Onconews - Ki-67 e decisão terapêutica no câncer de mama inicial

cesar cabello 2020 bxA atividade proliferativa do índice Ki-67 é importante na tomada de decisão de tratamento adjuvante no câncer de mama receptor hormonal, em pacientes com doença inicial. Análise1 realizada a partir de dados de 5 anos da experiência institucional do St. Gallen Breast Center mostrou que os valores de corte para os subtipos luminal A e B foram comparáveis com os critérios de St. Gallen 2013 e as recomendações do Grupo de Milão. O mastologista César Cabello dos Santos (foto), Coordenador de Mastologia da Divisão de Oncologia Ginecológica e Mamária do Hospital da Mulher - CAISM/ UNICAMP, analisa os resultados.

“O advento de ensaios multigênicos baseados em microarrays levou a um novo paradigma na compreensão da heterogeneidade do câncer de mama receptor hormonal positivo e vários subtipos foram descritos, incluindo os subtipos luminal A e luminal B, com prognósticos distintos. No entanto, o perfil de expressão gênica ainda é caro e não é amplamente aplicável na prática diária”, argumentam os autores, que reforçam a importância do Ki-67 como um biomarcador dinâmico e um parâmetro importante para discriminar esses subtipos histológicos.

Em 2011, o Consenso de St. Gallen definiu um valor de corte de Ki-67 de 14% para diferenciar os subtipos luminal A e B por imuno-histoquimica. Em 2013, o painel refinou o critério, incorporando a positividade do receptor de progesterona (PgR ≥20%) e aumentando o limiar de Ki-67 para ≥20%.  “Essa mudança de critério aumentou o número de pacientes classificados com câncer de mama luminal A e, portanto, diminuiu o número de pacientes para os quais a terapia citotóxica geralmente é recomendada”, descrevem os autores.

Nesta análise foram considerados 1154 pacientes com câncer de mama receptor hormonal positivo atendidos no St. Gallen Breast Center de 2010 a 2014. Os valores de Ki-67 foram analisados ao longo de 5 anos e sua distribuição foi comparada com a definição do consenso de St. Gallen 2013 e a definição refinada do Grupo de Milão.

Os resultados reportados por Maranta et al. mostram que a frequência do índice Ki-67 foi comparável ​​ao longo dos anos (média de 26 a 30%, mediana de 22 a 26%), com curvas quase idênticas (Teste de Kruskal-Wallis, Teste H: p = 0,18). Os valores de Ki-67 correlacionaram-se com o grau do tumor (mediana de Ki-67: G1: 12%, G2: 21%, G3: 38%). O desvio padrão do Ki-67 aumentou com a classificação mais alta (G1: 6,9; G2: 9,2; G3: 18,2; p <0,001). O índice Ki-67 cumpriu os critérios de St. Gallen 2013 e a definição refinada do Grupo de Milão, respectivamente com 35% (41%) de tumores tipo luminal A e 65% (59%) luminal B; no câncer lobular o Ki-67 foi significativamente menor que no câncer de mama ductal, sublinha o artigo.

“Conhecer a distribuição do valor de Ki-67 em uma instituição é essencial para a tomada de decisão clínica de terapias adjuvantes no câncer de mama inicial”, destacam os autores, reafirmando a importância do Ki-67 como marcador de proliferação tumoral. A publicação reforça ainda a importância da qualidade da patologia e lembra que a distribuição do valor de Ki-67 deve ser conhecida para permitir a adequada interpretação e diferenciar adequadamente casos de luminal A e B.

Impacto do KI67 na abordagem de tumores iniciais de mama

Por Cesar Cabello

O artigo de Maranta e col., recentemente publicado na The Breast, traz algumas observações importantes em relação ao valor do KI67 e Receptor de progesterona (PR) na classificação dos tumores luminais em nossa prática.

É consenso que o uso do KI67 se depara com problemas metodológicos claros. A dificuldade de padronização dos resultados na correlação inter-observador parece ser dos maiores entraves.3

Por esta razão, é fortemente recomendado que laboratórios centrais busquem excelência na qualidade das análises, bem como estabeleçam os cut off locais que possam apresentar associações clínicas significativas com as suas populações. Isto requer que cada instituição, com seus laboratórios centrais e suas equipes multidisciplinares, organizem estudos de validação do Ki67 e de outros biomarcadores de relevância clínica.

