Uma nova diretriz da American Society for Radiation Oncology (ASTRO) avalia abordagens pré-clínicas e clínicas combinando radioterapia com terapia-alvo molecular e imunoterapia. O rádio-oncologista Rodrigo Hanriot (foto), coordenador do serviço de Radioterapia do Hospital Alemão Oswaldo Cruz, comenta o guideline.
Publicado no Lancet Oncology, o guideline1 da Associação Americana de Radioterapia (ASTRO) sobre associação de radioterapia a agentes de terapia-alvo e imunoterapia foi apresentado em formato diferente do usual. Antes de ser um guideline tradicional, o documento se apresenta mais como guia para novas pesquisas, orientação para os tipos de irradiação a serem empregados e sugestão de como interagir as modalidades.
Uma busca rápida no registro de pesquisas clínicas 'Clinical Trials' (https//clinicaltrials.gov) com as palavras “immunotherapy” e “radiation” resulta em quase 400 estudos relacionados, a maioria ainda em recrutamento ou mesmo sequer aberto para tal.
No recente congresso europeu de radioterapia – ESTRO – que aconteceu entre os dias 20 e 24 de abril, um módulo pré-congresso sobre o futuro da interação entre terapias-alvo, imunoterapias e radioterapia trouxe poucos dados concretos, afirmativos ou propositivos, apenas projeções para um futuro próximo.
Esse súbito interesse na associação de terapias-alvo, imunoterapia e radioterapia vem principalmente por achados secundários e sub-análises destas associações, o que motivou criação de estudos prospectivos. O artigo que chamou interesse da comunidade científica foi um relato de caso publicado no New England Journal of Medicine em que um paciente com melanoma metastático tratado continuamente com um imunoterápico, ipilimumab, recebeu radioterapia anti-álgica para somente uma das lesões metastáticas e houve resposta sistêmica duradoura em todas elas.
Posteriormente, em uma sub-análise de pacientes com tumores de pulmão metastáticos tratados em segunda linha com imunoterápicos (anti-PD-1), os pacientes que tiveram ganho de sobrevida global foram somente aqueles previamente expostos a algum tratamento irradiante. Também em tumores de pulmão não pequenas células localmente avançado, cujo tratamento clássico é quimiorradioterapia concomitante, a adição de um imunoterápico na adjuvância aumentou significativamente a sobrevida livre de recidiva (mediana de 16,8 meses com o imunoterápico adjuvante versus 5,6 meses para o grupo placebo, p<0,001) e de metástases (23,2 meses para a adjuvância versus 14,6 meses para placebo, p<0,001).2
Em tumores de pulmão metastáticos cerebrais ao diagnóstico e com expressão de EGFR, o uso preferencial de radioterapia (idealmente estereotática, mas também a cerebral total) up front em relação a inibidores de tirosina-quinase (TKI) mostrou ganho de sobrevida global quando comparada ao inverso, iniciando-se o tratamento com inibidores de TKI e somente depois irradiação.3 Neste caso “a ordem dos fatores alterou o produto”. A sequência de tratamento também foi testada em estudo apresentado na ESTRO 20184 em pacientes com tumores de pulmão não pequenas células com metástases cerebrais tratados com radiocirurgia e anti-PD-1 concomitantes (juntos ou em até 4 semanas da irradiação) ou sequenciais (irradiação e anti-PD-1 após 4 semanas da irradiação). Os dados favorecendo a concomitância são impressionantes, com controle local de 100% versus 52% (p=0,02), controle cerebral total de 70% versus 28% (p=0,01), mas sem impacto em sobrevida global (69% versus 50%, p=0,15).
Em resumo, a associação entre terapias-alvo, imunoterapias e radioterapia envolve diversas dúvidas sobre quando associar, qual a seqüência ideal (concomitantes, seqüenciais), em que tipo de tumores, o regime de irradiação a ser empregado (fracionamento convencional, hipofracionamento, SBRT, etc). O guideline da ASTRO se antecipou e apresentou temas geradores de hipóteses para guiar os próximos trials quanto a estas associações. Apesar de todas as incertezas desta parceria sabemos que a interação é promissora e com menos efeitos colaterais que os tratamentos standards atuais. Basta perseverarmos em descobrir como uni-los.
Referências:
1 - Combining precision radiotherapy with molecular targeting and immunomodulatory agents: a guideline by the American Society for Radiation Oncology - Robert G Bristow, Brian Alexander, Michael Baumann, Scott V Bratman, J Martin Brown, Kevin Camphausen, Peter Choyke, Deborah Citrin, Joseph N Contessa, Adam Dicker, David G Kirsch, Mechthild Krause, Quynh-Thu Le, Michael Milosevic, Zachary S Morris, Jann N Sarkaria, Paul M Sondel, Phuoc T Tran, George D Wilson, Henning Willers, Rebecca K S Wong, Paul M Harari - Lancet Oncol 2018;19:e240–51 - DOI: https://doi.org/10.1016/S1470-2045(18)30096-2
https://www.thelancet.com/journals/lanonc/article/PIIS1470-2045(18)30096-2/abstract
2 - Antonia SJ, Villegas A, Daniel D et al. Durvalumab after Chemoradiotherapy in Stage III Non–Small-Cell Lung Cancer. N Engl J Med 2017;377:1919-29
3 - Magnuson WJ, Lester-Coll NH, Wu AJ et al. Management of Brain Metastases in Tyrosine Kinase Inhibitor-Naïve Epidermal Growth Factor Receptor-Mutant Non-Small-Cell Lung Cancer: A Retrospective Multi-Institutional Analysis. J Clin Oncol 2017;35(10)1070-7
4 - Srivastava A, Filliput E, Abraham C et. al. Early PD-1 blockage improves disease control for NSCLC brain metastases treated with radiosurgery. ESTRO 37, 2018. Proffered Papers: CL9: Lung
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