Análise retrospectiva de 419 pacientes com câncer colorretal tratados no MD Anderson Cancer Center e de 619 pacientes do Nurses Health Study (NHS)/Health Professionals Follow-Up Study (HPFS) buscou identificar pacientes com mutação ERBB2 / ERBB3 através de testes de sequenciamento em amostras de tecido. Uma terceira coorte de 1623 pacientes com câncer colorretal teve o perfil de ERBB2 caracterizado por biópsia líquida (ctDNA). “A importância biológica dessas mutações pode ser explorada tanto como biomarcadores prognósticos como terapêuticos”, diz o oncologista André Murad, que comenta os principais achados do estudo.
Os resultados mostram que as mutações de ERBB2 ocorreram em 4,1% dos pacientes do MDACC, em 5,8% dos pacientes do NHS/HPFS e em 5,1% das amostras avaliadas por biópsia líquida (ctDNA). Mutações ERBB3 ocorreram em 5,7% dos pacientes em ambas as coortes de tecidos.
Os autores descrevem que nenhum gene foi associado a mutações de TP53, APC, KRAS, NRAS ou BRAF. No entanto, mutações PIK3CA foram fortemente associadas com mutações ERBB2 em todas as três coortes (OR = 3,68, IC 95% = 1,83 a 7,41, P = 0,001; OR = 2,25, IC 95% = 1,11 a 4,58, P = 0,02; OR = 2,11, IC 95% = 1,25 a 3,58, P = 0,004) e com mutações ERBB3 na coorte MDACC (OR = 13,26, IC 95% = 5,27 a 33,33, P <0,001). Mutações nos genes ERBB2 (P = 0,08) e ERBB3 (P = 0,008) foram associadas ao previsto no consenso de subtipo molecular (CMS1). Mutações ERBB2 (taxa de risco [HR] = 1,82, IC 95% = 1,23 a 4,03, P = 0,009), mas não ERBB3 (HR = 0,88, IC 95% = 0,45 a 1,73, P = 0,73) foram associadas a pior sobrevida global.
A instabilidade de microssatélites (MSI) foi positivamente associada a ERBB2 ([OR] = 5,98, IC95% = 2,47 a 14,49, P <0,001; OR = 5,13, IC95% = 2,38 a 11,05, P <0,001) e ERBB3 (OR = 3,48, 95% IC = 1,51 a 8,02, P = 0,002; OR = 3,40, 95% IC = 1,05 a 10,96, P = 0,03) em ambas as coortes de tecidos. Idade, estágio e localização do tumor não foram associados a nenhuma mutação.
Em conclusão, mutações PIK3CA podem estar associadas a mutações nos genes ERBB2 / ERBB3. “Mutações concomitantes de PIK3CA podem representar um segundo impacto na sinalização oncogênica que precisa ser levado em consideração quando se pretende atingir ERBB2 / ERBB3”, alertam os autores.
Mutações somáticas de ERBB2 e ERBB3 (que codificam as proteínas HER2 e HER3, respectivamente) são encontradas em uma ampla gama de cânceres. Modelos pré-clínicos sugerem que um subconjunto dessas mutações leva à ativação constitutiva de HER2, mas a maioria permanece biologicamente não caracterizada. “A importância biológica das mutações HER2 e HER3 pode ser explorada tanto como biomarcadores prognósticos como terapêuticos, uma vez que hoje, tanto drogas anti-HER2 (trastuzumabe, pertuzumabe, trastuzumabe-entansina e lapatinibe) como pan-HER com potencial atividade também em tumores com mutação de HER3 (como neratinibe) são empregadas em estudos clínicos para o tratamento agnóstico de vários tumores sólidos refratários à terapia convencional e que apresentam tais mutações”, explica André Murad, Professor Adjunto, Coordenador da Disciplina de Oncologia da Faculdade de Medicina da UFMG. “Já a proteína fosfatidilinositol-4,5-bisfosfonato 3-quinase (PI3K) atua como importante via de sinalização a jusante do receptor do fator de crescimento epidérmico (EGFR). A via de sinalização PI3K também desempenha papel fundamental na patogênese de muitos tipos de câncer, incluindo o câncer colorretal. Mutações de ganho de função em PIK3CA (o gene alfa da subunidade catalítica de fosfatidilinositol-4,5-bisfosfato 3-quinase) regulam positivamente a via de sinalização de AKT-MTOR a jusante, promovendo assim o crescimento e proliferação de células tumorais. Mutações nos exons 9 e 20 de PIK3CA estão presentes em 10-20% dos cânceres colorretais e estão associadas a outras alterações moleculares, incluindo mutações KRAS e fenótipo metilador de ilha CpG de alto grau”, prossegue Murad.
Para o oncologista, essas mutações podem ser exploradas como alvos terapêuticos potenciais no tratamento do câncer colorretal, inclusive em associação à terapia anti-HER2/HER3. “Drogas específicas anti-PIK3 já se encontram disponíveis e em desenvolvimento, duas delas já aprovadas pelo FDA para tratamento de linfomas foliculares e leucemia linfocítica crônica, já resistentes ao tratamento convencional, como idelalisib e copanlisib”, explica.
“Adicionalmente, a associação de mutações nos genes ERBB2/3 a MSI pode sinalizar a exploração terapêutica de inibidores de checkpoint imune combinados à terapia anti-HER2/3, de forma concomitante ou sequencial”, conclui o especialista, Diretor Clínico da Personal - Oncologia de Precisão e Personalizada e Diretor Científico do Laboratório Personal de Genética Molecular de Belo Horizonte, e Pós-Doutorando em Genética da UFMG.
Referência: Jonathan M Loree, Ann M Bailey, Amber M Johnson, Yao Yu, Wenhui Wu, Christopher A Bristow, Jennifer S Davis, Kenna R Shaw, Russell Broaddus, Kimberly C Banks, Richard B Lanman, Funda Meric-Bernstam, Michael J Overman, Scott Kopetz, Kanwal Raghav; Molecular Landscape of ERBB2/ERBB3Mutated Colorectal Cancer, JNCI: Journal of the National Cancer Institute, , djy067, https://doi.org/10.1093/jnci/djy067