Onconews - ASCO atualiza guideline sobre tratamento do câncer de pâncreas metastático

Rachel 3 NET OKA Sociedade Americana de Oncologia Clínica (ASCO) publicou uma atualização do guideline sobre câncer de pâncreas metastático, com recomendações para a terapia de segunda linha. As diretrizes consideram novas evidências de testes de linhagem germinativa e somática para alta instabilidade de microssatélites/deficiência de mismatch repair, mutações no BRCA e alterações de TRK. A recomendação também incluiu estudos de tratamento de manutenção após terapia de primeira linha. Quem comenta as diretrizes é a oncologista Rachel Riechelmann (foto), diretora do Departamento de Oncologia do A.C. Camargo Cancer Center e presidente do Grupo Brasileiro de Tumores Gastrointestinais (GTG).

“É um guideline bem completo e foca em aspectos muito práticos da atualidade, discutindo a segunda linha e a incorporação de tratamento com drogas-alvo para uma doença em que antes não era utilizado”, analisa. Segundo a especialista, o mais interessante é a incorporação do olaparibe no tratamento de pacientes com mutação germinativa em BRCA e a recomendação dos inibidores de NTRK para pacientes cujo tumor tenha a fusão. “Na verdade, os pacientes com mutação germinativa de BRCA têm tumores muito sensíveis a platina. Acho que essa é a grande mensagem. Tanto que a adição de olaparibe na manutenção não aumentou a sobrevida. Então, o principal tratamento para esses pacientes ainda é a platina”, observa.

Publicada em 2018, a versão anterior incluía 7 recomendações de força moderada para terapia de segunda linha, baseadas em evidências de qualidade inferior. Esta atualização inclui novas evidências do inibidor de PARP olaparibe como uma opção para terapia de manutenção após tratamento de primeira linha, bem como novos estudos de agentes agnósticos que têm como alvo fusões dos genes da neurotrofina tirosina receptor quinase (NTRK) 1/2/3.

“O Painel de Especialistas continua endossando as recomendações restantes para quimioterapia de segunda linha, bem como outras recomendações relacionadas ao tratamento, acompanhamento e cuidados paliativos da versão 2018 desta diretriz”, afirmam os autores.

Avaliação inicial

Na avaliação inicial, permanece a recomendação da tomografia computadorizada multifásica do tórax, abdômen e pelve para avaliar a extensão da doença (Força da recomendação: forte). O performance status (PS) do baseline, a carga de sintomas e o perfil de comorbidade devem ser avaliados cuidadosamente, e os objetivos do tratamento (para incluir a discussão de diretiva antecipada), as preferências do paciente e os sistemas de suporte devem ser discutidos com o paciente e seus cuidadores (Força da recomendação: forte).

A versão atualizada acrescenta a recomendação do teste precoce de alterações genômicas acionáveis para pacientes com probabilidade de serem candidatos a tratamento adicional após o tratamento de primeira linha. O Painel de Especialistas recomenda o teste da linhagem germinativa e somática, que inclui testes de instabilidade de microssatélites/deficiência de mismatch repair, mutações BRCA (excluindo variantes de significado desconhecido) e fusões de genes NTRK. “Os resultados dos testes podem levar a terapias como inibidores da PARP, inibidores de checkpoint, inibidores de fusão TRK e ensaios clínicos de terapias-alvo”, destacam os autores.  (Força da recomendação: forte).

Tratamento de primeira linha

No tratamento de primeira linha, FOLFIRINOX (leucovorina, fluorouracil, irinotecano e oxaliplatina) segue indicado para pacientes com PS ECOG 0 a 1 e perfil de comorbidade favorável, levando em consideração a preferência do paciente e o sistema de suporte para tratamento médico agressivo (Força da recomendação: forte).

A gemcitabina mais nab-paclitaxel é recomendada para pacientes com PS ECOG 0 a 1, perfil de comorbidade relativamente favorável e sistema de suporte para tratamento relativamente agressivo (Força da recomendação: forte).

“A gemcitabina isolada é recomendada para pacientes com PS ECOG 2 ou um perfil de comorbidade que exclua regimes mais agressivos. A adição de nab-paclitaxel, capecitabina ou erlotinibe à gemcitabina pode ser oferecida nesse cenário, com ajustes proativos de dose e programação para minimizar as toxicidades”, destaca o documento. (Força da recomendação: moderada)

Os autores observam que pacientes com PS ECOG de 3 ou comorbidades mal controladas, apesar dos cuidados médicos ativos em andamento, devem receber terapia direcionada ao câncer apenas caso a caso. A ênfase deve estar na otimização das medidas de assistência (Força da recomendação: moderada).

Tratamento após terapia de primeira linha

Em pacientes com tumores que abrigam fusões de NTRK, recomenda-se o tratamento com larotrectinibe ou entrectinibe (Força da recomendação: moderada). O inibidor de checkpoint anti-PD-1 pembrolizumabe é recomendado como terapia de segunda linha para pacientes que apresentaram resultados positivos em relação à deficiência de mismatch repair ou alta instabilidade de microssatélites (Força da recomendação: forte).

