Onconews - Exposição a ozônio e risco de câncer no Brasil

A exposição ao ozônio (O3) desencadeia respostas inflamatórias e estresse oxidativo que estão associados à progressão do câncer. Trabalho com participação do patologista Paulo Saldiva (foto), professor da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo responsável por inúmeras pesquisas sobre patologia ambiental e doenças respiratórias, descreve a mortalidade por câncer no Brasil resultante da exposição de curto prazo a concentrações elevadas de ozônio. Os resultados mostram que o risco de câncer de rim foi mais afetado pela exposição ao ozônio, seguido por câncer de próstata, estômago, mama, linfoma, cérebro e pulmão, com associações mais fortes na estação quente do ano e no Sul do Brasil.

Estudo de séries temporais com base em 406 locais em 20 países estimou que mais de 6.000 mortes poderiam ter sido evitadas anualmente se a concentração de ozônio no nível do solo fosse limitada à recomendada pela Organização Mundial de Saúde.

Neste estudo, o principal objetivo foi avaliar se a exposição ao ozônio no nível do solo está associada a um risco elevado de mortalidade total e específica por câncer no Brasil, com base em um conjunto de dados nacionais. Os objetivos secundários envolveram a identificação de subpopulações potencialmente suscetíveis e a estimativa das mortes por câncer atribuíveis à exposição de curto prazo ao ozônio.

Os pesquisadores coletaram os dados de óbitos de 1º de janeiro de 2000 a 31 de dezembro de 2019 a partir do Sistema de Informação sobre Mortalidade (SIM). As causas de morte foram codificadas pelo SIM usando a Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde — 10ª Revisão (CID-10). Foram extraídos exclusivamente registros de morte por câncer, compreendendo óbitos por câncer oral, de nasofaringe, esôfago, estômago, cólon/reto, fígado, vesícula biliar, pâncreas, laringe, pulmão, osso, pele, mama, colo do útero, ovário, próstata, testículo, rim, bexiga, cérebro, linfoma e leucemia. O código para município de residência, idade e sexo estavam disponíveis para cada registro de óbito.

Para avaliar a exposição ao ozônio, a pesquisa extraiu dados de concentração máxima diária de ozônio no Brasil a partir de um conjunto de dados de estimativa global. A concentração máxima pelo período de 8 horas diárias foi estimada por um modelo de aprendizado de máquina desenvolvido com base em observações de ozônio em 6.851 estações de 58 países e territórios.

No total, foram incluídos 3.459.826 registros de óbitos por câncer de 5.570 municípios brasileiros entre 2000 e 2019. A concentração média diária de ozônio em cada município foi calculada a partir dessa estimativa global, com resolução espacial de 0,25° × 0,25°. Análises de subgrupos foram realizadas por idade, sexo, estação, período de tempo, região, hierarquia urbana, classificação climática, quantis do PIB per capita e taxas de analfabetismo.

Os resultados foram relatados no International Journal of Cancer e mostram que uma relação exposição-resposta linear sem limiar foi observada entre a exposição de curto prazo ao ozônio e a mortalidade por câncer, com aumento de 1,00% (IC 95%: 0,79%–1,20%) no risco de mortalidade por todos os tipos de câncer para cada incremento de 10 μg/m3 na média de ozônio em três dias. O câncer de rim foi mais fortemente afetado pela exposição ao ozônio, seguido por câncer de próstata, estômago, mama, linfoma, cérebro e pulmão.

O risco de câncer foi relativamente maior na estação quente e no sul do Brasil, com tendência decrescente ao longo do tempo. Ao restringir a concentração de ozônio ao valor mínimo, um total de 147.074 (116.690–177.451) mortes por câncer poderiam ser evitadas no Brasil de 2000 a 2019, incluindo 17.836 (7.014–28.653) mortes por câncer de pulmão. Os autores destacam a necessidade de incorporar medidas específicas para mitigar a exposição ao ozônio nas recomendações de tratamento do câncer.

A íntegra do estudo está disponível em acesso aberto.

Referência:

First published: 10 July 2024
https://doi.org/10.1002/ijc.35069