O preço dos oncológicos voltou a ocupar o noticiário de economia, desta vez em artigo publicado na Forbes. Estudo apresentado na ESMO ganha repercussão na mídia americana e põe em evidência a necessidade de debater um modelo mais sustentável para a oncologia.
O periódico americano trouxe a análise do farmacologista britânico Andrew Hill, da Universidade de Liverpool, mostrando que para alguns tipos de tratamento os americanos pagam mais de 100 vezes o preço praticado em outros países, onde a incorporação dos genéricos e similares já é uma realidade. O trabalho foi apresentado este ano no congresso da ESMO, em Viena (Resumo # 1203).
A análise considera o custo dos insumos, os processos de fabricação e distribuição, trazendo em perspectiva essencialmente os inibidores de tirosina-quinase (TKIs), agentes como imatinibe (Glivec®), erlotinibe (Tarceva®), lapatinibe (Tykerb®) e sorafenibe (Nexavar®).
O autor argumenta que os ITKs reconhecidamente ampliaram as taxas de sobrevida em diferentes tipos de câncer – do sarcoma GIST a leucemia mieloide, tumores renais, de mama, pulmão e fígado. No entanto, sustenta que o alto custo ainda é um forte componente para inibir o acesso.
O imatinibe, aprovado pelo FDA em 2001, até hoje se mantém livre da concorrência dos genéricos nos Estados Unidos. O custo anual é de 106 mil dólares por paciente, enquanto o produto genérico no mercado europeu custa 159 dólares paciente/ano, comparam os pesquisadores. Afinal, como equilibrar preço e valor no tratamento oncológico?
O modelo blockbuster, inovação e acesso
Quem comenta os desafios da farmacoeconomia é o oncologista Stephen Stefani, presidente do capítulo Brasil da International Society of Pharmacoeconomics and Outcome Research (ISPOR) e membro do Comitê Executivo da ISPOR na América Latina:
Mais recentemente, o modelo blockbuster, de maximizar os lucros, tem sido sistematicamente contestado. Nessa lógica, uma droga de sucesso deve pagar o investimento de todas as outras que naufragaram em algum momento da investigação. Vários analistas têm mostrado que o elevado preço dos novos remédios pode estar muito mais relacionado à disposição para pagar o alto preço do que à necessidade de retorno calculado do investimento. Essa contestação é amparada por fenômenos de mercado, como os descritos por Andrew Hill, que demonstra a enorme diferença de preços entre os países, seja forçada pela presença de genéricos e/ ou similares, seja pela incapacidade de praticar valores elevados em determinadas economias do mundo.
Os inibidores de tirosina-quinase (TKI) ilustram esse cenário, mas não são os únicos exemplos. Como são de custo elevado podem demandar co-pagamentos (também conhecido como co-participação no custo), em alguns modelos de assistência de saúde. O tema tem chegado aos pacientes e, por consequência, influenciado mais fortemente as escolhas médicas.
O Brasil ainda passa ao largo de grande parte deste debate, uma vez que as fontes pagadoras têm pouca participação na precificação - salvo eventuais pressões para descontos comerciais. O fato é que, mesmo que o alegado valor bilionário para desenvolvimento de uma nova droga seja realmente consistente, a realidade mundial não tem conseguido absorver os altos custos de remédios sem debater com clareza o real valor do produto. Nunca a diferença entre preço e valor esteve tão debatida na oncologia.
Referência: Target prices for mass production of Tyrosine Kynase Inhibitors (TKIs) for global cancer treatment access- A. Hill, D. Gotham, J. Fortunak, J. Meldrum, I. Erbacher, M. Martin, H. Shoman, J. Levi, M. Bower, W.G. Powderly