Em pacientes com mutação BRCA1 ou BRCA2 na linhagem germinativa e que receberam quimioterapia baseada em platina na primeira linha sem progressão da doença por pelo menos 16 semanas, as opções para tratamento de manutenção incluem quimioterapia ou o inibidor da PARP olaparibe (Força da recomendação: moderada). “Para esse grupo de pacientes sensíveis à platina, a decisão de continuar o tratamento com quimioterapia ou prosseguir com a terapia de manutenção com olaparibe deve ser baseada em uma discussão entre paciente e oncologista, incluindo a consideração de resposta máxima e platô de resposta alcançado com a quimioterapia, o nível de toxicidade cumulativa associado ao tratamento quimioterápico, a preferência do paciente, conveniência, toxicidade, custo e evidências clínicas”, ressaltam os autores.

A gemcitabina mais nab-paclitaxel pode ser oferecida como terapia de segunda linha a pacientes que atendem a todos os seguintes critérios: tratamento de primeira linha com FOLFIRINOX, ECOG PS de 0 a 1, perfil de comorbidade relativamente favorável, preferência do paciente e sistema de apoio para terapia médica agressiva (Força da recomendação: moderada).

“Nós acabamos utilizando mais FOLFIRINOX, a impressão é de que é um tratamento mais efetivo, com melhores taxas de resposta. No cenário de segunda linha nós publicamos uma revisão sistemática e meta-análise2 que favorece o uso de gemcitabina e nab-paclitaxel na segunda linha pós-folfirinox versus gemcitabina sisolada, e aparentemente oferece maior sobrevida e maior controle de doença”, salienta Rachel.

A especialista observa que o guideline não incluir que para pacientes com mutação BRCA em segunda linha pós FOLFIRINOX, em vez de utilizar gemcitabina e nab-paclitaxel, faz sentido tentar cisplatina e gemcitabina. “Até se discute se esse não poderia ser o tratamento de primeira linha para esses pacientes, já que são tão sensíveis à platina. Mas acredito que FOLFORINOX continua sendo a primeira linha nesses casos, e numa segunda linha a prefêrencia seria gemcitabina e cisplatina e não gemcitabina e nab-paclitaxel”, avalia.

O fluororacil mais irinotecano nanolipossomal ou fluorouracil mais irinotecano, em casos onde a combinação mencionada não está disponível, é preferido como terapia de segunda linha para pacientes que receberam tratamento de primeira linha com regime à base de gemcitabina, ECOG PS 0 a 1 e perfil de comorbidade relativamente favorável. (Força da recomendação: moderada) “O irinotecano nanolipossomal não está aprovado no Brasil, então não temos experiência com esse regime. Além disso, teria um espaço restrito já que na maioria das vezes utilizamos FOLFIRINOX de primeira linha”, ressalta.

Já fluorouracil mais oxaliplatina podem ser considerados como terapia de segunda linha para pacientes tratados em primeira linha com gemcitabina mais nab-paclitaxel e que apresentem ECOG PS 0 a 1 e um perfil de comorbidade relativamente favorável. (Força da recomendação: moderada). “Embora o fluorouracil mais irinotecano nanolipossomal seja preferido, o Painel de Especialistas continua a apoiar o uso do fluorouracil mais oxaliplatina como uma opção quando sua disponibilidade é limitada ou em pacientes em que a toxicidade residual da terapia de primeira linha ou comorbidades impedirem o uso de fluorouracil mais irinotecano nanolipossomal”, avaliam.

A gemcitabina ou o fluorouracil podem ser considerados como terapia de segunda linha para pacientes que possuem ECOG PS de 2 ou um perfil de comorbidade que exclua regimes mais agressivos (a adição de nab-paclitaxel à gemcitabina ou irinotecano nanolipossomal ao fluorouracil pode ser oferecido nesse cenário, com ajustes proativos da dose e do cronograma para minimizar as toxicidades). (Força da recomendação: moderada).

“Não existem dados disponíveis para recomendar terapia de terceira linha ou superior com um agente citotóxico. A participação em ensaios clínicos é incentivada”, concluem os autores. (Força da recomendação: moderada).

Informações adicionais estão disponíveis em www.asco.org/gastrointestinal-cancer-guidelines.

Referências:

1 - Metastatic Pancreatic Cancer: ASCO Guideline Update - DOI:10.1200/JCO.20.01364 - Journal of Clinical Oncology - Published online August 05, 2020.  

2 - Systematic review and meta-analysis of gemcitabine-based chemotherapy after FOLFIRINOX in advanced pancreatic câncer - Victor H. F. de JesusMarcos P. G. CamandarobaVinicius F. CalsavaraRachel P. Riechelmann – First Published February 28, 2020 - https://doi.org/10.1177/1758835920905408