Urothelial Carcinoma
Track: Urothelial Carcinoma
Sub Track: Therapeutics
Clinical Trial Registration Number: NCT03732677
Citation: J Clin Oncol 43, 2025 (suppl 5; abstr 659)
Abstract: #659