A edição de julho do Journal of Clinical Oncology publicou um guideline com recomendações baseadas em evidências para a abordagem do câncer pancreático irressecável localmente avançado. O guia de condutas da Sociedade Americana de Oncologia Clínica (ASCO) considera 26 ensaios clínicos randomizados que preencheram os critérios de revisão sistemática definidos pelo painel de especialistas.
A ASCO recomenda que o tratamento seja orientado tendo em vista as preferências do paciente, seu estado psicológico e a sintomatologia, lembrando que a referência aos cuidados paliativos deve ocorrer já na primeira consulta.
O guideline prevê ainda a realização da tomografia computadorizada de tórax, abdome e pelve para determinar a extensão da doença e auxiliar o planejamento terapêutico. Na experiência retrospectiva de um centro norte-americano, 56% dos pacientes com câncer de pâncreas foram reestadiados após exames de imagem e tiveram mudanças no plano de tratamento.
A quimioterapia sistêmica inicial (6 meses) com um regime combinado é recomendada para a maioria dos pacientes, ainda que a radioterapia possa ser oferecida como tratamento inicial em pacientes com performance status ECOG 0 ou 1 e perfil de comorbidade favorável.
Não há nenhuma evidência clara para apoiar a superioridade de um regime quimioterápico sobre outro na presença de metástases (por exemplo, fluorouracil, leucovorina, irinotecano e oxaliplatina ou gencitabina mais nab-paclitaxel), uma vez que as combinações não foram comparadas em estudos controlados no câncer pancreático irressecável localmente avançado.
Diante da progressão da doença local após quimioterapia de indução, sem metástases, pode ser oferecida radioterapia ou radioterapia estereotáxica para pacientes com performance status ECOG ≤ 2 e um perfil de comorbidade adequado. Se houver doença estável após 6 meses de quimioterapia de indução, mas toxicidades inaceitáveis, a radioterapia pode ser oferecida como uma alternativa. Os pacientes com progressão da doença devem ser tratados conforme as recomendações para câncer de pâncreas metastático.
O adenocarcinoma ductal pancreático é uma doença associada com mau prognóstico e tem impacto crescente sobre a mortalidade relacionada ao câncer nos Estados Unidos e no mundo. As taxas de sobrevida global em 5 anos permanecem <5% para a doença irressecável localmente avançada. Estimativas recentes apontaram 49 mil novos diagnósticos e 41 mil mortes por câncer de pâncreas nos Estados Unidos em 2015 e um número estimado de 338 mil mortes no mundo em 2012, de acordo com o World Cancer Research Fund International. Dados epidemiológicos sugerem que o câncer de pâncreas se tornará a segunda principal causa de morte relacionada ao câncer nos Estados Unidos na próxima década.
Recomendações-chave
Recomendação 1.1: A tomografia computadorizada de tórax, abdome e pelve deve ser realizada para avaliar a extensão da doença. Nível de Evidência: intermediário; força de recomendação: forte.
Recomendação 1.2: O performance status inicial, a carga de sintomas e o perfil de comorbidades do paciente com diagnóstico de câncer de pâncreas irressecável localmente avançado devem ser cuidadosamente avaliados. Nível de Evidência: alto; força de recomendação: forte.
Recomendação 1.3: As metas de cuidados devem incluir uma discussão sobre diretriz antecipada e considerar as preferências do paciente. Sistemas de suporte devem ser discutidos com cada paciente e seus cuidadores. Nível de Evidência: intermediário; força de recomendação: forte.
Recomendação 1.4: A abordagem multidisciplinar na formulação do tratamento e gestão da doença deve ser o padrão de atendimento. Nível de Evidência: intermediário; força de recomendação: forte.
Recomendação 1.5: Todos os pacientes com câncer pancreático irressecável localmente avançado devem ser informados sobre estudos clínicos disponíveis, assim como devem receber informação sobre cuidados paliativos, biorrepositórios/biomarcadores e estudos observacionais. Nível de Evidência: intermediário; força de recomendação: forte.
Recomendação 2.1: A terapia sistêmica inicial com regimes de combinação é recomendada para a maioria dos pacientes com performance status ECOG 0 ou 1 e perfil de comorbidade favorável, prevendo a preferência do paciente. Não há nenhuma evidência clara para apoiar um regime em relação a outro. Para alguns pacientes, quimiorradioterapia ou radioterapia estereotáxica do corpo (SBRT) podem ser oferecidas na primeira linha, com base nas preferências do médico e paciente. Nível de Evidência: intermediário; força de recomendação: forte.
