A interrupção do imatinibe em pacientes com GIST sem doença progressiva não é recomendada e foi associada à progressão acelerada, resistência mais rápida ao imatinibe e sobrevida global mais curta, como relatam Blay et al. no Lancet Oncology, com base no acompanhamento de longo prazo do estudo francês BFR14.
O imatinibe é um inibidor de tirosina quinase (TKI) que demonstrou eficácia robusta e durável no tratamento de primeira linha de tumores estromais gastrointestinais (GIST, na sigla em inglês). No entanto, o uso de longo prazo deste TKI é frequentemente limitado por efeitos colaterais, comorbidades médicas, custo e desejo do paciente por um período de férias medicamentoso.
BFR14 é um estudo aberto, randomizado, de fase 3 (NCT00367861), realizado em 17 centros ou hospitais de câncer na França. Foram inscritos pacientes adultos (≥ 18 anos) com GIST avançado, com status de desempenho do Eastern Cooperative Oncology Group de 0–3, sem tratamento prévio e sem história anterior de câncer. Os pacientes foram tratados com imatinibe oral 400 mg diariamente. Pacientes com resposta completa ou parcial, ou doença estável (RECIST V1.0) em 1 ano, 3 anos e 5 anos desde o início do tratamento foram randomizados (1:1) para descontinuação do tratamento até a progressão (grupo de interrupção) ou continuação do tratamento até a progressão (grupo de continuação). A randomização foi feita centralmente, estratificada por centro participante e presença ou ausência de doença residual na tomografia computadorizada. O desfecho primário foi a sobrevida livre de progressão. Os desfechos secundários incluíram tempo para resistência ao imatinibe e sobrevida global.
Os pesquisadores descrevem que entre 12 de maio de 2003 e 16 de março de 2004, após 1 ano de imatinibe, 32 pacientes foram randomizados para o grupo de interrupção e 26 para o grupo de continuação. Entre 13 de junho de 2005 e 30 de maio de 2007, após 3 anos de imatinibe, 25 pacientes foram randomizados para o grupo de interrupção e 25 para o grupo de continuação. Entre 9 de novembro de 2007 e 12 de julho de 2010, após 5 anos de imatinibe, 14 pacientes foram randomizados para o grupo de interrupção e 13 para o grupo de continuação. O seguimento mediano foi de 235,2 meses (IQR 128,8–236,6) após a randomização de 1 ano, 200,9 meses (190,2–208,4) após a randomização de 3 anos e de 164,5 meses (134,4–176,4) após a randomização de 5 anos.
Os resultados mostram que a sobrevida livre de progressão mediana no grupo de interrupção versus o grupo de continuação após 1 ano de imatinibe foi de 6,1 meses (IC de 95% 2,5–10,1) versus 27,8 meses (19,5–37,9; razão de risco [HR] 0,36 [IC de 95% 0,20–0,64], log-rank p=0,0003), após 3 anos de imatinibe foi de 7,0 meses (3,5–11,7) versus 67,0 meses (48,8–85,6; 0,15 [0,07–0,32], log-rank p<0,0001), e após 5 anos de imatinibe foi de 12,0 meses (9,0–16,6) versus não alcançado (NR; NR–NR; 0,13 [0,03–0,58], log-rank p=0,0016). O tempo médio para resistência ao imatinibe após 1 ano de imatinibe foi de 28,7 meses (IC de 95% 18,1–39,1) versus 90,6 meses (25,3–156,1; HR 0,93 [IC de 95% 0,51–1,71], log-rank p=0,82), após 3 anos foi de 66,2 meses (43,0–89,6) versus 127,3 meses (15,0–239,7; 0,35 [0,17–0,72, log-rank p=0,0028) e após 5 anos foi de 58,6 meses (0,0–167,4) versus NR (NR–NR; 0,24 [0,05–1,12], log-rank p=0,049).
A sobrevida global mediana após 1 ano de imatinibe foi de 56,0 meses (IC 95% 30,3–82,9) versus 105,0 meses (20,6–189,6; HR 0,84 [IC 95% 0,46–1,54], log-rank p=0,57), após 3 anos foi de 104,0 meses (90,7–118,7) versus 134,0 meses (89,7–178,3; 0,40 [0,20–0,82], log-rank p=0,0096), e após 5 anos não foi alcançada (not reached - NR–NR) versus 110,4 meses (82,7–154,1; 1,28 [0,41–3,99]; log-rank p=0,67),
“A interrupção do imatinibe em pacientes com GIST sem doença progressiva não é recomendada”, destacam os autores. “A interrupção do imatinibe em pacientes sem progressão com GIST foi associada à progressão acelerada, resistência mais rápida ao imatinibe e sobrevida global mais curta no acompanhamento de longo prazo quando comparada à continuação do imatinibe em pacientes após 3 anos e 5 anos de tratamento com este TKI”, concluem os autores.
O estudo BFR14 já havia demonstrado sobrevida livre de progressão superior no grupo de continuação. Agora, com acompanhamento de 235,2 meses (IQR 128,8–236,6) após a randomização de 1 ano, 200,9 meses (190,2–208,4) após a randomização de 3 anos e 164,5 meses (134,4–176,4) após a randomização de 5 anos, confirma o benefício de continuar o tratamento com imatinibe em pacientes com GIST sem progressão da doença. Este acompanhamento de longo prazo de um ensaio randomizado confirma a prática de supressão contínua do driver oncogênico no GIST avançado.
Referência:
DOI: https://doi.org/10.1016/S1470-2045(24)00318-8