Onconews - Consulta Pública: SUS atualiza PCDT em câncer de próstata

ASCO_prostata_1.jpgTermina no dia 18 de novembro a consulta pública para renovar o Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas do adenocarcinoma de próstata. O documento está disponível no site http://conitec.gov.br/index.php/consultas-publicas. A Consulta Pública nº 33 foi anunciada dia 28 de outubro e apesar da grande expectativa em relação à atualização do tratamento, especialmente no cenário da doença avançada, a proposta da CONITEC decepciona.

 “O documento da CONITEC nasce desatualizado pelo simples fato de a busca de dados ter sido realizada em 4/11/2013, ou seja, dois anos atrás. A oncologia moderna avança rapidamente e neste, como em outros casos, usar dados de dois anos atrás nos condena a praticar uma medicina atrasada, com piores resultados para os pacientes”, resumiu em nota o oncologista Rafael Kaliks, diretor científico do Instituto Oncoguia.
 
O relatório apresentado pela CONITEC considerou “modestos” os dados da abiraterona no cenário do câncer de próstata metastático refratário a docetaxel e propõe “aguardar estudos mais consistentes que justifiquem a recomendação do uso da abiraterona”, sugerindo novas análises da CONITEC em termos de eficácia e custo-efetividade. O documento ainda reconhece que estudos mais recentes foram a favor da abiraterona também em pacientes que apresentam neoplasia prostática resistente a androgênio e que ainda não receberam quimioterapia, mas mantém a decisão de recomendar novas análises de eficácia clínica e de custo-efetividade. “Ao descrever o uso de abiraterona indicada antes da quimioterapia, a CONITEC fornece dados desatualizados e incompletos, ignorando que esse é o padrão internacionalmente aceito de tratamento em pacientes com câncer metastático refratário à castração”, prossegue Kaliks.

Em relação a enzalutamida, outro agente avaliado na atualização do PCDT, o relatório manteve a tônica de que faltam “estudos mais consistentes que justifiquem a recomendação do seu uso” no câncer de próstata resistente a castração e novamente a CONITEC argumenta em defesa de análises adicionais. Para Kaliks, a CONITEC ignora artigos recentes que colocam a enzalutamida no mesmo patamar de indicação da abiraterona. No Brasil, até o momento, a enzalutamida tem registro da ANVISA para pacientes após uso de quimioterapia.
 
A atualização do protocolo de tratamento também avaliou o uso do radioisótopo no câncer de próstata resistente à castração e recomenda nos casos com metástases ósseas sintomáticas e sem metástases viscerais conhecidas, com a indicação de que o radiofármaco deve ser manipulado e aplicado em serviço de medicina nuclear. 

Para o oncologista Fernando Maluf, do Centro Oncológico Antônio Ermírio de Mores (COAEM), os benefícios da abiraterona e da enzalutamida são evidentes e amplamente aceitos.  "São medicamentos que reduziram o risco de morte ao redor de 35% a 40%. Todos  foram associados a outros benefícios secundários, entre eles ganho de sobrevida livre de progressão. No caso da abiraterona, melhora na qualidade de vida e melhora nos sintomas ósseos; no caso da enzalutamida,  melhora na qualidade de vida e retardamento dos sintomas ósseos. O mesmo foi visto com radio-223 e vale também para os dados pré-quimioterapia de abiraterona, radio-223 e enzalutamida", esclarece Maluf. O oncologista afirma que "todas essas drogas conseguiram atingir seus parâmetros principais de sobrevida global, além de parâmetros secundários, com impacto não só no ganho de sobrevida, como também de qualidade de vida, permitindo postergar significativamente a piora do estado geral", diz. "Portanto, são drogas que do ponto de vista técnico-científico deveriam ser aprovadas para pacientes que falharam ao docetaxel", explica. "Eu pessoalmente não concordo com o texto da CONITEC. Obviamente, isso abre uma discussão do ponto de vista de valor, de custo-benefício, mas a meu ver essas drogas têm sim um custo-benefício interessante e, principalmente, os anti-hormônios e o radio- 223 têm um perfil de toxicidade muito aceitável", completa. 
 

