Os registros de câncer de base populacional são a principal fonte de informação para vigilância e monitoramento do câncer. Estudo que analisou a qualidade dos dados de cinco cânceres gastrointestinais (esôfago, estômago, colorretal, fígado e pâncreas) em 16 registros de câncer de base populacional em atividade no Brasil mostra que os registros brasileiros atenderam aos critérios de comparabilidade internacional, mas metade apresentou índices abaixo dos níveis esperados para critérios de validade e completude dos dados para tumores de alta letalidade, como tumores de fígado e pâncreas, além de um longo atraso na disponibilidade e divulgação dessas informações. O trabalho é dos pesquisadores Diego Rodrigues e Silva (foto), Max de Oliveira e Maria Paula Curado.
Atualmente, há 30 registros de câncer de base populacional (RCBP) ativos no Brasil.
Neste estudo, os pesquisadores incluíram informações dos RCBP com mais de dez anos de dados históricos a partir do ano 2000, independentemente do tipo de cobertura geográfica definida (estado, região metropolitana ou capital), totalizando 16 registros. Os RCBP brasileiros foram avaliados com base em quatro critérios internacionais de qualidade de dados: comparabilidade, validade (precisão), completude e atualidade. A análise se concentrou em cinco tumores gastrointestinais (câncer de esôfago, câncer de estômago, câncer colorretal, câncer de fígado e câncer de pâncreas) por registro de câncer e sexo, de acordo com o período disponível.
Os resultados foram relatados no BMC Cancer e mostram que os 16 RCBP brasileiros representam 17% da população (36 milhões de habitantes em 2021) de acordo com dados de 2000 a 2018. Os pesquisadores descrevem que houve variação na incidência na série histórica, de 12 a 19 anos. A proporção de casos verificados morfologicamente variou de 74,3% (Manaus) a 94,8% (Aracaju), enquanto a proporção de casos relatados incidentalmente apenas por declaração de óbito (DCO%) variou de 3,0% (São Paulo) a 23,9% (Espírito Santo).
Em relação aos cânceres de alta letalidade, como fígado e pâncreas, a análise mostra porcentagens de DCO maiores que 30% na maioria dos registros de câncer. Em todos os 16 registros houve atraso de mais de 48 meses na divulgação de dados em comparação ao ano civil de 2022.
Em conclusão, os autores destacam que esforços significativos são necessários para garantir a operacionalidade e estabilidade dos Registros de Câncer de Base Populacional no Brasil, que continuam sendo fundamentais para monitorar a incidência e avaliar as políticas nacionais de controle do câncer.
De acordo com a Agência Internacional de Pesquisa em Câncer (IARC, na sigla em inglês), a proporção da população mundial coberta por registros incluídos no Volume XI do CI5 (Incidência de Câncer em Cinco Continentes) foi de 15%, com cobertura de 1% na África, 8% na América Central e do Sul, 98% na América do Norte, 7% na Ásia, 46% na Europa e 77% na Oceania.
“O Brasil, país continental com 27 unidades federativas e mais de 213 milhões de habitantes, enfrenta o desafio de manter continuamente a qualidade operacional e de dados dos RCBP”, sublinha a publicação.
Os tumores gastrointestinais contribuem com algumas das principais causas de morte relacionadas ao câncer no Brasil, incluindo câncer colorretal, estômago, fígado, pâncreas e esôfago.
Diego Rodrigues Mendonça e Silva, primeiro autor do estudo, é Doutor em Epidemiologia pela Escola de Saúde Pública da Universidade de São Paulo e Coordenador do Registro Hospitalar de Câncer do A.C.Camargo Cancer Center (Fundação Antônio Prudente).
Referência:
e Silva, D.R.M., de Oliveira, M.M. & Curado, M.P. Data quality in Brazilian population-based cancer registries for gastrointestinal cancers. BMC Cancer 24, 870 (2024).
https://doi.org/10.1186/s12885-024-12477-2