Este grupo suíço fez associações de prognóstico de suas populações com valores de KI67 e progesterona em pacientes luminais-HER2 negativas por imuno-histoquímica, com a definição dos subtipos luminais A e B “likes” segundo St Gallens 2013 e o “grupo de Milão4. Certamente teria sido mais adequado se as comparações pudessem ter incluído análises genômicas dos subtipos intrínsecos como padrão-ouro e não apenas a classificação imuno-histoquímica (subtipos “like”). Porém, na prática, devido aos custos, a opção foi usar principalmente os critérios do Grupo de Milão como referência. É importante destacar que as comparações foram todas feitas com pacientes de centros europeus.

A melhor correlação para a classificação de tumores luminais A e B “like” em relação ao prognóstico foi com um cut off de 22% para o KI67. Estes dados corroboram a importância de estudos locais para que sejam desenvolvidos valores de cut off mais adequados para cada centro a redor do mundo.

Apesar disto, alguns autores, na maioria americanos, claramente preferem utilizar os valores de KI67 como um instrumento de avaliação de resposta a endocrinoterapia neoadjuvante (queda do KI67 após a neoadjuvância, bem como o PEPI escore) e não como substituto (surrogate) da análise genômica e na classificação dos subtipos intrínsecos .5

Outro problema fundamental é que o KI67 imuno-histoquimico não substitui de forma esperada os valores preditivos e prognósticos de assays genômicos como “Oncotype DX e mammaprint” 6,7. Desta forma, permanecem dúvidas em relação ao real impacto do KI67 na abordagem de tumores iniciais de mama em nossa prática clínica, principalmente quando os valores observados não são muito “baixos” ou muito “altos”.

Referências: 

1 - Maranta, A. F., Broder, S., Fritzsche, C., Knauer, M., Thürlimann, B., Jochum, W., & Ruhstaller, T. (2020). Do YOU know the Ki-67 index of your breast cancer patients? Knowledge of your institution’s Ki-67 index distribution and its robustness is essential for decision-making in early breast cancer. The Breast, 51, 120–126. doi:10.1016/j.breast.2020.03.005

2 - Maranta, A. F., Broder, S., Fritzsche, C., Knauer, M., Thürlimann, B., Jochum, W., & Ruhstaller, T. (2020). Do YOU know the Ki-67 index of your breast cancer patients? Knowledge of your institution’s Ki-67 index distribution and its robustness is essential for decision-making in early breast cancer. The Breast, 51, 120–126. doi:10.1016/j.breast.2020.03.005 

3 - Strategies for developing Ki67 as a useful biomarker in breast cancer.- Denkert C, Budczies J, von Minckwitz G, Wienert S, Loibl S, Klauschen F.Breast. 2015 Nov;24 Suppl 2:S67-72. doi: 10.1016/j.breast.2015.07.017. Epub 2015 Aug 14.PMID: 26283598

4 - Proposed new clinicopathological surrogate definitions of luminal A and luminal B (HER2-negative) intrinsic breast cancer subtype - Patrick Maisonneuve et al - Breast Cancer Res. 2014 Jun 20;16(3):R65. doi: 10.1186/bcr3679.

5 - Ki67 Proliferation Index as a Tool for Chemotherapy Decisions During and After Neoadjuvant Aromatase Inhibitor Treatment of Breast Cancer: Results From the American College of Surgeons Oncology Group Z1031 Trial (Alliance) - Matthew J Ellis et al

6 - Conventional Pathology Versus Gene Signatures for Assessing Luminal A and B Type Breast Cancers: Results of a Prospective Cohort Study - Julia E.C. van Steenhoven et al -  Genes 2018, 9, 261; doi:10.3390/genes9050261

7 - Correlating Ki67 and other prognostic markers with Oncotype DX recurrence score in early estrogen receptor-positive breast cancer - Aaron C Tan et al - Asia Pac J Clin Oncol. 2018 Apr;14(2):e161-e166. doi: 10.1111/ajco.12779. Epub 2017 Sep 29.PMID: 2896086