Onconews - Diretrizes da OMS sobre circunferência da cintura, atividade física e risco de câncer

Baixos níveis de gordura corporal e altos níveis de atividade física são fatores-chave de estilo de vida na prevenção do câncer, mas a interação da obesidade abdominal e atividade física no risco de câncer permanece desconhecida. Estudo de Patrícia Bohmann e colegas explorou associações conjuntas e individuais de circunferência da cintura e atividade física com risco de câncer, com resultados que reforçam o valor das recomendações da Organização Mundial de Saúde (OMS). “A adesão às diretrizes da OMS para circunferência da cintura e atividade física é essencial para a prevenção do câncer; atender a apenas uma dessas diretrizes é insuficiente”, alertam os autores. A oncologista Ana Luísa Baccarin (foto) analisa os resultados.

Os pesquisadores usaram dados do UK Biobank (n=315.457) e categorizaram os indivíduos de acordo com os limites das diretrizes da OMS para circunferência da cintura e níveis de atividade física autorrelatados. A regressão de Cox ajustada multivariável foi usada para estimar HRs e ICs de 95% do câncer total. O grupo de referência compreendeu indivíduos com níveis recomendados de circunferência da cintura (<88 cm para mulheres e <102 cm para homens) e atividade física (>10 equivalentes metabólicos de horas de tarefa/semana). Além disso, estimaram a proporção de cânceres atribuíveis à obesidade abdominal e atividade física insuficiente.

Durante um período médio de acompanhamento de 11 anos (3.321.486 pessoas-ano), 29.710 participantes desenvolveram qualquer tipo de câncer. Os participantes que não cumpriram a diretriz da OMS sobre circunferência da cintura aumentaram o risco de câncer, mesmo quando suficientemente ativos fisicamente de acordo com a OMS (HR 1,11, IC de 95% 1,08 a 1,15). Da mesma forma, os indivíduos que não atingiram a diretriz da OMS para atividade física mostraram risco elevado, mesmo aqueles sem gordura abdominal (HR 1,04, IC de 95% 1,01 a 1,07). Não aderir a nenhuma das diretrizes produziu o maior aumento no risco (HR 1,15, IC de 95% 1,11 a 1,19).

“Estimamos que a obesidade abdominal associada à atividade física insuficiente poderia ser responsável por 2,0% dos casos de câncer do UK Biobank”, destacam os autores, reafirmando que a adesão às diretrizes da OMS para circunferência da cintura e atividade física é essencial para a prevenção do câncer.

“Nosso estudo fornece novos insights sobre a associação conjunta de circunferência da cintura e atividade física com risco de câncer. Descobrimos que obesidade abdominal e atividade física insuficiente são fatores de risco distintos para câncer. Especificamente, atingir a diretriz da OMS para circunferência da cintura mostrou benefícios, mas não conseguiu anular o risco elevado de câncer associado à atividade física insuficiente. Da mesma forma, atender à diretriz da OMS para atividade física atenuou, mas não eliminou o risco aumentado de câncer relacionado à obesidade abdominal. O cenário mais favorável em termos de prevenção do câncer foi observado para indivíduos que atenderam às diretrizes para magreza abdominal e atividade física”, analisam.

A íntegra do estudo original está disponível no British Journal of Sports Medicine (BJSM) em acesso aberto.

O estudo em contexto

Por Ana Luísa Baccarin, oncologista do Instituto Ana Baccarin - Oncologia e Qualidade de Vida

Esse importante estudo reforça a importância da adesão combinada às diretrizes da OMS em relação à  circunferência da cintura e atividade física na redução do risco de câncer. Mesmo nos indivíduos fisicamente ativos, a adiposidade abdominal permaneceu um fator de risco oncológico relevante. Dentre as principais limitações metodológicas desse estudo podemos destacar a dependência de dados autorrelatados para atividade física, o que pode subestimar ou superestimar os efeitos dessa variável; e a não avaliação do impacto de modalidades distintas de treinamento (por exemplo, musculação ou aeróbico de alta intensidade) no risco de câncer em indivíduos com adiposidade central elevada. 

Do ponto de vista clínico, os achados reforçam a necessidade de uma abordagem integrada, que não apenas incentive a atividade física, mas também inclua estratégias eficazes para controle da adiposidade visceral. A simples adesão a uma das diretrizes da OMS cria uma falsa sensação de segurança, subestimando a influência da gordura abdominal no risco oncológico. Incorporar a mensuração da circunferência da cintura na prática clínica e promover intervenções combinadas (incluindo reeducação alimentar, estratégias individualizadas de exercício e avaliação laboratorial de parâmetros metabólicos) pode ser uma abordagem mais eficaz no contexto da prevenção oncológica. 

Referência:

Bohmann P, Stein MJ, Amadou A, Baurecht H, Fervers B, Fontvieille E, Freisling H, Friedenreich C, Konzok J, Peruchet-Noray L, Leitzmann MF, Sedlmeier AM, Weber A. WHO guidelines on waist circumference and physical activity and their joint association with cancer risk. Br J Sports Med. 2025 Jan 22:bjsports-2024-108708. doi: 10.1136/bjsports-2024-108708. Epub ahead of print. PMID: 39843229.