Onconews - Atenção psicossocial aos pacientes com câncer no Brasil

Cristiane_Bergerot_NET_OK.jpgUm grupo de pesquisadores brasileiros explorou as diferentes necessidades de atenção psicossocial de pacientes com câncer nos cenários público e privado de cuidados de saúde no Brasil. O trabalho liderado pela psico-oncologista Cristiane Bergerot (foto), Preceptora da Residência Multiprofissional em Oncologia (área Psicologia) da Unifesp, foi publicado no dia 20 de julho no Journal of Global Oncology (JGO/ASCO).

Os resultados indicaram que os pacientes atendidos no serviço privado apresentaram uma prevalência significativamente menor de sintomas de ansiedade/depressão e uma maior qualidade de vida, quando comparados aos pacientes do sistema público.
 
Segundo os autores, as diferenças nos tipos de problemas biopsicossociais relatados pelos pacientes podem ter implicações na estruturação da assistência psico-oncológica nesses ambientes.
 
"Em 2010 a Sociedade Internacional de Psico-Oncologia (IPOS) estabeleceu como padrão de qualidade assistencial a inserção da psicologia na rotina do serviço e a inclusão da avaliação de distress como sexto sinal-vital, standard endossado pela Sociedade Brasileira de Psico-Oncologia (SBPO) em 2013. Esse estudo demonstra a viabilidade da inserção da avaliação de distress em ambientes públicos e privados no Brasil", afirma Cristiane Bergerot, primeira autora do estudo. “A avaliação de distress também é apoiada e endossada pela ASCO (QOPI), pelo ACoS CoC (American College of Surgeons Comission on Cancer) e pela ONS (Oncology Nursing Society)”, acrescenta.
 
O trabalho também destaca a potencial influência da desigualdade socioeconômica existente nos países em desenvolvimento e os desafios presentes na promoção da qualidade de vida e saúde, enfatizando a importância da prestação de cuidados de suporte abrangentes para todos, independentemente da condição socioeconômica ou do local em que estão sendo tratados.
 
Métodos e resultados
 
A pesquisa retrospectiva multicêntrica foi conduzida para determinar se a prevalência de distresse problemas biopsicossociais foram semelhantes e se os pacientes relataram diferentes necessidades psicossociais ou de sintomas conforme a instituição em que receberam cuidados. O objetivo é que essa informação contribua para elucidar lacunas na assistência psicossocial ao paciente oncológico e informar práticas de cuidados de suporte.
 
Um total de 972 pacientes com câncer com mais de 18 anos de idade no momento do diagnóstico e que receberam quimioterapia foram recrutados em dois centros de oncologia: 580 pacientes do Centro de Câncer de Brasília (CETTRO), um centro de câncer privado (PRI), e 392 pacientes da Universidade Federal de São Paulo - (UNIFESP)/Hospital São Paulo (HSP), um serviço público de atendimento (PUB).
 
Os pacientes foram avaliados por meio de instrumentos de medidas de distress (Termômetro de Distress), ansiedade/depressão (HADS) e qualidade de vida (FACT-G). As variáveis sociodemográficas, incluindo a idade do paciente, sexo, estado civil, escolaridade, diagnóstico de câncer e estágio da doença, foram coletados nos prontuários dos pacientes.
 
A maioria (64,4% do sexo feminino; média de 55 anos de idade; 59,9% casados) foram diagnosticados com cânceres gastrointestinal (26,1%) e de mama (25,6%), em estadio avançado da doença (III a IV; 70,3%). Houve diferenças significativas nas variáveis demográficas e relacionadas à doença entre os pacientes das duas instituições. No geral, pacientes PRI apresentaram uma maior escolaridade (61,9% graduados) e menor probabilidade de serem diagnosticados com doença avançada (57,5% v 71,7%).
 
Os pacientes do PUB apresentaram uma maior prevalência de distress moderado a grave (termômetro de distress ≥ 4) e um maior número de problemas práticos (por exemplo, financeiros, habitação e transporte), ambos com clara significância estatística. Em contraste, os pacientes do sistema PRI relataram um maior número de problemas familiares, emocionais e físicos.
 
No domínio emocional, depressão, tristeza e perda do interesse em atividades usuais foram mais frequentemente reportados pelos pacientes do sistema PRI, ao passo que medo, nervosismo e preocupação foram mais frequentemente relatados pelos pacientes do sistema PUB. No domínio físico, os problemas mais relatados pelos pacientes do sistema PUB foram fadiga, dor, pele seca/prurido, sono e náuseas, enquanto que para os pacientes PRI, os mais prevalentes foram aparência, sono, fadiga, pele seca/prurido e náuseas.
 
A expectativa dos autores é que esses dados evidenciem as consequências das discrepâncias na qualidade dos serviços psicossociais oferecidos no país nesta população específica, colaborando na melhor estruturação de serviços de psico-oncologia e reforçando a relevância da atenção psicossocial na oncologia.
 
Referência: Investigating the Two-Tiered System of Psychosocial Cancer Care in Brazil Using a Distress Screening Measure - Cristiane Decat Bergerot, Errol J. Philip, Carolina Gaue Zayat, Isadora Miranda de Azevedo, Tereza Cristina Cavalcanti Ferreira de Araujo and Edvane Birelo Lopes De Domenico -Published online before print July 20, 2016, doi:10.1200/JGO.2016.004978JGO July 20, 2016 JGO004978