Entre 2013 e 2019, houve aumento na proporção de fumantes entre as gestantes, de 4,7% para 8,5%, e queda no percentual das mulheres não grávidas que fumam, de 9,6% para 8,4%. É o que demonstra estudo desenvolvido pelo epidemiologista e pesquisador do Instituto Nacional de Câncer (INCA) André Szklo (foto), em parceria com profissionais da Escola de Saúde Pública da Johns Hopkins Bloomberg. Os resultados foram publicados no periódico Nicotine & Tobacco Research.
O monitoramento do uso de tabaco durante a gravidez é fundamental para atingir os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável das Nações Unidas. Nesse estudo, os pesquisadores examinaram as mudanças entre 2013 e 2019 nas diferenças relativas nas taxas de prevalência de tabagismo entre mulheres grávidas e não grávidas com idade entre 18 e 49 anos.
Os pesquisadores utilizaram dados de uma pesquisa de saúde nacionalmente representativa realizada no Brasil em 2013 e 2019. Um modelo linear generalizado com família binomial e função de ligação logarítmica foi usado para estimar, para cada ano de análise, as diferenças relativas brutas e ajustadas (por faixa etária, escolaridade, local de residência e status de proteção contra o tabagismo passivo em casa).
Em 2013, a estimativa do ponto de proporção do uso de tabaco entre mulheres grávidas foi menor do que a observada entre mulheres não grávidas (4,7% vs. 9,6%). No entanto, em 2019, as estimativas de pontos de proporção foram praticamente as mesmas (8,5% vs. 8,4%). Após o ajuste para variáveis selecionadas, em 2013, a prevalência de tabagismo entre mulheres grávidas foi 42% (valor de p ≤ 0,05) menor do que a observada entre mulheres não grávidas. Por outro lado, em 2019, a prevalência de tabagismo materno foi 13% (valor de p > 0,05) maior do que a encontrada entre mulheres não grávidas.
Um dos pontos que chamam a atenção na pesquisa é que, em 2019, as grávidas usavam ou já haviam experimentado dispositivos eletrônicos para fumar (DEFs) numa proporção 50% superior à observada em mulheres não grávidas. “Esse dado reflete o marketing da indústria do tabaco, que propaga a ideia de que os DEFs causam menos danos à saúde em relação ao tabagismo ativo e passivo, o que não é verdade”, assinala Szklo.
O trabalho revelou ainda que cerca de dois terços das grávidas fumantes viviam em residências onde era permitido fumar, e o uso de DEFs nesses ambientes superou em cerca de 70% a proporção observada em casas livres do fumo. “Isso mostra a contribuição dos DEFs, sejam usados isoladamente ou de forma combinada ao cigarro tradicional, para uma maior aceitação social desse comportamento de risco e, consequentemente, para a manutenção da dependência à nicotina durante a gestação”, destaca Szklo.
O pesquisador lembra que o monitoramento do uso de tabaco durante a gravidez é fundamental para que se alcance os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da Nações Unidas, especialmente o objetivo número 3, que se refere a saúde e bem-estar das próximas gerações. “Fumar durante a gestação representa várias ameaças à saúde: afeta a mãe e o feto, o recém-nascido, a criança e o jovem, que, provavelmente, crescerá em um ambiente social de maior aceitação do uso de tabaco, expondo-o ao fumo passivo e aumentando a probabilidade de iniciação ao tabagismo”, alerta o pesquisador do INCA.
Em síntese, a interferência contínua da indústria do tabaco e a comercialização de produtos de tabaco para populações vulneráveis representam sérias ameaças à saúde pública e provavelmente contribuem para o aumento da prevalência de tabagismo materno. “O fato de as mulheres fumarem em uma fase tão importante de suas vidas e das de seus filhos ainda não nascidos reforça a necessidade de fortalecer a implementação de ações simultâneas de controle do tabaco, incluindo a política de impostos especiais de consumo de tabaco e intervenções de prevenção e cessação do tabagismo pré-natal como parte da consulta de rotina dos profissionais de saúde”, concluem os autores.
Referência:
André Salem Szklo, Graziele Grilo, Jeffrey Drope, Maternal Smoking Prevalence in Brazil in 2013 and 2019: Not What We Expected When They Were Expecting!, Nicotine & Tobacco Research, 2024;, ntae157, https://doi.org/10.1093/ntr/ntae157