Onconews - Câncer peniano: diretriz de prática clínica ESMO–EURACAN para diagnóstico, tratamento e acompanhamento

Em artigo no ESMO Open, Muneer et al. fornecem recomendações para diagnóstico, estadiamento, tratamento e acompanhamento do câncer de pênis. As recomendações têm a chancela da Sociedade Europeia de Oncologia Médica (ESMO) e da EURACAN, grupo constituído com foco em tumores sólidos raros, refletindo dados científicos disponíveis e a opinião de consenso dos autores. A diretriz de prática clínica também incorpora algoritmos para o tratamento de tumores penianos primários e linfonodos inguinais.

O câncer de pênis é uma malignidade genital rara com incidência global estimada de 36.068 novos casos em 2020. Na Europa Ocidental e nos Estados Unidos, a incidência do câncer de pênis ajustada por idade é de 0,3-2,1 por 100.000.  Por outro lado, em países onde a circuncisão é uma prática de rotina por razões religiosas ou culturais, o câncer de pênis é quase inexistente, enquanto áreas na América do Sul, Sul da Ásia e África Subsaariana têm a maior prevalência do mundo (3-7 por 100.000 homens).

Muneer e colegas descrevem que vários fatores etiológicos foram associados ao câncer de pênis e sua distribuição geográfica, entre eles etnia, vírus do papiloma humano (HPV), idade da população, hábitos sociais e culturais e prevalência de circuncisão neonatal são os mais importantes.

“A infecção por HPV foi relatada em até 50,8% [intervalo de confiança (IC) de 95% 44,8% a 56,7%] dos casos de câncer de pênis e em até 79,8% (IC de 95% 69,3% a 88,6%) dos pacientes com neoplasia intraepitelial peniana (PeIN)”, relatam os autores, esclarecendo que o subtipo oncogênico predominante de HPV no câncer de pênis é o HPV 16, prevalente em até 70% dos casos de câncer de pênis HPV-positivos.

O líquen escleroso, uma condição inflamatória crônica de etiologia desconhecida que afeta principalmente a área anogenital (85%-98%), também foi associado ao desenvolvimento de câncer de pênis. “O líquen escleroso está associado a até 30% dos casos de câncer de pênis, especialmente aqueles que não são causados ​​pelo HPV”, registra a publicação. Outros fatores de risco incluem tabagismo, má higiene peniana e tratamento com fototerapia ultravioleta (UV)-A com psoraleno (PUVA).

As diretrizes propostas são descritas considerando níveis de evidência e graus de recomendação, da doença localizada até o cenário avançado. Confira a seguir as principais recomendações da ESMO-EURACAN:

Neoplasia intraepitelial peniana (PeIN)

A circuncisão é recomendada como tratamento inicial em qualquer PeIN comprovada por biópsia localizada na glande ou prepúcio [IV, A]. Após a circuncisão, qualquer PeIN residual pode ser tratada usando agentes tópicos, como 5-FU ou imiquimod. Alternativamente, a ablação a laser de CO2 pode ser usada [IV, B].

Doença Ta-1

A excisão local ampla de lesões envolvendo a glande ou um procedimento de recapeamento da glande é recomendado, com reconstrução usando enxerto de pele (split-thickness skin graft -SSG) ou pele da haste peniana [IV, A].

Os médicos podem realizar cirurgia micrográfica de Mohs para lesões penianas de baixo grau (T1), mas somente se a configuração clínica correta, incluindo um patologista, estiver disponível [IV, C].

A braquiterapia é uma alternativa à cirurgia na doença pT1e os pacientes devem ser encaminhados a centros especializados para consideração multidisciplinar da adequação da cirurgia ou braquiterapia neste contexto [III, A].

Doença T2-4

Em tumores T2 da glande do pênis, a glansectomia com ou sem uretrectomia distal e reconstrução SSG é recomendada [III, A].

Em pacientes selecionados com doença T1-T2 de baixo volume, a braquiterapia é uma opção em centros especializados [III, B].

A penectomia parcial ou total com uretrostomia perineal é recomendada nos casos com infiltração proximal no corpo cavernoso (T3-T4) [IV, A].

Doença cN0

A vigilância clínica dos linfonodos inguinais é recomendada em pacientes que apresentam tumores cN0 com características de baixo risco (pTa/pTis e pT1G1) [III, A].

Para pacientes com doença cN0 de risco intermediário ou alto (pT1G2, pT1-4G3/G4 ou invasão linfovascular), DSLNB (dynamic sentinel LN biopsy ) deve ser realizada antes de prosseguir para uma linfadenectomia inguinal radical na presença de linfonodos metastáticos [III, A].

Doença cN1-2

Em pacientes com doença cN1-2, a linfadenectomia inguinal radical é recomendada para remover os LNs inguinais superficiais e profundos com preservação da veia safena longa e da fáscia lata, sempre que possível [III, A].

Doença cN3

Para doença volumosa ou ulcerada (cN3), quimioterapia neoadjuvante seguida por linfadenectomia inguinal radical ipsilateral, com ou sem linfadenectomia pélvica em respondedores, deve ser discutida para pacientes elegíveis [II, B].

PLND

A linfadenectomia pélvica unilateral é recomendada em pacientes com duas ou mais metástases inguinais ipsilaterais, metástase com diâmetro de 30 mm ou extensão

extranodal [III, A].

ILND de resgate

Os médicos podem recomendar linfadenectomia inguinal de resgate com reconstrução de retalho miocutâneo em doença inguinal recorrente [IV, B]. A ILND de resgate deve

ser considerada como parte do tratamento multimodal, que também deve incluir quimioterapia neoadjuvante ou adjuvante [III, A].

RT para doença primária

Um curso típico de EBRT (external beam RT) é de 66-74 Gy em frações de 2 Gy, cinco vezes por semana [III, C]. Médicos em centros especializados podem recomendar braquiterapia LDR ou HDR para o tratamento de câncer de pênis, especialmente se a cirurgia não for uma opção [III, C]. A dose usual é de 60-65 Gy administrados continuamente (LDR) ou em pulsos de hora em hora (PDR) ao longo de 5 dias e 35 Gy em nove frações ao longo de 5 dias para braquiterapia HDR [III, B].

Doença residual de baixo volume pode ser tratada com 38,4 Gy em 12 frações, mas para tumores intactos, o esquema mais frequentemente proposto é de 42-45 Gy em

12-14 frações [III, C].

Terapia sistêmica para doença localmente avançada

Pacientes com nódulos fixos cN3 devem ser considerados para quimioterapia neoadjuvante com regimes triplos como TIP (cisplatina, paclitaxel e ifosfamida) ou

TPF (docetaxel, cisplatina e fluorouracil) [III, B].

Os autores destacam que, na prática clínica, todas as recomendações fornecidas precisam ser discutidas com os pacientes em uma abordagem de tomada de decisão compartilhada.

Referência:

Open Access Published: July 11, 2024, DOI: https://doi.org/10.1016/j.esmoop.2024.103481