A Sociedade Brasileira de Urologia (SBU) analisou o relatório da CONITEC e resumiu o sentimento geral.”Vimos o documento com muita preocupação”, disse o médico Lucas Nogueira, diretor do Departamento de Uro-Oncologia da SBU. “O documento confere um peso muito grande a estudos que a gente sabe que não têm tanto peso assim. Por outro lado, desconsidera trabalhos que a comunidade médico-científica reconhece como sendo importantes”, explicou.”A CONITEC não está levando em consideração estudos que são considerados pela comunidade médica do mundo inteiro. Temos a evidência científica reconhecida mundialmente sobre a eficácia dessas drogas, em um cenário onde até cinco anos atrás você não tinha nenhuma alternativa”, acrescentou o diretor da SBU.

Quimioterapia

A CONITEC ignorou dados mais recentes que corroboram o uso da quimioterapia em um cenário mais precoce da doença, a exemplo dos estudos CHAARTED e STAMPEDE, nos quais a quimioterapia foi iniciada juntamente com a castração. O PCDT se limitou a avaliar uma segunda linha para os pacientes que progridem após docetaxel já no cenário metastático, considerando cabazitaxel e prednisona. No entanto, mesmo diante dos dados que atestam ganho de sobrevida global com cabazitaxel, o documento apresentado à Consulta Pública faz questão de mencionar "que se trata de um estudo pequeno, com ganho de sobrevida de somente três meses". "Na nossa visão, não cabe à CONITEC julgar se três meses é pouco ou muito, mas sim dizer se economicamente é viável ou não proporcionar este ganho real de sobrevida, em face do alto custo das medicações", afirma Kaliks.

No cenário pós-docetaxel, o oncologista Fernando Maluf lembra que cabazitaxel é uma droga que aumenta a sobrevida com redução do risco de morte ao redor de 30%. 
 

“O CHAARTED foi publicado em agosto e até podemos entender que não tenha integrado essa atualização. Mas o cabazitaxel, por exemplo, tem indicação e esses dados não são recentes. São críticas que vão ser colocadas e esperamos que essa manifestação da SBU na consulta pública traga algum benefício para o paciente com câncer de próstata”, enfatizou Lucas Nogueira.  "São drogas que já estão aprovadas pela Anvisa, que analisou e deu o aval da eficácia, e que já estão no rol da ANS, que também reconheceu a eficácia desses medicamentos. Como um órgão de saúde pública agora está questionando o benefício dessas drogas? É no mínimo incoerente”, completa Nogueira, que finaliza a contribuição da SBU à Consulta Pública.


A Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS (CONITEC) explica que a Consulta Pública é um mecanismo para obter informações, opiniões e críticas e embasar as decisões sobre formulação e definição de políticas públicas, em um processo que considera a inclusão de medicamentos, exames e outras tecnologias no Sistema Único de Saúde (SUS). 

Prevenção 

O relatório apresentado pela CONITEC para subsidiar a atualização do PCDT de adenocarcinoma de próstata mantém a recomendação de não indicar o rastreamento populacional. A principal recomendação defende que a decisão de realizar o controle do PSA deve ser individualizada, discutindo amplamente com o homem os benefícios e consequências de um diagnóstico precoce, além dos riscos de realizar a biópsia transretal.
 
O documento da CONITEC reconhece que a mortalidade por câncer de próstata apresenta um perfil ascendente no Brasil, assim como as taxas de incidência.

As contribuições recebidas nas Consultas Públicas são inseridas nos relatórios técnicos para análise da CONITEC e suas recomendações finais, que definem que medicamento/tecnologia será efetivamente incorporado para o tratamento dos pacientes do SUS.