Onconews - Cuidados de fim de vida e sofrimento emocional entre oncologistas

Como mudanças nas metas de tratamento afetam os oncologistas? Treinados para focar no tratamento curativo com o objetivo de prolongar a vida, os oncologistas lutam com a decisão de interromper o tratamento curativo e fazer a transição para cuidados paliativos e de fim de vida, como descrevem Lalit Krishna e colegas em artigo na BMC Palliative Care. Os autores destacam que acompanhar os pacientes de câncer ao longo de sua trajetória e cuidar deles no fim da vida pode levar os oncologistas ao sofrimento emocional e impactar negativamente sua identidade profissional.

Neste estudo, o objetivo foi explorar o impacto das mudanças nas metas de tratamento na formação da identidade profissional dos oncologistas.

De setembro a dezembro de 2023, entrevistas semiestruturadas foram conduzidas com oncologistas em um centro de cuidados paliativos em Cingapura. A Teoria do Anel da Personalidade (Ring Theory of Personhood) foi usada para capturar os efeitos das experiências com pacientes em transição de cuidados curativos para paliativos, explorando seu impacto no senso de identidade pessoal e profissional dos oncologistas.

A base de análise considerou seis médicas e seis médicos, com idades entre 30 e 53 anos (média de 38 anos), com média de 9,75 anos de experiência como oncologistas. Os principais domínios identificados foram 1) desafios enfrentados na transição de pacientes para cuidados paliativos, 2) o impacto de lidar com pacientes moribundos e 3) mecanismos de enfrentamento.

Os resultados mostram que gerenciar transições no cuidado tem impactos profundos e duradouros nas crenças, valores e atitudes dos médicos — moldando, em última análise, sua identidade profissional. Frente ao percurso de doença e morte do paciente, a análise evidencia uma miríade de fatores socioculturais, pessoais, psicoemocionais e profissionais capturados pelos anéis do RToP.

Mudar as metas do tratamento e definir a transição para cuidados paliativos e de fim de vida é uma decisão que desafia os oncologistas. Além de justificar a decisão para pacientes e familiares, reconhecendo que "uma vez que você para, não há como voltar atrás", os oncologistas pesquisados também se sentem desafiados ao defender suas escolhas quando confrontados por outros membros da equipe de saúde. A análise mostra que, apesar da abordagem baseada em equipe, os oncologistas frequentemente se sentem sozinhos ao tomar essas decisões e vivenciam medo, culpa e desamparo, questionando suas escolhas de vida e carreira.

“Outro aspecto importante do nosso estudo é que os oncologistas muitas vezes não se sentem bem equipados para lidar com os aspectos pessoais e psicossociais mais amplos de sua função. Vários participantes relataram que seu treinamento se concentrou no conhecimento médico e nas habilidades clínicas, com pouco foco no trabalho em equipe interprofissional, ética ou habilidades de comunicação”, descreve a análise.

Revisões recentes mostram que o treinamento em oncologia fornece educação e recursos limitados em autocuidado ou no tratamento eficaz da fadiga por compaixão (FC), esgotamento e sofrimento moral. A FC é descrita como “um estado evitável de exaustão holística que se manifesta no declínio físico de energia e resistência, declínio emocional na capacidade empática e declínio espiritual, pois a pessoa sente desesperança ou impotência para se recuperar como resultado da exposição crônica ao sofrimento dos outros.

A íntegra do estudo está disponível em acesso aberto.

Referência:

Somasundaram, N., Ibrahim, H., Govindasamy, R. et al. Caring for terminally Ill patients: the impact on oncologists. BMC Palliat Care 23, 231 (2024). https://doi.org/10.1186/s12904-024-01562-9