Onconews - Abordagem cirúrgica multiprofissional no câncer de ovário

sadalla 23 1Pacientes com câncer de ovário têm 70% menos probabilidade de morrer três anos depois de uma abordagem cirúrgica multidisciplinar, como aponta pesquisa publicada no periódico Annals of Surgical Oncology. O trabalho é da Escola de Medicina da University College Dublin e demonstra que sob a nova abordagem a taxa de mortalidade caiu de 64,5% para 24%. “Isto só reforça a importância de centros especializados no tratamento de câncer, com tumor boards para a discussão multidisciplinar”, diz o oncoginecologista José Carlos Sadalla (foto), que comenta os resultados.

Neste estudo, Brennan e colegas buscaram relatar as mudanças na sobrevida global, sobrevida livre de progressão e taxas de citorredução completa no período de 5 anos após a constituição de uma equipe cirúrgica multidisciplinar. Duas coortes foram avaliadas. A Coorte A foi coletada retrospectivamente de 2006 a 2015. A Coorte B foi uma coorte de pacientes coletada prospectivamente, de janeiro de 2017 a setembro de 2021.

Os autores descrevem que 146 pacientes com câncer de ovário em estágio III/IV da FIGO foram incluídas na coorte A (2006–2015) e 174 pacientes na coorte B (2017–2021). O seguimento mediano foi de 60 meses na coorte A e de 48 meses na coorte B.

Os resultados mostram que a taxa de cirurgia citorredutora primária aumentou de 38% (55/146) na coorte A para 46,5% (81/174) na coorte B. A ressecção macroscópica completa aumentou de 58,9% (86/146) na coorte A para 78,7% (137/174) na coorte B (p < 0,001). Aos 3 anos, 75% (109/144) dos pacientes tiveram progressão da doença na coorte A em comparação com 48,8% (85/174) na coorte B (log-rank, p < 0,001).

Em relação aos desfechos de sobrevida, aos 3 anos, 64,5% (93/144) das pacientes tinham morrido na coorte A, em comparação com 24% (42/174) da coorte B (log-rank, p < 0,001). A análise multivariada de Cox demonstrou que a entrada da equipe cirúrgica multidisciplinar, a doença residual e a idade foram preditores independentes de sobrevida global (razão de risco [HR] 0,29, intervalo de confiança [IC] de 95% 0,203–0,437, p < 0,001) e sobrevida livre de progressão (HR 0,31, IC 95% 0,21–0,43, p < 0,001). A morbidade grave permaneceu estável em ambos os períodos do estudo (2006–2021).

“Nossos dados demonstram que implementar uma abordagem intraoperatória com equipe multidisciplinar permitiu uma mudança na filosofia cirúrgica e resultou em uma melhora significativa na sobrevida global, na sobrevida livre de progressão e nas taxas de ressecção completa”, concluem os autores.

Em síntese, o trabalho liderado por Donal Brennan, oncologista do Mater Hospital e Professor de Oncologia Ginecológica da UCD School of Medicine, apoia o crescente conjunto de evidências internacionais de que pacientes com câncer de ovário têm melhores resultados quando tratados em centros oncológicos especializados.

A abordagem colaborativa, disse ele, permite que oncologistas ginecológicos, bem como cirurgiões colorretais, hepatobiliares e gastrointestinais planejem cuidadosamente a remoção do tecido doente e o tratamento subsequente. “Acreditamos que a colaboração entre diferentes especialidades cirúrgicas nos permite realizar com segurança operações agressivas para remover todos os tumores visíveis do abdômen, o que é o maior preditor de melhor sobrevida”, acrescentou.

José Carlos Sadalla, médico do setor de ginecologia oncológica do ICESP, coordenador da Oncoginecologia do Hospital Beneficência Portuguesa de São Paulo e responsável pela Clínica Ginecológica do HCFMUSP, corrobora a relevância da abordagem multidisciplinar. “Já sabemos, através de outras publicações, da importância do tratamento do câncer de ovário por um oncoginecologista, especialista em câncer ginecológico, com dados mostrando maior sobrevida. Este artigo acrescenta a importância da abordagem multidisciplinar neste câncer, mostrando também maior sobrevida e maiores taxas de citorredução ótima”, prossegue Sadalla. “Afinal, a presença do time completo de profissionais (radiologista, patologista, oncologista clínico, oncoginecologista cirúrgico e radioterapeuta) auxilia no raciocínio clínico e no planejamento terapêutico com maior chance de sucesso”, diz.

Referência: Mulligan, K., Corry, E., Donohoe, F. et al. Multidisciplinary Surgical Approach to Increase Survival for Advanced Ovarian Cancer in a Tertiary Gynaecological Oncology Centre. Ann Surg Oncol (2023). https://doi.org/10.1245/s10434-023-14423-1