O angiossarcoma tem sido descrito como uma complicação tardia pouco provável, porém grave, após a radioterapia (RT) no tratamento do câncer de mama. Agora, um estudo holandês analisa a incidência de angiossarcoma em pacientes com câncer de mama tratadas com ou sem RT, a partir de dados da base nacional de registros de câncer deste país. Os resultados foram publicados em janeiro de 2019 no Jama Oncology. O radio-oncologista Samir Abdallah Hanna (foto), do Hospital Sírio-Libanês, em São Paulo, comenta o trabalho.
O estudo considerou pacientes com estágios I a III tratadas de janeiro de 1989 até 31 de dezembro de 2015, com follow-up concluído em 31 de janeiro de 2017. Um modelo de risco foi usado para determinar a incidência do angiossarcoma associado a RT e outros fatores preditivos.
Resultados
Um total de 296.577 pacientes foram incluídos na análise (idade mediana ao diagnóstico, 58 anos), com seguimento mediano de 7,7 anos após o diagnóstico (variação de 0 a 28,1 anos). Dos pacientes que não receberam RT (n = 111 754), nenhum desenvolveu angiossarcoma. Da população tratada com RT (184 823 pacientes), 209 desenvolveram angiossarcoma da mama e/ou parede torácica (0,1%). Pacientes mais velhas apresentaram maior risco para angiossarcoma associado à RT (hazard ratio [HR], 1,05; IC95%, 1,04-1,06). Pacientes que realizaram mastectomia apresentaram menores chances de desenvolver angiossarcoma associado à RT em comparação com aquelas submetidas à terapia conservadora da mama (HR, 0,22; IC de 95%, 0,10-0,49).
O período médio entre o tratamento do câncer de mama e o desenvolvimento do angiossarcoma associado à RT foi de 8 anos (intervalo, 3-20 anos). Segundo os autores, este é o maior estudo já realizado sobre angiossarcoma associado à RT no câncer de mama e os resultados mostram dados comparáveis a relatos de série menores. A sobrevida global em 5 anos em pacientes com angiossarcoma associado à RT foi de 40,5%, sem diferenças significativas nas modalidades de tratamento.
“Angiossarcomas não são tumores exclusivamente relacionados à RT prévia, mas estão dentre as neoplasias radio-induzidas mais prevalentes. Por isso, são divididos entre primários (não associados à RT) e secundários (associados)”, explica Samir. Segundo o radio-oncologista, apesar das diferenças epidemiológicas, não há recomendações de tratamento formalmente estabelecidas exclusivamente para o angiossarcoma secundário, devendo ser realizado preferencialmente em esfera multidisciplinar, podendo incluir cirurgia, radioterapia, quimioterapia e outras modalidades como a hipertermia. O estudo holandês não elucida aspectos inerentes ao tratamento do angiossarcoma, mas fomenta para a necessidade de dados prospectivos”, diz.
O especialista observa que o risco de segundas neoplasias após o tratamento do câncer de mama por vezes constitui-se em um obstáculo ao planejamento terapêutico dos pacientes. “Não é raro o radio-oncologista ser questionado quanto a estes riscos, mesmo quando está diante de uma paciente com um câncer de mama localmente avançado com clara indicação de tratamento radioterápico. O estudo holandês apresenta através de uma amostra de 209 pacientes, um risco acumulativo de 0,09 a 0,1% de desenvolvimento de angiossarcoma. Este risco sempre tem que ser balanceado com os benefícios do tratamento radioterápico”, conclui.
Referência: Rombouts, A. J. M., Huising, J., Hugen, N., Siesling, S., Poortmans, P. M., Nagtegaal, I. D., & de Wilt, J. H. W. (2019). Assessment of Radiotherapy-Associated Angiosarcoma After Breast Cancer Treatment in a Dutch Population-Based Study. JAMA Oncology. doi:10.1001/jamaoncol.2018.6643