Recomendação 3.1: Se houver progressão da doença local após quimioterapia de indução, mas sem evidência de disseminação sistêmica, pode ser oferecida quimiorradioterapia (QRT) ou radioterapia estereotáxica do corpo a pacientes que preencham os seguintes critérios: tratamento de quimioterapia de primeira linha completo ou incompleto por progressão ou toxicidade; PS ECOG ≤ 2 e perfil de comorbidade adequado, incluindo adequada função hepática e renal e adequado, status hematológico. Nível de Evidência: intermediário; força de recomendação: forte.
Recomendação 3.2: QRT ou SBRT pode ser oferecida a pacientes que responderam à quimioterapia inicial de 6 meses ou têm a doença estável, mas desenvolveram toxicidades inaceitáveis relacionadas com a quimioterapia ou mostram declínio no performance status em consequência da toxicidade da quimioterapia. Nível de Evidência: intermediário; força de recomendação: forte.
Recomendação 3.3: Se não houver resposta ou doença estável após 6 meses de quimioterapia de indução, CRT ou SBRT podem ser oferecidos como alternativa terapêutica. Nível de Evidência: intermediário; força de recomendação: forte.
Recomendação 4.1: O tratamento com SBRT pode ser oferecido para pacientes com câncer de pâncreas irressecável localmente avançado, embora estudos prospectivos e/ ou randomizados adicionais sejam necessários para comparar os resultados de SBRT com quimioterapia sozinha e SBRT. Nível de Evidência: intermediário; força de recomendação: moderada.
Recomendação 5.1: Aos pacientes que não se beneficiaram de tratamento de primeira linha e estejam com doença em progressão deve ser oferecido tratamento para câncer de pâncreas metastático. Nível de Evidência intermediário; força de recomendação: moderada.
Recomendação 5.2: Pacientes com câncer de pâncreas irressecável localmente avançado que não se beneficiaram dos tratamentos disponíveis e apresentam progressão da doença devem ser aconselhados a integrar um ensaio clínico. Nível de Evidência: intermediário; força de recomendação: forte.
Recomendação 6.1: Pacientes com câncer de pâncreas irressecável localmente avançado devem ter uma avaliação completa da carga de sintomas e do estado psicológico o mais cedo possível, de preferência na primeira visita, com a recomendação de instituir cuidados paliativos. Nível de Evidência: intermediário; força de recomendação: forte.
Recomendação 7.1: Aos pacientes com câncer de pâncreas irressecável localmente avançado deve ser oferecido tratamento agressivo para dor e outros sintomas do câncer e/ou terapia direcionada ao câncer. Nível de Evidência: intermediário; força de recomendação: forte.
Recomendação 7.2: Um curso breve de radioterapia paliativa (de cinco a 10 tratamentos) pode ser oferecido aos pacientes com câncer de pâncreas irressecável localmente avançado que satisfaçam os seguintes critérios: sintomas locais proeminentes, tais como dor abdominal e/ou agravamento da icterícia e/ou hemorragia gastrointestinal como resultado de invasão tumoral; infiltração local para o trato GI causando iminente obstrução gástrica ou duodenal. Nível de Evidência: intermediário; força de recomendação: moderada.
Recomendação 8.1: Na ausência de ensaios clínicos randomizados, o painel de especialistas recomenda que pacientes que completaram o tratamento e têm doença estável ou nenhuma progressão da doença sejam acompanhados a cada 3 a 4 meses com um exame físico laboratorial para avaliação renal e hepática, por um período de 2 anos. Os intervalos podem então ser aumentados para uma avaliação a cada 6 meses. Nível de Evidência: baixo; força de recomendação: forte.
Recomendação 8.2: Os dados não são definitivos, mas o painel recomenda a realização de testes do marcador (antígeno CA 19-9) e de imagem (tomografia computadorizada) a cada 3 ou 4 meses, durante os primeiros 2 anos. Na doença estável bem estabelecida, o intervalo entre os exames de imagem pode ser aumentado, a cada 6 meses. O uso rotineiro da tomografia por emissão de pósitrons para a gestão do câncer de pâncreas irressecável localmente avançado não é recomendado. Nível de Evidência: baixo; força de recomendação: forte.
Referência: Locally Advanced, Unresectable Pancreatic Cancer: American Society of Clinical Oncology Clinical Practice Guideline - Edward P. Balaban et al